Ingra Lyberato é agora também terapeuta em Constelação Familiar: ‘Autoconhecimento a partir da ancestralidade’


Estrela de novelas, como Pantanal, A História de Ana Raio e Zé Trovão e O Clone, não abandonou a profissão de atriz, inclusive, em breve, vai começar a gravar sua participação em Gênesis, da Record. Mas, desde o ano passado, exerce outra função, após formação em Terapia Sistêmica Fenomenológica Integrativa e tem compartilhado seus aprendizados em inúmeras lives. “Sou apaixonada pela alma humana. Hoje, tenho um mantra, que falo sem parar para as pessoas: ‘o autoconhecimento é o conhecimento que cria base para todos os outros'”, frisa

Ingra Lyberato é agora também terapeuta em Constelação Familiar: 'Autoconhecimento a partir da ancestralidade'
Ingra, que está no elenco da novela Gênesis, agora é também terapeuta (Foto: Raquel de Assis)

Ingra, que está no elenco da novela Gênesis, agora é também terapeuta (Foto: Raquel de Assis)

* Por Carlos Lima Costa

Quando lançou o livro O Medo do Sucesso, em 2017, no qual confessou que “era vítima do medo do próprio brilho, de sua própria força e de seu poder pessoal”, a atriz Ingra Lyberato não imaginava que estava abrindo uma porta para uma nova empreitada. “Alguns terapeutas se encantaram pela autoanálise e por esse tema pouco falado à época. Estreitamos laços e, agora, durante a pandemia, comecei a interagir bastante com os psicólogos e a fazer muitas lives sobre autoconhecimento, espiritualidade e psicologia. Em sinergia com esse movimento, concluí uma formação em Constelação Familiar (Terapia Sistêmica Fenomenológica Integrativa), que atua de forma direta nas questões do sistema familiar, abrindo espaço para uma nova compreensão e cura de padrões. E já estou em uma segunda formação terapêutica: a Eco Psicologia”, revela.

Tudo isso veio pouco depois de alterar a grafia de seu nome artístico, quando adotou um ‘y’ em Lyberato. “Naquele momento em que eu estava pronta realmente para florescer outros dons, essa ferramenta do nome também chegou. É como se eu tivesse atraído uma mudança que parece tão simples, tão boba, justamente em um momento que eu estava pronta para diversificar minha atuação. Hoje, não é mais só de atriz. Tem várias outras funções que estou amando fazer e tudo tem a ver com o meu trabalho, que é o estudo da natureza humana. Então, todos os lados se conversam”, reforça.

“Eu brinco que meu primeiro livro fazia parte do processo da minha própria cura ao mostrar as minhas fragilidades, limitações e fracassos internos”, frisa Ingra (Foto: Raquel de Assis)

Ano passado, em julho, em evento virtual, Ingra lançou seu segundo livro, A Natureza Oculta Iluminada, que aborda o despertar da consciência. “Eu brinco que o primeiro foi um livro portal. Fazia parte do processo da minha própria cura mostrar as minhas fragilidades, limitações, fracassos internos. Hoje, já sou uma terapeuta também, mas, enfim, pedindo licença aos terapeutas e psicólogos que fazem isso desde sempre. Eu me autoanaliso e compartilho os meus aprendizados. Sou uma mulher de 54 anos que sempre se observou, que é apaixonada pela alma humana. Hoje, tenho um mantra, que divido com as pessoas: O autoconhecimento é o conhecimento que cria base para todos os outros. Sem ele não temos o domínio das nossas emoções e atitudes”, pontua. E completa sobre a obra: “Resolvi fazer ficção para me sentir livre e compartilhar as minhas experiências travestidas de personagens. Aí não preciso citar ninguém, nem um lugar. Hoje, eu amo escrever. Eu só não estou criando já o terceiro livro, porque venho me dedicando a outros projetos”, diz.

Como já explicou, apesar do novo ofício, ela não abandonou a profissão de atriz. E já está mergulhada em sua próxima personagem. Ela vai interpretar Lia, uma das mulheres de Jacó, na última fase da novela Gênesis, da Record. “A Lia vive um amor muito lindo e maduro com Jacó. Ao mesmo tempo, eles passam por momentos dramáticos na família. O companheirismo, união, apoio mútuo e o amor precisam estar bem representados para encarar os desafios”, conta Ingra, que está no Rio em fase de caracterização para começar a gravar em breve a trama. “É bom poder ver a origem da nossa sociedade”.

