Dirigindo peça de projeto do SESI, Pedro Nercessian conversa com HT e solta: “difícil é ter peito pra colocar em cena o que a gente gosta”


Pedro é o diretor de “Vende-se uma geladeira azul”, primeiro texto de Raphael Call que vai para os palcos. A história virou realidade devido ao “Núcleo de Dramaturgia SESI”

Foi-se o tempo em que talento e força de vontade eram necessários para fazer um espetáculo virar realidade. Como HT já vem falando corriqueiramente, os artistas brasileiros viraram reféns de editais e são atingidos dia sim e outro também pela farra da meia entrada nas bilheterias. Opiniões de gente que entende do assunto, como Antônio Fagundes e Bruce Gomlevsky por exemplo. E, na contramão desse cenário pessimista, uma iniciativa super interessante vem abrindo uma fenda no mundo das coxias. É o “Núcleo de Dramaturgia SESI”, que escolhe um texto, em meio a centenas, para ganhar os palcos. O mais recente felizardo é o espetáculo “Vende-se uma geladeira azul”, escrito por Raphael Call com direção de Pedro Nercessian.

Questões familiares vêm à tona no texto de estreia de Raphael Call (Foto: Divulgação)

Questões familiares vêm à tona no texto de estreia de Raphael Call (Foto: Divulgação)

Em cartaz até o dia 04 de julho no Teatro SESI Centro do Rio de Janeiro e depois cumprindo uma maratona em outros Sesis do estado, a peça concorreu com outros cerca de 200 textos inscritos no projeto. O texto de Raphael Call discute as diversas maneiras com que os jovens lidam com a questão da construção da memória a partir de uma perspectiva contemporânea. E foi justamente sua memória que o ajudou a escolher o fio condutor: uma geladeira azul. “Minha intenção era falar sobre algo que remetia ao ambiente familiar. Como minha avó tinha uma geladeira azul em casa, a ideia surgiu. A escolha de uma simples geladeira foi, justamente, para tratar do valor simbólico do objeto”, conta.

Estrelada por Amanda Mirasci (de “Caiu o Ministério”), Felipe Haiut (de “A Porta da Frente”) e Leonardo Hinckel (de “A dama do Mar”),  “Vende-se uma geladeira azul”, é desenvolvida a partir das lembranças de três irmãos que se juntam para dividir a tal geladeira azul, uma herança da avó. Enquanto a produção não segue para as cidades de Caxias, Macaé, Campos,  Itaperuna e não deixa a urbe-maravilha, HT tratou de conversar com o diretor Pedro Nercessian sobre a iniciativa do SESI, o cenário artístico e os preparativos do espetáculo.

Leonardo Hinckel, Amanda Mirasci e Felipe Haiut estão no elenco de “Vende-se uma geladeira azul” (Foto: Divulgação)

Leonardo Hinckel, Amanda Mirasci e Felipe Haiut estão no elenco de “Vende-se uma geladeira azul” (Foto: Divulgação)

HT: Como você chegou ao projeto?
PN: Fui convidado para dirigir as leituras que escolheriam o melhor texto para ser montado, mas não me contive. Em vez  de simples leituras eu procurei lançar um olhar mais amplo para defender cada texto. Para fugir do formato tradicional, fizemos uma leitura com figurino, uma cenografia simples e pequenas indicações de marca. O SESI e os jurados gostaram do trabalho e meu nome surgiu assim.

HT: Raphael Call é um autor relativamente novo. Como é dirigir um texto de um jovem dramaturgo? Você se sente mais livre ou mais pressionado?
PN: Acho que me sinto com uma responsabilidade maior. Meu trabalho neste espetáculo vai ser determinante na carreira dele, mas não é um peso ruim. Me sinto livre para fazer meu trabalho.

O diretor e ator Pedro Nercessian (Foto: Divulgação)

O diretor e ator Pedro Nercessian (Foto: Divulgação)

HT: Qual seria a diferença, por exemplo, se Raphael tivesse trinta anos a mais de carreira como escritor?
PN: Acho que muito pouca. Raphael tem uma calma e um desapego ao texto dele que eu raramente vejo em autores de pouca idade. Nesse sentido, ele não se comporta como um ancião.  

