Suicídio, guerras religiosas e ambições: direto Broadway, Pippin traça um paralelo com a realidade


Pippin é uma fábula inspirada na corte e história do rei Carlos Magno. Com Nicette Bruno, Totia Meireles, Felipe de Carolis e Jonas Bloch, o espetáculo está em cartaz no Shopping da Gávea

Quando estreou, em 1972, Pippin causou uma revolução na Broadway por inovar na estrutura e ainda apostar na metalinguagem. O musical, vencedor de cinco Tony Awards, possui dois níveis de narrativa, sendo que o primeiro conta a fábula do herdeiro do trono do Rei Carlos Magno que está em uma jornada existencial pelo sentido da vida, enquanto o segundo mostra uma trupe teatral interpretando esta história. “Esta peça continua sendo ousada e tem um fundamento, além da diversão. Claro que são tempos um pouco diferentes, mas não tanto, infelizmente”, lamentou Nicette Bruno. Apesar de parecer um tema superficial, o espetáculo fala sobre suicídio, guerras religiosas, ambições, sexo, drogas e muito mais enquanto o protagonista Pippin tenta entender qual o seu lugar no mundo. Todas estas polêmicas dramáticas juntas conseguem aparecer ao mesmo em que o espetáculo esbanja humor ácido e alegria. O site HT, inclusive, conferiu os primeiros minutos desta montagem e já podemos adiantar que o público pode esperar coisas grandiosas deste elenco formado por Nicette Bruno, Totia Meireles, Felipe de Carolis, Jonas Bloch e Adriana Garambone. Esta união de fantasia e tragédia vai estreou na semana passada, no Teatro Clara Nunes, Shopping da Gávea.

44 anos depois de sua primeira estreia no Brasil, Pippin volta aos palcos com grande elenco (Foto: Divulgação)

Pippin está de volta aos palcos graças à aposta de Charles Möeller e Claudio Botelho, dupla responsável por levantar grandes musicais no Brasil como Cinderela e A Noviça Rebelde. De acordo com o diretor Charles, a vontade de montar este espetáculo já é antiga pelo fato dele tocar em pontos muito atuais. No entanto, demorou quase cinco anos para conseguir levantar verba suficiente. Sendo assim, esta peça é fruto de muita determinação.  “Tem espetáculos que saem mais rápidos e outros que demoram mesmo. Exatamente por isso que é necessário ter um grande cartel de títulos para ir captando aos poucos. Não dá para desistir só porque o país entrou em falência e a cidade está em uma guerra civil. Este discurso é acomodado”, explicou. Vendo o cenário atual da nossa sociedade, o diretor até agradece por ter demorado mais que outras produções. “Quando este musical foi montado, os estadunidenses estavam vendo uma guerra televisionada que virou entretenimento. Além disso, a Broadway estava violenta, indo muito para o lado da prostituição e das drogas. Tanto que as pessoas fizeram um cartaz que dizia ‘não venham para Nova York’. Se traçarmos um paralelo com o Brasil de hoje é exatamente isto que está acontecendo. Este, de fato, é o melhor momento para PIPPIN estrear. Há cinco anos, a violência não era tão grande, as redes sociais não eram tão importantes e havia uma esperança de um Brasil melhor com as chegada das Olimpíadas e da Copa”, criticou Charles.

Para iniciar o debate por estas polêmicas, a figura do príncipe herdeiro se torna essencial para o espetáculo. Afinal, ele não se acostuma com as limitações da vida mundana. “Adoro este personagem por questionar e não se acomodar com a vida. Ele quer algo extraordinário e morar em uma casa com uma cerca branquinha não é este ideal para ele. Enquanto isso, estamos em uma sociedade superficial na sua essência. Estamos perdendo contatos básicos como falar e olhar. Esta busca do personagem acaba nos fazendo refletir sobre o que é esta felicidade estabelecida”, explicou Charles. Sendo assim, Pippin questiona todos os costumes da atualidade como, por exemplo, a dependência das redes sociais que seria a metáfora desta superficialidade elencada pelo protagonista. “Será que as pessoas conseguem ser felizes sem o filtro do instagram? É um questionamento muito contundente da minha geração. Antigamente, quem postava foto de prato era cafona. Hoje em dia, a gente fala ‘nossa, a pessoa está em tal restaurante’. Mas e daí? Não sou contra este tipo de coisa, mas a vida não poder ser somente isto”, comentou Felipe de Carolis, que faz o protagonista .

Pippin conta uma fábula inspirada na corte do rei Carlos Magno (Foto: Divulgação)

A partir do momento que o protagonista começa a busca por algo mais, a possibilidade de não encontrá-la também se torna uma realidade. Dessa forma, uma das principais motivações desta peça é, de fato, falar sobre o suicídio, afinal, o príncipe herdeiro está tentando encontrar um motivo para viver. Apesar de aparentemente ser uma busca filosófica, ela sai do ideal. O espetáculo questiona um ponto chave: a falta de uma razão faria com que a morte fosse a solução? “A minha vontade de fazer este espetáculo veio do fato de que a Geração Millenium está alcançando o maior índice de suicídio dos últimos tempos. De acordo com uma pesquisa, daqui a oito anos, o suicídio será a maior causa de mortes no mundo. Isto me preocupa muito”, lamentou Felipe.