A atriz, então, traça um paralelo com a posição da mulher, hoje, na sociedade. “Aquela época era muito dura. Tinham ataques com mortes, estupros, mas as mulheres desenvolviam força, resistência e resiliência grandes e uma sabedoria. Mas a mulher de fato não tinha uma voz com direitos garantidos. Hoje, acho que ela está tateando. Minha mãe, por exemplo, sempre teve um discurso muito feminista. Eu já me coloco em um lugar de viver a liberdade que eu sei que mereço, como qualquer homem ou mulher, mas sem estar declarando, bradando ou levantando nenhuma bandeira. Sempre fui assim. Não preciso falar que tenho direito. Eu vou e faço”, assegura. E entende que todos os movimentos  feministas abriram caminho para que, hoje, ela pudesse votar, ser atriz e ser valorizada.

“Me coloco em um lugar de viver a liberdade que eu sei que mereço, como qualquer homem ou mulher, mas sem estar declarando, bradando ou levantando nenhuma bandeira”, afirma a atriz (Foto: Raquel de Assis)

“A gente sai de um período que a mulher era só submissa para uma época onde estão todos os direitos na mão. E, agora, o que a gente faz com isso? Porque também não é a gente se tornar masculino distorcido ou se colocar em um estado de guerra com o outro gênero. Isso não interessa. Então, acho que todos nós, homens e mulheres precisamos positivar esses aspectos dentro da gente, de sermos mulheres com potência, não submissas, que tenham amor próprio, mas que também não estejam em guerra com os homens, pois eles, que estão aqui vivendo com a gente, não fizeram nada para serem nossos inimigos. A gente herdou isso da ancestralidade”, frisa.

E acrescenta que o tema está presente na terapia de Constelação Familiar. “Ela entende que tudo que somos hoje recebemos como memória da experiência da nossa ancestralidade. Assim como a gente recebe a vida, recebe também todos os traumas, dores e delícias do que nossos pais, avós, bisavós viveram. Então, a gente pode soltar agora todas essas dores e começar um novo tempo de pacificação, onde homens e mulheres possam se amar e confiar plenamente sem nenhum medo, porque onde tem medo não tem amor”, argumenta.

"Estou muito em forma. Uso manequim 38, o mesmo da época de Pantanal. É incrível. Minha cintura continua igual e o quadril aumentou um centímetro depois do início do isolamento. Mas gostei dessa mudança”, frisa Ingra (Foto: Ricardo Lage)

“Estou muito em forma. Uso manequim 38, o mesmo da época de Pantanal. É incrível. Minha cintura continua igual e o quadril aumentou um centímetro depois do início do isolamento. Mas gostei dessa mudança”, frisa Ingra (Foto: Ricardo Lage)

Ingra tem três filmes para serem lançados: Além de Nós, de Rogério Rodrigues, A Espera de Liz, de Bruno Torres, e A Batalha de Shangri-lá, de Severino Neto. Um dos mais recentes trabalhos dela foi o seriado Chuteira Preta da Amazon Prime Video, no qual, aos 53 anos, encarou uma cena de nudez na história em que interpreta a mulher de um empresário de jogador vivido por Nicola Siri. A seguir, ela explica como lida com a questão do envelhecimento, de estar ainda uma mulher fisicamente poderosa, encarando cenas que lhe deixam exposta. “Não tenho pudor de falar disso. Eu acho que o corpo, a sexualidade, é tudo muito sagrado. E a idade tem que deixar de ser tabu. Estou amando a minha idade. Eu achava que, aos 50 anos, teria outra imagem. Então, estou surpresa de verdade. Claro, venho da dança, sempre tive muita atividade física e cresci em sítio. A minha relação com a natureza é intensa. Preciso respirar, caminhar, dançar, me mover. Tudo isso faz com que eu tenha vitalidade, saúde. Nunca tive uma neurose pela boa forma física”, explica. Mas tem uma vaidade natural de gostar de se sentir bem, saudável, bonita.

“Mas que seja uma beleza natural e não fabricada, artificial. Nem sou de ficar me produzindo, mas gosto de me sentir bela. Também tem uma sensualidade que é da minha natureza, que durante uma época briguei um pouco com isso. Não sei se é assim para todo mundo, mas tive isso: ‘ah, não quero que me achem bonita e sensual, eu só quero que me achem inteligente e boa atriz’. Como se eu pudesse me subdividir, mas não, eu sou um pacote, sou tudo. Os meus dons e a minha aparência, beleza ou sensualidade são o meu pacote aqui na vida. Hoje, eu assumo com a maior tranquilidade”, explica.

