Em editorial exclusivo no Royal Tulip, Vanessa Gerbelli conta de personagem em “Novo Mundo”, cenário de crise no teatro e na televisão e comenta posicionamento feminista: “Ser tratada como objeto é uma ofensa”


A atriz, que está no ar na novela das 18h da Globo, disse que a atual crise que passamos impacta diversas esferas da arte, inclusive a televisão. Por isso, mais do que resistir, Vanessa destacou a importância de manter seu amor à atuação. “O maior desafio é querer continuar desejando a profissão”

Pintora por formação, cantora por experiência e atriz por reconhecimento. Artista por vocação. No ar em “Novo Mundo” como a misteriosa Amália, Vanessa Gerbelli é a estrela do novo editorial do site HT. Clicado no Royal Tulip, em São Conrado, este ensaio revelou um lado posicionado, engajado e plural de um nome tão conhecido da nossa cena artística. Com mais de 20 anos de carreira, Vanessa Gerbelli é atriz, cantora, escritora, mãe, cidadã e feminista. Além disso, é simpática e uma obra humana que, com alguns minutos de conversa, já mostrou que o papo iria longe. Para acompanhar esta entrevista exclusiva, as fotos são de Ricardo Penna, a beleza de Gabriel Ramos e o stylling de Marlon Portugal. Vem conferir o resultado!

Na estreia de “Novo Mundo”, Vanessa Gerbelli era de poucas palavras sobre sua personagem. Misteriosa e cheia de curvas, Amália tem justificado com o passar dos capítulos o segredo guardado pela atriz. Na história, a personagem teve seu filho roubado e, por isso, desenvolveu distúrbios psicológicos. A cada vez que Vanessa Gerbelli aparece em cena na trama das 18h, um turbilhão de informação, que atinge diversos personagens de “Novo Mundo”, vem junto. E por isso, a atriz contou que tem o desafio de dosar a sua atuação. “Como as cenas explicam muito da história, nós temos que ter um grande critério para selecionar as informações necessárias para o público entender com clareza. Ao mesmo tempo, isso não ocorre o tempo todo. Quando eu chego em uma cena, é para despejar muito conteúdo de uma vez”, contou.

Blazer Ellus | Camisa Eva | Short Loft747 | Anéis Yara Figueiredo | Scarpin Cecconello (Foto: Ricardo Penna)

Como aliado, Vanessa Gerbelli tem o personagem de Caco Ciocler. Na trama, Amália e o dr. Peter estabeleceram uma relação que vai além da medicina. Com o sentimento puro que une os dois, os distúrbios da personagem de Vanessa deram lugar a uma alegria que havia sido roubada junto com seu filho no passado. “Eu achei que a gente fosse focar mais na doença dela e que a Thereza (Falcão, autora da novela) fosse seguir o caminho da esquizofrenia. Mas é muito interessante o fato de ela ter seguido a história pelo viés do amor. A Amália está se curando com esse sentimento e isso mostra que a ferida dela era emocional. Ou seja, era um quadro reversível. Hoje, a Amália já está lúcida e integrada à sociedade”, destacou Vanessa que, ao lado de Caco, protagoniza um sentimento mais ingênuo e tranquilo em meio ao dinamismo de “Novo Mundo”. “A personagem que a Thereza escreveu é uma mulher extremamente doce, amorosa e que conseguiu resistir à violência que fizeram com ela de roubarem o seu filho. Então, a Amália tem essa fragilidade. Por isso, eu acho que eu e o Caco estamos seguindo um caminho que a Thereza já havia bem delimitado que é mais calmo mesmo. Para mim, uma novela precisa ser como uma sinfonia que transita por várias emoções e intensidades”, completou.

E esta não é a primeira vez que Vanessa Gerbelli está tendo uma personagem com distúrbios na carreira. Ao longo de sua história na televisão, no cinema e no teatro, a atriz já passou por outras experiências que foram carregando sua bagagem artística. “No teatro, fiz um musical em 2012 em que eu mergulhei muito nessa questão. Na novela ‘Em Família’, minha personagem também tinha distúrbio e, por isso, precisei estudar ainda mais. Então, são curvas que a gente vai trazendo na bagagem”, contou a atriz que, de maneira natural, também trouxe a experiência da maternidade para a personagem. Mãe de um menino de dez anos, Vanessa Gerbelli disse que não é possível descolar a ficção de um sentimento intrínseco a ela. “Eu acho que a gente sempre usa o nosso afeto e isso não tem jeito. Mesmo que eu esteja segurando só um boneco, eu me lembro de quando eu segurava e amamentava o meu filho. É algo que está no meu corpo e não tem como esquecer. Então, eu acabo traçando esse paralelo com a Vanessa mãe de forma até natural”, lembrou.

