Em cartaz no Rio e sem patrocínio, Marília Gabriela volta ao teatro em momento da vida guiado pelo prazer e livre de cobrança: “Eu quero curtir tudo o que eu conquistei”


Entre as temáticas do espetáculo interpretado pela atriz está a possibilidade de recriar uma situação já vivida. Caso existisse esta possibilidade na vida real, Marília Gabriela garantiu que não faria uso da oportunidade. “As coisas acontecem para mim e eu as aproveito muito bem. Sejam elas boas ou ruins, eu sempre vivo muito intensamente como experiência de vida”

Já são quase 40 anos de carreira. Neste tempo, Marília Gabriela se dividiu entre a apresentação, a atuação, as entrevistas e até à música. Porém, depois de se consagrar na profissão, agora é tempo de curtir. Ou, pelo menos, trabalhar apenas pelo prazer. E é isso o que Marília Gabriela está fazendo no Rio de Janeiro. Em cartaz com a peça “Constelações” no SESC Copacabana, a atriz interpreta a trama de Nick Payne, que aborda, entre outras questões, a possibilidade de reviver uma mesma situação diversas vezes. No palco, Marília divide a cena com Caco Ciocler ou Sergio Mastropasqua, que se alternam no papel.

A temporada, que fica em cartaz até 30 de julho, marca a volta de Marília Gabriela ao teatro. Desde 2001, quando estreou na arte, a atriz já atuou em cinco peças, sendo a última em 2015. Sobre a atual experiência, Marília Gabriela definiu que o projeto é fruto da sorte da profissão. Porém, para quem acredita, “Constelações” também pode ser um daqueles casos de conspiração do universo. “O Ulysses (Cruz, diretor do espetáculo) foi à minha casa me convidar para fazer um monólogo. Porém, eu não estava muito a fim de atuar sozinha porque, em cinco peças que eu já fiz, duas foram monólogos. Mas, de qualquer maneira, como eu queria trabalhar com ele, acabei aceitando. Porém, por outras razões, acabou que essa montagem não deu certo e nós começamos a buscar peças com duas pessoas”, lembrou.

Marília Gabriela e Sergio Mastropasqua em cena em “Constelações” (Foto: AgNewsP

Após definir que marcaria este seu retorno ao palco ao lado de algum companheiro, sem restringir a homem ou mulher, Marília Gabriela iniciou a busca por um texto que a animasse. Mas ente foi um longo processo. “Eu não estava gostando de nada do que estava recebendo, até que meu filho Theodoro me sugeriu procurar o Bruno Fagundes, filho do Antônio, que lê peças como hobby. Quando eu pedi, ele me disse que só me via atuando nesta peça que, desde a primeira leitura, eu amei. Foi incrível. Quando conheci o texto, chorei e ri muito”, contou a atriz sobre a obra que já foi montada na Broadway e passeia por diversas emoções. “Essa peça tem muitas camadas e eu acho lindo o fato de ela falar o tempo inteiro sobre vida e morte de uma maneira em que as pessoas não sentem que estão engolindo aquilo. É tudo muito lúdico. A gente aborda amor, acaso, esperança e livre arbítrio na física de maneira leve”, explicou.

Entre essas temáticas está também a possibilidade de recriar uma situação já vivida. Por todo o espetáculo, os dois personagens dão novas emoções e entonações a uma mesma história, como se fosse possível reviver uma passagem. Caso existisse esta possibilidade na vida real, Marília Gabriela garantiu que não faria uso da oportunidade. Convicta de suas experiências, a artista acredita que tudo o que vivemos tem uma razão e um ensinamento, seja ele bom ou ruim. “Eu sou muito desapegada. As coisas acontecem para mim e eu as aproveito muito bem. Sejam elas boas ou ruins, eu sempre vivo muito intensamente como experiência de vida. Quando acabam, se acabam, eu enterro mesmo. Foi como tinha que ser. Eu sou muito curiosa com o que vem depois. Eu quero mais. Quero saber de outros assuntos e continuar obtendo mais respostas até eu ir me embora para outro universo”, argumentou.