Isso veio depois do estouro da novela Pantanal. “Naquela época, não tinha esse problema. Mas tinha muita vergonha de tirar a roupa. Hoje, já não tenho esse pudor. Engraçado, com a idade a gente vai perdendo o pudor. Na época de Pantanal, eu só tinha vergonha da nudez, mas não brigava com isso. Foi entre os 30 e os 40 anos, um momento da vida que você começa a achar que a sexualidade ou a sensualidade podem atrapalhar o reconhecimento do valor intelectual. Agora, não. Também não estou aqui para controlar a vida. Eu sou o que sou e me aceito desse jeito. Isso vem com a idade, de me achar bonita, apesar das rugas e justamente por causa de toda vivência que eu já tive olhar pra mim e falar ‘caramba, corpo, você é meu grande parceiro, o grande amor da minha vida, que está comigo o tempo inteiro’”, comenta.

"Tenho uma vaidade natural de gostar de me sentir bem, saudável, bonita. E que seja uma beleza natural e não fabricada, artificial. Também tenho uma sensualidade que é da minha natureza", ressalta Ingra (Foto: Ricardo Lage)

“Tenho uma vaidade natural de gostar de me sentir bem, saudável, bonita. E que seja uma beleza natural e não fabricada, artificial. Também tenho uma sensualidade que é da minha natureza”, ressalta Ingra (Foto: Ricardo Lage)

Ingra ainda usa o mesmo manequim 38 da época em que brilhou, em Pantanal, em 1990. “Eu estou em forma. Na realidade, uso entre 36 e 38. Mas gosto de 38, porque é mais confortável. Não vou à academia desde que a gente está em isolamento, mas caminho na rua em horários muito cedo ou danço. É incrível. Minha cintura continua igual e o quadril aumentou um centímetro depois do início do isolamento. Mas gostei dessa mudança”, diverte-se ela que atuou ainda em novelas como O Clone (2002) e Balacobaco (2012/2013).

Em termos afetivos, Ingra está sozinha. “Estou solteira há um tempão, estou falando de relação mesmo duradoura. Conheci algumas pessoas, mas estou tão bem, sabe. Acho maravilhoso dividir a vida com alguém, mas divido com amigos, colegas, com pessoas muito especiais na minha vida. Então, na hora que chegar alguém que também esteja em um caminho de busca de crescimento, de amadurecimento emocional, espiritual vai ser maravilhoso. Agora, falando de libido, eu estou com minha superlibido aqui, tudo certo. Mas hoje eu sei canalizar essa libido, esse tesão pela vida para várias atividades que me exigem energia e intensidade. Então, minha chama continua bem acesa. É que dividir a vida é algo muito especial, sabe, tenho me tornado uma pessoa muito agradável para mim mesma. Não que minha vida seja um mar de rosas. Mas tudo que vem como desafio, eu enfrento de peito aberto. Quero superar e crescer. Tenho hoje uma postura muito positiva diante da vida. Então, para a pessoa estar do meu lado precisa buscar essa vibração mais alta”, observa.

Ingra relembra sua participação como Madeleine na primeira fase de Pantanal. “Toca em um lugar muito afetivo. Tiveram muitas queimadas no Pantanal, ano passado. Eu fiquei muito impactada. Aquele lugar é um ecossistema. Hoje, eu estudo e vivencio essa ecologia profunda, essa nossa conexão com a natureza o tempo inteiro. Mas, a novela transformou a vida de todos nós que a fizemos, foi um fenômeno, marcou as nossas vidas, lançou a maioria do elenco que não era conhecido, mas a gente também foi impactado poderosamente pela natureza”, afirma.

“Estou solteira há um tempão, estou falando de relação mesmo duradoura. Conheci algumas pessoas... Agora, falando de libido eu estou com minha superlibido aqui, está tudo certo", comenta Ingra (Foto: Raquel de Assis)

“Estou solteira há um tempão, estou falando de relação mesmo duradoura. Conheci algumas pessoas… Agora, falando de libido eu estou com minha superlibido aqui, está tudo certo”, comenta Ingra (Foto: Raquel de Assis)

Ano passado, antes de começar a pandemia, ela foi com o filho, para a fazenda de Almir Satter. “Queria apresentar aquele lugar para ele. Eu costumo fazer isso, viajo com o Guilherme para muitas aventuras na natureza, porque eu sei a potência e o benefício desse contato. Ficamos lá um mês, fomos para Bonito, passeamos bastante. Quando começaram as queimadas foi justamente no ano que eu tinha revisitado toda essa emoção do que a gente viveu há 30 anos, nas gravações de Pantanal. Comecei a falar sobre o assunto na rede social. Não sou muito ativista, mas as pessoas sabem o que eu penso. A sociedade tem que se mobilizar, mas cada um tem seu papel e o meu papel é mais esse de conscientizar do que ficar levantando bandeira. Mas fiquei tão chocada com o que estava acontecendo. Então, desejo de fato que o remake da novela possa de alguma maneira abordar a nossa conexão com esse planeta, porque o ser humano está estragando bastante esse lugar onde moramos”, analisa.

