Discutindo identidade sexual nos palcos, Luiz Henrique Nogueira aborda a dificuldade do teatro e da mistura de religião com política


O ator, que está comemorando 25 anos de carreira, vai encerrar a temporada de “Cock – Briga de Galo” no dia 20 de setembro no Espaço Cultural Municipal Sérgio Porto, no Rio de Janeiro

Atenção para a história que HT conta: John é um homem casado há sete anos com outro uma pessoa do mesmo sexo, em um relacionamento estável, apaixonado, com perspectiva duradoura. Tudo muito bom, muito bem, até ele conhecer W, uma mulher, e fica balançado e dividido entre o amor antigo e a nova paixão. Você já deve estar se perguntando por aí: é possível amar duas pessoas ao mesmo tempo? Ué, mas John não era gay? E a paixão independe de gênero, então? Dúvidas… dúvidas. Mas nada está perdido. Esse, na realidade, é o fio condutor de “Cock – Briga de Galo”, peça escrita pelo premiado inglês Mike Bartlett, que está em cartaz até o dia 20 de setembro no Espaço Cultural Municipal Sérgio Porto, no Rio, com Luiz Henrique Nogueira, Felipe Lima e Débora Lamm no elenco.

Luiz contracenando com Felipe Lima e Débora Lamm (Fotos: Divulgação)

Luiz contracenando com Felipe Lima e Débora Lamm (Fotos: Divulgação)

Por ser mais cotidiana do que possamos imaginar, já que vivemos tempos onde as nossas relações ditas tradicionais estão abrindo espaço para novas configurações, e, mais que isso, porque nós, humanos, estamos passando a olhar para nossa sexualidade por um novo ângulo, nós fomos atrás de Luiz Henrique Nogueira, que interpreta até então marido de John, munidos da seguinte pergunta: “Como é integrar um projeto que conta uma história tão recorrente na nossa sociedade, mas que é permeada de preconceitos, em tempos de conservadorismo?”. E Luiz foi categórico: “Fundamental. ‘Coc’ estreou em Londres, na Inglaterra, em 2012 quando as leis e os direitos civis gays estavam sendo discutidos no mundo todo. E a peça vai além disso e discute mais os rótulos e identidades sexuais nos dias de hoje”.

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Já que é tudo mais complexo do que a gente imaginava, então debater esse tema, dessa forma, nesse momento é, de certa maneira, um tapa com luva de pelica na sociedade ou no fundo não tem essa função social toda? “Claro que tem. Mas não sei se é um tapa, porque não conclui, não define. A gente abre a discussão para que o público reflita mais do que conclua. O que se discute é se de fato precisamos dividir as pessoas pela orientação sexual”, explicou Luiz Henrique. O assunto, inegavelmente, acaba sempre por levar para a discussão de como líderes e instituições religiosas ditam – ou tentam – como a sociedade vai absorver essas questões. O que dirá então da (grande) bancada evangélica no Congresso Nacional.

Luiz Henrique, ao ser questionado sobre o assunto, recorreu à amiga de profissão Marieta Severo, que falou sobre o assunto em um programa de auditório e foi amplamente aplaudida. “Concordo com a Marieta na seguinte questão: Eu respeito as religiões, mas não quero uma regulamentando as leis do meu país. Nós vivemos num estado laico”, fez questão de lembrar. Comemorando 25 anos de carreira agora, em 2015, o carioca de 48 anos não foge de debates polêmicos como esse que norteia a peça, mas prefere os holofotes da ribalta do que os das colunas e revistas de fofoca, por exemplo.

Culto à imagem, por exemplo, não é a sua praia. “Sou um ator e não vivo de imagem. Cuido dela, porque dentro do meu trabalho ela aparece, mas sou preguiçoso e não priorizo até por essa preguiça”, riu. E é mais ou menos por isso que não o vemos em flagras dos paparazzi, nem nas colunas de imprensa marrom. “Eu não sou uma celebridade. Me tornei conhecido pelos trabalhos em TV, fiz tipos fortes e até hoje me chamam por todos os personagens. Ninguém me chama de Luiz Henrique, mas falam Ubiracy, Gago, Laércio, Silvio. E isso vale muito”, afirmou. Os personagens que citou são parte dos nove que já interpretou apenas em novelas, sem a contagem do teatro. Uma bagagem que já permite auto análise.

“O pior e o melhor da minha carreira andaram sempre juntos. Sempre tive clareza da minha vocação. Nunca me arrependi, mas em vários momentos temi não me viabilizar, já que vi muitos colegas desistindo no caminho”, lembrou. Luiz, que já chegou a declarar que é de uma geração em que a televisão não era prioridade, avaliou: “Minha geração se formava no teatro e existia um preconceito, sim, com a suposta superficialidade da TV”. Se você perguntar se ele mudou de opinião, a resposta tende para o positivo. “Mais do que adorar fazer TV, ela me tornou um ator melhor. Mas o teatro segue sendo prioridade, a casa, o porto seguro”.

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Mas, há de se convir, que teatro continua dando menos dinheiro que televisão, certo? “Teatro dá cada vez menos, porque trabalhamos cada vez menos. Eram de cinco a sete espetáculos por semana, hoje em dia no máximo três de sexta-feira à domingo em curtas temporadas”. Cenário esse que muito o entristece. “Queria poder viver, ainda que modestamente, de teatro. Mas não dá”, lamentou. E se as coisas na ribalta não andam das melhoras, no cinema os caminhos são dourados. Luiz Henrique fez sucesso com o Lércio da novela “Cheias de Charme”, está confirmado no longa homônimo e inspirado na trama de Filipe Miguez e Izabel de Oliveira.

“O projeto passou todo para o segundo semestre do ano que vem. O roteiro ainda está sendo elaborado e tem vários personagens da novela. Vai ser uma delícia”, adiantou ao HT. Agora, na reta final da temporada de “Cock – Briga de Galo” no teatro, Luiz já engatilha novas ideias: “Tenho projetos com autores cariocas jovens e bacanas como Jo Bilac e Renata Mizhari. O ator tem que se produzir também, não tem jeito”, afirma. E, para quem acha que isso é lamentação… Não! É experiência de quem caminha para três décadas de ofício na arte.

Serviço

Peça “Cock – Briga de Galo” 

Quando: sexta a domingo – até 20 de setembro de 2015

Onde: Espaço Cultural Municipal Sérgio Porto, na rua Humaitá, 163 – Rio de Janeiro.

Escrita por Mike Bartlett

Direção: Inez Viana

Tradução: Eduardo Muniz

Elenco: Luiz HenriqueNogueira, Felipe Lima e Debora Lamm

Ator Convidado: Hélio Ribeiro