Camisa Lucidez | Saia Cholet | Sobretudo Viviane Furrier | Anéis Yara Figueiredo | Brincos Silvia Bluemberg | Sapato Ellus (Foto: Ricardo Penna)

No entanto, por mais que este sentimento já faça parte do corpo e do emocional de Vanessa, a atriz contou que se preocupa com a separação entre sua vida real e profissional. Nos últimos 20 anos, em que ela passou por diferentes emoções e sensações por causa de seu trabalho, a atriz afirmou que precisou aprender a não levar para casa as dores de seus personagens. E, no caso de “Novo Mundo” em que uma mãe, assim como poderia ser com ela, tem seu filho roubado, a estratégia não foi diferente. “Eu sou muito intensa, sensível e sentimental. Por isso, eu aprendi a me defender. Durante uma novela, em que a gente grava quase 20 cenas por dia, nós ficamos muito mergulhados e de forma intensa em um personagem. Então, precisa haver um desligamento depois”, destacou.

O que não há neste momento é a possibilidade de ingenuidade que tem sua personagem em “Novo Mundo”. De acordo com Vanessa Gerbelli, em tempos de notícias e reviravoltas na sociedade, é preciso estar sempre atento a tudo o que acontece. E, para ela, a fragilidade de Amália que desacelera a narrativa de “Novo Mundo” não é algo benéfico para este panorama. “A gente está em um momento muito difícil no país em que estamos passando por muitas afrontas aos nossos direitos e a nossa liberdade. Eu evito de falar porque acho que reclamar é um ato muito estéril. Mas, de fato, nós estamos muito desmotivados e tristes. Então, neste momento, não dá para ter a fragilidade da Amália. A gente precisa se defender”, analisou a atriz que, mesmo assim, acredita que, atentos, precisamos também de um frescor para acompanhar tudo o que nos cerca. “Se a gente não for pelo caminho da suavidade, do silêncio e da tolerância com o outro, a gente não vai ter alternativa e vamos nos perder”, concluiu.

Camisa Lucidez | Saia Cholet | Sobretudo Viviane Furrier | Anéis Yara Figueiredo | Brincos Silvia Bluemberg | Sapato Ellus (Foto: Ricardo Penna)

O fato é que “Novo Mundo” também traz muitas outras sensações para Vanessa Gerbelli. Além do drama da personagem, do amor e da personalidade da Amália, a novela das 18h também apresentou uma beleza diferente para a atriz. Em “Novo Mundo”, saem de cena as maquiagens e super produções para a entrada de uma arrumação quase nula. Praticamente de cara lavada, Vanessa Gerbelli acredita que esta não-preocupação com a beleza tenha ajudado a compor o visual da novela – apesar de a atriz ter confessado adorar um retoque mais caprichado para a televisão. “Tudo o que é material é evocativo. Quando a gente veste a roupa da personagem, começamos a entender o por que de as pessoas andarem daquela forma e terem determinados tipos de comportamento. A maquiagem do mesmo jeito. Precisávamos fazer algo que tivesse a ver com aquela época e aquela realidade”, apontou.

Mas, fora das câmeras, Vanessa Gerbelli contou que gosta de se dedicar aos produtinhos de beleza. Apesar de não se cobrar estar sempre super maquiada, a atriz contou que, até por causa de sua profissão, é fundamental que haja este cuidado. Ainda mais em tempos de selfie, todos os dias, milhares de fotos preenchem a rotina de Vanessa. E ninguém quer sair feia em um clique desprevenido, ? “Se eu pudesse já acordar pronta para uma selfie seria ótimo. A foto hoje em dia se tornou quase uma doença. É um fenômeno. Por dia, a gente precisa tirar milhares de fotos e, sim, se fosse possível, adoraria uma maquiagem permanente para o trabalho”, disse a atriz que se considera vaidosa, mas não super preocupada. “Eu me arrumo mais quando eu tenho eventos. Na minha vida fora do trabalho, eu procuro ficar com o pé na realidade. Eu nunca fui de sair mulambenta na rua, nem quando não era atriz. E não vou fazer isso agora. Mas eu acho que tudo tem um limite. Eu já trabalho muito. Se eu ainda for pensar no pelinho da minha sobrancelha, eu não viveria. Então, busco sempre um equilíbrio para atender a minha profissão sem que isso vire uma cobrança”, contou.