Em relação ao remake, conta quem gostaria de ver interpretando sua personagem. “A Marjorie Estiano é uma belíssima atriz. Tem também a Marina Ruy Barbosa, que tem um ar sofisticado, porque a Madeleine não se adaptou ao Pantanal, ela era bem urbana”, diz. E prossegue: “Vejo acontecer no cinema americano, quando fazem um remake, às vezes colocam algum ator da versão original em uma participação especial, porque sabem que os fãs vão amar. Seria um privilégio fazer uma participação, porque a história é linda, os personagens são bem construídos”, revela.

Na TV, antes de Pantanal, havia participado, no mesmo ano, da primeira fase da novela Tieta, aos 22 anos. “Foi tudo muito rápido, eu não estava preparada para o sucesso”, relembra. No entanto, o primeiro registro no audiovisual de Ingra aconteceu aos sete anos no papel de uma sereia no curta-metragem Ementário, dirigido por seu pai. “Ele é artista plástico e começou a fazer filmes que apoiavam o trabalho dele. Tinha todo um movimento de vanguarda, de arte moderna, uma linguagem mais simbólica, hermética”.

"Hoje, sei lidar melhor com qualquer situação, seja sucesso ou fracasso", garante a atriz (Foto: Raquel de Assis)

“Hoje, sei lidar melhor com qualquer situação, seja sucesso ou fracasso”, garante a atriz (Foto: Raquel de Assis)

E Ingra lembra que o primeiro livro, O Medo do Sucesso, aborda a época que integrou o elenco de Tieta, Pantanal e, pouco depois, A História de Ana Raio e Zé Trovão. “Pessoalmente foi o auge da exposição e do assédio. Depois, fiquei quatro anos sem atuar e fui me esconder em uma fazenda. Estava casada com o Jayme (Monjardim), a gente foi criar cavalo, mas ele continuou dirigindo, enquanto eu não queria nem voltar para a área artística”.

Hoje, sente saudade desse tempo de mais assédio e visibilidade? “Foi muito bom, mas o sucesso chega com um pacotão. Não sinto falta, nem necessidade. Hoje, sei lidar melhor com sucesso ou fracasso. São circunstâncias realmente que passam. Tem uma hora que você está lá em cima na crista da onda. Na hora que a onda baixa, descansa, escreve um livro. Faz parte dos ciclos da vida. Não vou aqui ter arrogância de falar impossível, mas acho muito difícil ter fenômenos na televisão como tinham antigamente pelo simples fato de que hoje temos a internet. Tem programas de sucesso, lógico, que muita gente vê, mas não mais no nível que tinha naquela época”, aponta.

Ingra conta que quando a pandemia começou, ela tinha acabado de chegar em Salvador justamente para um módulo da terapia sistêmica da constelação familiar e resolveu ficar lá com os pais (Alba, 77, e Chico Liberato, 85), apoiando eles, indo a supermercado. “Depois de três meses, fui para o Sul e passei o resto do ano em Porto Alegre, com meu filho, Guilherme, que completa 18 anos, em julho”. O período trouxe uma novidade. “Ano passado, ele virou baixista no meio da quarentena, foi uma grande surpresa para todo mundo. Já fez show em drive-in, gravou disco Triângulo com o pai (Duca Leindeckert), que é músico, que o empregou como baixista da banda. Só que ele aprendeu a tocar sozinho, na internet”, conta.

"Meu filho virou baixista no meio da quarentena, foi uma grande surpresa para todo mundo", conta Ingra (Foto: Raquel de Assis)

“Meu filho virou baixista no meio da quarentena, foi uma grande surpresa para todo mundo”, conta Ingra (Foto: Raquel de Assis)

Hoje em dia, vemos jovens se aglomerando em festas clandestinas. Você que tem um filho de 17 como analisa atitudes dos jovens diante da Covid-19 e pensando que são eles que vão estar a frente desse país no futuro? “Sinto que a vida está ficando bastante exigente. Tenho a sensação de que precisamos ter mais maturidade e firmeza para sobreviver. É meio óbvio até, porque as pessoas que não estão tendo consciência, que estão indo para a balada, além se colocar em risco, transmitem para outras pessoas. Mesmo que a pessoa não tenha consciência, que ela esteja muito alienada, isso vai minando a vida de uma pessoa. Ela vai se sentir profundamente culpada, mesmo que ela não admita isso, Então, acho difícil uma pessoa que não tem maturidade, não tem firmeza, a partir de agora conquistar um lugar de decisão e de comando”, conclui.