Outro tema importante elencado pelo espetáculo é a ambição que pode levar, até mesmo, a guerras religiosas. Isto pode ser visto na figura do rei Carlos Magno, um homem extremamente cruel que, em nome do Cristianismo, matou muitas pessoas. Este personagem é o extremo oposto de seu filho, o príncipe herdeiro, por ser mais pé no chão e extremamente cruel. “É aquele tipo de pessoa que acredita que ser vitorioso é vencer batalhas e matar pessoas, apesar de ser um homem cristão. Vemos religiosos que o dinheiro sobrepõe aos seus princípios. Isto é exatamente o que está acontecendo hoje com uma facção islâmica. O sentido da vida, para este rei, é o poder, algo que também é muito comum no nosso país. Não importa se morre gente nos hospitais ou se falta merenda escolar, pois é fundamental aumentar a riqueza individual”, criticou Jonas Bloch.

Apesar de não ser tão polemico, outro personagem importante do musical é a Mestra de Cerimônias. Ela é responsável por conduzir toda a trama, está presente em todas as cenas e, em alguns momentos, ainda se torna a dona da trupe teatral, uma mulher grossa com os artistas e gentil com o público. Nesta montagem, esta protagonista é vivida por Totia Meireles. “A parte mais difícil desta personagem é ter que costurar o espetáculo inteiro. Eu chamo os atores para a cena e comando tudo. Se começo mal, a peça tende a não andar na linha. Preciso estar focada o tempo inteiro”, afirmou a atriz. Para melhorar a sua atuação nos palcos, Totia ainda fez aulas de dança e canto, afinal, ela precisa estar o tempo todo ligada e preparada. “Tive que acordar a bailarina que existe dentro de mim, as coreografias exigem muito, tem muito detalhe. Isto faz com que a gente precise ter um domínio muito grande do corpo”, contou.

Totia Meireles faz a Mestra de Cerimônia da peça, responsável com costurar toda a história (Foto: Divulgação)

O espetáculo fala de sexo, drogas, busca espiritual, guerras religiosas e diversos temas polêmicos, como falado anteriormente. Mas, ao mesmo tempo, Pippin conta com o viés do humor e da dança, que são personificados nas figuras de Nicette Bruno e Totia Meireles. Isto mantém uma leveza especial, mesmo tratando de assuntos conturbados. “É óbvio que não tem como o musical ficar o tempo todo no buraco, porque, afinal, tem danças e músicas”, explicou Felipe. As músicas conseguem levantar a trama para que não se torne uma peça dramática. “É uma maneira de dizer as mesmas coisas de outro jeito”, comentou Jonas Bloch.

Para animar a peça, a música e as coreografias são elementos fundamentais e, para isso, o diretor Charles Möeller conta com um elenco grandioso de 19 atores, algo pouco comum de se ver nos espetáculos que estão feitos no Brasil.  “Ter tanta gente em cena é realmente uma coragem. Antigamente era mais possível, mas com o tempo fomos sendo impedidos de montar isto. Estamos esperançosos de que o público prestigie mais as peças e que as companhias possam realizar os seus trabalhos de forma mais ampla, independente de auxílio ou ajuda. Fazer teatro é um ato de resistência no nosso país”, lamentou Nicette. Apesar de não ser tão comum, o diretor está acostumado a fazer trabalhos assim, afinal, A Noviça Rebelde tem cerca de 200 pessoas em volta. “Musical é sempre grandioso. Tem que ter a música, a iluminação, a orquestra, o figurino, entre outros. É preciso de muita grana para levantar isso. Tem que ter patrocinadores, exatamente por isso que São Paulo tem mais teatro. Mesmo que a gente lote a casa, a bilheteria não vai pagar o custo disso. Estamos muito felizes de conseguir estrear este espetáculo no Rio de Janeiro”, comemorou Totia.

 

 PIPPIN

Um espetáculo de CHARLES MÖELLER & CLAUDIO BOTELHO

Texto de ROGER O. HIRSON
Música & Letras de STEPHEN SCHWARTZ

Com Felipe de Carolis, Totia Meireles, Nicette Bruno, Jonas Bloch, Adriana Garambone, Cristiana Pompeo, Guilherme Logullo, Luiz Felipe Mello, Analu Pimenta, Bel Lima, Bruninha Rocha, Daniel Lack, Flavio Rocha, Jéssica Amendola, João Felipe Saldanha, Paulo Victor, Rodrigo Cirne, Sérgio Dalcin e Victoria Aguillera.

 

CHARLES MÖELLER
Direção
 
CLAUDIO BOTELHO
Versão Brasileira
 
JULES VANDYSTADT
Direção Musical
 
ALONSO BARROS
Coreografia
 
ROGÉRIO FALCÃO
Cenário
 
LUCIANA BUARQUE
Figurinos
 
MARCELO CLARET
Design de Som
 
ROGÉRIO WILTGEN
Iluminação    
 
BETO CARRAMANHOS
Visagismo

 

TINA SALLES
Coordenação Artística

      

CARLA REIS
Produção Executiva

 

Apresentado por: Ministério da Cultura e Bradesco Seguros
Patrocínio: Multiplus
Realização: M&B e E_MERGE

 

SERVIÇO

 

De 03 de agosto a 21 de outubro de 2018
Teatro Clara Nunes – Shopping da Gávea
Quintas, às 17h. Sextas e sábados, às 21h. Domingos, às 19h30.
Classificação indicativa: 12 anos
 
Ingressos:
Quintas (17h) e Sextas (21h): R$ 50 (balcão) e R$ 80 (plateia)
Sábados (21h) e Domingos (19h30): R$ 70 (balcão) e R$ 120 (plateia).