Camisa Ellus | Jaqueta Levi’s | Calça Levi’s | Blazer Ellus | Colar VWobjects | Bracelete Tereza Xavier | Brinco Lavish | Scarpin Cecconello (Foto: Ricardo Penna)

E este posicionamento de Vanessa vem de encontro a um embate contemporâneo em que o culto do ego está cada vez mais forte, assim como os discursos feministas que nos permitem ser quem quisermos. Sobre isso, a atriz disse que busca fazer o caminho contrário desta preocupação excessiva com a aparência. Para Vanessa Gerbelli, o cuidado com a beleza interior e o bem-estar assumem o protagonismo. “Esse culto do ego de hoje em dia é muito por causa do mercado. Há muitos anos vivemos uma busca por uma beleza cada dia mais perfeita e isso acaba refletindo nas pessoas. Mas, na minha opinião, uma hora isso vai se extinguir. Não dá para servir a essa loucura e nem viver dessa forma. Por isso, eu procuro fazer o caminho contrário e cuidar mais de mim por dentro. Apesar de eu ter essa preocupação feminina da aparência, eu tenho uma procura espiritual dentro de mim que vai muito além da beleza”, explicou a atriz que valoriza momento de reflexão e silêncio aos super procedimentos de beleza.

Por falar nos discursos feministas da atualidade, Vanessa Gerbelli disse que se considera uma integrante do movimento. “Uma vez, meu filho estava conversando com meu pai e disse que determinada atitude era machista. Então, eu acho que eu posso me considerar feminista porque ensino a ele como devemos respeitar homens e mulheres na nossa sociedade”, contou a atriz que explicou seu ponto de vista. “Ainda existe muita desigualdade. Durante muito tempo, a mulher foi extremamente oprimida e vítima de muita violência. Ainda é. Então, enquanto isso não se equilibrar e a justiça não acontecer, a gente precisa correr atrás do bom-senso da nossa sociedade. É isso o que falta para a gente”, destacou.

Vestido Ellus | Pantalona Ellus | Sobretudo Sandro Ferrone para PopUp Brands | Anéis Yara Figueiredo | Brinco Lavish | Sapato A.Brand (Foto: Ricardo Penna)

Na missão de atenuar este comportamento nas futuras gerações, Vanessa Gerbelli hoje é responsável por um daqueles que nos representarão no futuro. Mãe de Tito de dez anos, a atriz destacou sua preocupação para que as mulheres dos próximos anos não precisem passar pelo que nós e nossas antecessoras viveram. “O que mais me incomoda, sobretudo, é a mulher ser vista como um objeto. E, na minha percepção, isso está sendo diluído para a geração dele. Esse olhar sobre a mulher é algo que me afronta. Desde a minha adolescência, quando a perna começou a ficar mais grossa e eu passei a ganhar mais curvas, eu não entendia por que eu andava na rua e era ofendida da maneira com que, infelizmente, estamos acostumadas a ouvir. O que eu havia feito para aquela pessoa para escutar algo daquele tipo? Ser tratada como objeto é uma ofensa. É como se a gente não tivesse ouvido para escutar as barbaridades. Isso para mim foi a brasa para o meu feminismo de hoje”, afirmou.

E neste mundo em que todos falam o que querem, ainda mais em tempos de redes sociais e vozes virtuais para todos, Vanessa contou que tem caminhado no sentido contrário desta pluralidade de opiniões. Em meio a tantos argumentos, a atriz prefere se fechar e não dar atenção ao que dizem na internet. Principalmente no caso dos comentários de seu Instagram. “Cada dia que passa eu ouço menos o que as pessoas dizem. É triste assumir isso. Mas hoje, nós vivemos inseridos em tanta informação em que todos podem publicar tudo que não há mais critério. As fontes estão muito frágeis. Então, as pessoas falam e aquilo entra por um ouvido e sai pelo outro. Eu estou com 42 anos e não estou mais com vontade e nem tempo de parar para ouvir uma opinião que não vai me acrescentar em nada”, disse a atriz que mantem o mesmo posicionamento quando o assunto é o panorama político. “Eu não tenho vontade de falar justamente por causa da ignorância das pessoas. As minhas convicções existem e estão dentro de mim. Mas eu só converso com quem me compreende ou que tem a ver comigo. Cada vez mais as pessoas que pensam parecido estão se juntando e com prazer. Isso é legal também”, analisou.

Blusa Shoulder | Cardigã Sandro Ferrone para PopUp Brands | Calça Sandro Ferrone para PopUp Brands | Brincos e pulseira VWobject | Sapato Ellus (Foto: Ricardo Penna)

Mas, como consequência dos problemas políticos, vem também, como um dos exemplos, o panorama caótico da cultura brasileira. Desvalorizada, sem dinheiro e reconhecimento, a classe artística tem se juntado para engrossar o coro por direitos e recursos. Em relação à dificuldade de se fazer arte no Brasil hoje em dia, Vanessa Gerbelli suspirou: “Nossa senhora. Lá vou eu reclamar”. E argumentou. “A parte financeira vem descendo a montanha há anos. Mas agora estamos no auge. Não existe mais dinheiro para montar nenhuma peça e o teatro é cada vez mais visto como algo bobinho e idiota. Como se estivéssemos indo para o palco apenas para nos exibirmos e tirarmos dinheiro das pessoas. Ou seja, o cúmulo da distorção. O teatro sempre foi um lugar de reflexão, emoção e onde as pessoas vão para se reconhecer. Então, realmente, eu me sinto órfã e muito desrespeitada por uma sociedade que vê a arte como algo supérfluo”, analisou a atriz que acredita que o comportamento dos políticos e da sociedade em relação ao gasto com arte seja resultado da nossa cultura e educação.