Marília Gabriela e o companheiro de peça, Sergio Mastropasqua (Foto: AgNews)

Com essa postura decisiva, Marília Gabriela contou que não se frustra com as suas escolhas. Cada uma em um momento da vida, tudo tem uma explicação. Prova disso é a sua inserção no mundo virtual, por exemplo. Hoje com mais de 300 mil seguidores no Instagram, ela brincou que está dando uma nova oportunidade à rede social. “Neste caso, eu excluí da primeira vez porque estavam enchendo muito meu saco. Depois resolvi voltar”, sintetizou. Mas não é só a relação com o Instagram que andou meio estremecida na vida de Marília Gabriela. Como nos contou, há um ano ela mergulhou no universo online e se arrependeu. Na época, a artista fez canal no YouTube, página no Facebook e site. “Este é outro ritmo e outra forma de trabalhar que me custou muito caro. Se você não tem uma grande empresa por trás e está arriscando em uma sociedade, como foi o meu caso, fica inviável. Ainda mais porque não era algo que eu tinha interesse em continuar. Essa experiência foi uma sugestão que não deu certo. Não foi algo que eu morri de amores”, confessou.

Apesar de Marília Gabriela e o mundo virtual não terem se entendido muito bem, ela revelou que a culpa pode nem ter sido exclusivamente das plataformas e seus seguidores. Aos 69 anos, a artista confessou que anda em outro ritmo com a carreira. “Não estou com vontade de fazer mais nada. Eu acredito que a aposentadoria tenha uma real razão de ser e, para mim, é que tem um dia que a gente cansa e precisamos aproveitar a vida. Agora, eu quero curtir tudo o que eu conquistei com o meu trabalho e gastar fazendo o que eu gosto”, disse Marília Gabriela que garantiu não se preocupar se isso irá impactar o seu legado profissional ou não. “A verdade é que eu não me cobro mais em nada. E mais que isso, não quero que os outros façam essa cobrança por mim. Eu não vou deixar e nem estou permitindo mais qualquer coisa parecida”, afirmou.

“Eu acredito que a aposentadoria tenha uma real razão de ser e, para mim, é que tem um dia que a gente cansa e precisamos aproveitar a vida” (Foto: AgNews)

Pela diversão e o prazer de estar no palco, Marília Gabriela contou que está em cartaz no Rio de Janeiro sem qualquer patrocínio. Apostando apenas no resultado da bilheteria, a atriz destacou a dificuldade de fazer arte no Brasil em tempos de crise econômica, política e social. “A situação no Rio é dramática, mas todo o Brasil está sofrendo com o não investimento histórico em educação e cultura. Então, eu vejo o panorama de hoje como uma consequência de muitos anos de desprezo pelo que eu acho que fundamental a uma sociedade, que é a educação. A partir disso, a gente teria saúde, cultura, segurança, tudo”, argumentou.

Outro ponto desfavorável nesta situação apontado por Marília Gabriela é que as pessoas deixaram de gostar da tradicional arte. “Esta foi uma cultura que foi abandonada, em partes, e trocada por outras formas de diversão. Hoje em dia, eu ouço com muita facilidade pessoas de qualquer nível social dizendo que não gostam de teatro. É uma pena. Mas o fato é que o teatro tem sido relegado a segundo plano pela falta de conhecimento da importância desta arte”, disse a atriz que ainda apontou a televisão neste panorama. Apesar de ser uma concorrência ao teatro, Marília Gabriela acredita que o veículo também atraia mais pessoas para a arte. “Muita gente vai querendo assistir aos atores da novela. Pelo menos isso”, disse.

Serviço: “Constelações”

Local: Arena SESC Copacabana (Rua Domingos Ferreira, 160 – Copacabana)
Horário: Quinta a Sábado às 20h30 | Domingo às 19h
Ingressos: R$ 6 (associado do Sesc), R$12 (meia), R$ 25 (inteira)
Bilheteria: segunda das 09 às 16h; terça a sexta das 09h às 21h; sábado das 13h às 21h; domingo das 13h às 20h
Informações: (21) 2547.0156
Recomendação: 12 anos