HT: O diretor que também é ator tem mais alma? Ele pensa mais no ator que os demais, aqueles que nunca estiveram do outro lado?
PN: Meu processo criativo parte do personagem mais do que da cena. É como eu aprendi a pensar teatro. Alio isso a uma boa visão geral e pronto. Nada me deixa mais empolgado do que ver ator criando. Por ser ator eu creio que entendo melhor e posso ajudar mais nas angústias do que quem nunca esteve nesse lugar. Ator é um bicho angustiado.

HT: A peça discute as diversas maneiras que os jovens lidam com a questão da construção da memória. Você não é tão jovem assim, mas como você lida com isso? E como acha que a próxima geração encara?
PN: Eu lido da pior maneira possível. Acho que o ser humano sofre por passar a vida negando a morte. Envelhecer é morrer. Eu sou absolutamente contra a morte, acho um extremo mal gosto de Deus ter inventado isso aí. Ao passar por uma boa experiência eu me divido entre o prazer de viver aquele momento e a frustração de saber que ele já vai passar, já passou, já passou há muito tempo, virou memória.

HT: Vocês ficaram quanto tempo ensaiando? Qual foi a maior dificuldade do processo? E a mais grata surpresa?
PN: Ensaiamos pouco. Cerca de cinco semanas e essa foi a maior dificuldade. O fato do elenco não se conhecer previamente também foi um desafio. Como fazer aqueles três serem irmãos em tão pouco tempo? 

HT: Esse projeto é proveniente do “Núcleo de Dramaturgia SESI”, que acaba por revelar sangues novos. É difícil entrar no mercado de vocês?
PN: Acho que o difícil é ter peito para colocar em cena o que a gente gosta, bancar isso. Quem me disse isso foi meu amigo Walter Daguerre. E ele está certo. Vencer a vaidade, a vontade desesperada de ser aplaudido e aceito é o maior desafio de um jovem artista. Só nos desprendendo disso conseguiremos colocar coisas de verdade em cena. Caso contrário, faremos sempre peças boas, e peças boas já são feitas há centenas de anos, não é isso que me interessa.

HT: Quais seus próximos projetos, Pedro?
PN: Deus sabe.

Bate-bola.

HT: Beijo gay na novela é…

PN: Mara

HT: Meu personagem predileto é o… 

PN: Que estou fazendo no momento. 

HT: Eu ainda preciso interpretar um… 

PN: Corno. Acho lindo homem sofrendo.

Ficha Técnica

Texto: Raphael Call
Direção: Pedro Nercessian
Elenco: Amanda Mirasci, Felipe Haiut e Leonardo Hinckel
Iluminação: Paulo César Medeiros
Cenografia:  Diogo Monteiro
Figurino:  Mel Akerman
Direção Musical: Davi Guilhermme
Assessoria de Imprensa: Bia Sampaio
Duração: 55 minutos 
Classificação:
 12 anos

Serviço

TEATRO SESI CENTRO

Data: 2, 3 e 4 de julho, às 19h30

Endereço: Av. Graça Aranha, 1 – Centro, Rio de Janeiro

X-Tudo SESI Cultural

TEATRO SESI JACAREPAGUÁ  
Data: 09/07, às 20h
Endereço: Av. Geremário Dantas, 940 – Freguesia

Ingressos: R$10,00 (inteira)

TEATRO SESI CAXIAS

Data:  16/07, às 15h
Endereço: Rua Arthur Neiva, 100 – 25 de agosto

TEATRO SESI MACAÉ
Data: 23/07, às 20h
Endereço: Al. Etelvino Gomes, 155 – Riviera Fluminense

TEATRO SESI CAMPOS
Data: 24/07, às 20h
Endereço: Av. Dep. Bartolomeu Lysandro, 862 – Guarus

TEATRO SESI ITAPERUNA

Data: 25/07, às 20h
Endereço: Av. José Cerqueira García – Gov. Roberto Silveira