Aliás, ela foi além. De acordo com Vanessa Gerbelli, faz sentido que os políticos de hoje queiram brasileiros menos interessados e pensantes em nossa sociedade. Com a arte como chama para reflexões e novos pensamentos, a atriz acredita que o não incentivo ao teatro, por exemplo, seja uma garantia de geração não-engajada. “Hoje em dia as pessoas não param para refletir. Para comprovar isso é só ligar as rádios e perceber o que nós estamos ouvindo. Agora, para e escuta o que Chico Buarque e Milton Nascimento produziam antigamente. E não é pelo ritmo, é a temática que hoje inspiram as músicas. Não estou julgando a qualidade, apenas destacando o que interessa aos jovens de hoje”, apontou.

Blusa Shoulder | Cardigã Sandro Ferrone para PopUp Brands | Calça Sandro Ferrone para PopUp Brands | Brincos e pulseira VWobject | Sapato Ellus (Foto: Ricardo Penna)

Mas ela não desiste. Mesmo com esta atmosfera que, como ela disse, desanima, Vanessa Gerbelli é mais um exemplo daquela palavrinha tão falada pela classe artística na atualidade: resistência. “Nesse momento eu me sinto fora do lugar. Mas mesmo assim, eu resisto. Eu escrevi um texto e vou monta-lo com recursos próprios”, contou. Em breve, Vanessa deverá estrear “Do Outro Lado”, uma peça em que ela mesma escreveu, está produzindo e irá atuar. “Era para ser o roteiro de um show para duas atrizes cantoras e acabou virando um texto de teatro. A história são duas presidiárias que se conhecem na cadeia e passam a questionar e viver temáticas diversas”, adiantou a atriz que, apesar de não se considerar dramaturga, contou que a experiência como escritora reúne histórias pessoais de sua vida.

Fora o projeto para o teatro, que será o primeiro texto escrito por Vanessa Gerbelli montado nos palcos, a atriz contou que também tem se dedicado à paixão de cantar. Ao lado do irmão, ela está produzindo um álbum com rocks brasileiros que marcaram a infância da família. Em “Gerbelli’s”, Vanessa faz releituras de clássicos em um projeto que foi criado com o objetivo de ser um documento próprio. Porém, ela contou que estuda a possibilidade de lançar o disco em plataformas digitais.

Vestido Lafort | Trench Reinaldo Lourenço para PopUp Brands | Brincos Silvia Bluemberg | Anéis Yara Figueiredo | Scarpin Cecconello (Foto: Ricardo Penna)

Por enquanto, Vanessa Gerbelli segue com sua carreira artística. Depois de “Novo Mundo”, a atriz já está confirmada em uma série do Multishow, que marcará sua estreia neste formato. Mas, mesmo com projetos sucessivos, a atriz reconheceu que a crise que atinge o teatro também está presente na telinha. “A televisão está acompanhando o declínio. Mas eu acho que essa ainda é uma indústria muito poderosa e com muitas possibilidades. Por isso, na minha opinião, a televisão consegue respirar. Até porque, hoje, temos o crescimento das séries e o aumento das produções para a TV a cabo”, disse a atriz que é uma prova-viva deste novo caminho da teledramaturgia.

O fato é que, seja na televisão, na música ou no teatro, Vanessa busca não sofrer com os problemas externos que impactam em sua profissão. Mais do que resistir, a atriz defende que seja fundamental manter o tesão pela arte e pela cultura mesmo em tempos de crise. “O que é mais desafiador é não perder a vontade de ser artista. Não tem jeito. Por mais que a gente nasça, cresça e morra artista, esse cenário desmotiva a nossa vocação. Por isso, para mim, o maior desafio é querer continuar desejando a profissão. E resistir é imprescindível”, apontou Vanessa que também destacou a instabilidade da carreira artística. “A gente navega por águas bastante turbulentas. Mas eu procuro encarar de forma positiva. Foi isso o que eu escolhi para mim e tem dado certo durante mais de 20 anos”, completou a atriz Vanessa Gerbelli. Ainda bem!