Dr. Alessandro Martins alerta sobre a conexão entre dismorfofobia e a compulsão por realizar cirurgias plásticas


“A preocupação surge quando o indivíduo entra em um ciclo vicioso de múltiplas intervenções, sempre insatisfeito com os resultados, sem uma ideia clara do que realmente deseja alcançar. Em outros casos, busca procedimentos com resultados exagerados que, por vezes, causam impacto, como implantes mamários excessivamente grandes mamas de dois litros ou um litro e meio, lábios desproporcionalmente volumosos, preenchimentos faciais estigmatizados ou intervenções que criam rostos com características semelhantes a personagens fictícios. Esses casos fogem de proporções, indicando uma procura por algo que vai muito além do que é ideal para cada caso”

Dr. Alessandro Martins alerta sobre a conexão entre dismorfofobia e a compulsão por realizar cirurgias plásticas

*Por Alessandro Martins

Hoje nós vamos abordar a relação entre a busca pela perfeição e a dismorfofobia (Transtorno Dismórfico Corporal), transtorno que envolve um foco obsessivo em um defeito inexistente, mas que a pessoa considera ter na própria aparência física. Atualmente, muitos pacientes almejam alcançar uma imagem ou forma considerada “perfeita”. No entanto, sabemos que a “perfeição” não existe e que, nem sempre, o que é visto como “ideal” reflete o verdadeiro conceito de beleza.

Muitas pessoas procuram padrões harmoniosos que se alinhem aos de modelos, personagens ou celebridades que admiram. Para isso, alguns recorrem à cirurgia plástica como veículo para alcançar esse objetivo. Apesar de a cirurgia plástica ter como propósito melhorar a autoestima e corrigir características físicas que incomodam, é fundamental que essas decisões sejam muito bem avaliadas.

A preocupação surge quando o indivíduo entra em um ciclo vicioso de múltiplas intervenções, sempre insatisfeito com os resultados, sem uma ideia clara do que realmente deseja alcançar. Em outros casos, busca procedimentos com resultados exagerados que, por vezes, causam impacto, como implantes mamários excessivamente grandes mamas de dois litros ou um litro e meio, lábios desproporcionalmente volumosos, preenchimentos faciais estigmatizados ou intervenções que criam rostos com características semelhantes a personagens fictícios. Esses casos fogem de proporções, indicando uma procura por algo que vai muito além do que é ideal para cada caso – Alessandro Martins

Dr. Alessandro Martins (Foto: Vinicius Mochizuki)

Alguns pacientes que desejam realizar múltiplas cirurgias para se parecerem com personagens ou bonecos acabam entrando em um território onde se torna difícil distinguir o que é saudável do que é patológico. Quando se trata de cirurgias faciais, há inúmeros exemplos de celebridades que passaram por diversos procedimentos na busca de um nariz “perfeito” ou por sucessivos liftings faciais para retardar ou evitar os sinais naturais do envelhecimento.

Embora o face lifting proponha sempre rejuvenescer a aparência, é fundamental que os pacientes entendam que, a partir de uma certa idade, os sinais do tempo não podem ser completamente eliminados. Mesmo com a tração das estruturas faciais por meio de cirurgias, uso de cosméticos e tecnologias associadas, ainda não se criou uma fórmula para interromper o envelhecimento.

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Atualmente, substâncias como os angiossomas oferecem certo grau de renovação das células, mas não são o “elixir da juventude” capaz de impedir o envelhecimento, que continua ocorrendo dia após dia. Por mais cuidados que se tomem, esse processo é inevitável. É importante que o paciente compreenda que, mesmo mantendo uma aparência muito boa para a sua idade, com sinais de envelhecimento suavizados por várias cirurgias e diversos liftings faciais, o uso excessivo de preenchimentos não impedirá o avanço do tempo.

Porém, talvez essa pessoa não note, ao se olhar no espelho, todas as mudanças que tem buscado. É nesse contexto que surge a dismorfofobia: como se enxerga? Será que consegue se reconhecer? Consegue valorizar os benefícios que já obteve com as cirurgias e os procedimentos? Esse desejo incessante por cada vez mais e a incapacidade de apreciar os resultados alcançados podem ser indícios de uma condição patológica.

Um exemplo disso são as pacientes que buscam mamas extremamente volumosas, solicitando aumentos progressivos no tamanho das próteses com o objetivo de obter resultados chamativos, muitas vezes voltados para autopromoção, publicidade ou até mesmo para conquistar o título de maior mama do mundo. Esses casos extrapolam os limites anatômicos considerados normais e trazem consequências danosas, especialmente para a pele das mamas, que sofre distensão progressiva à medida que os implantes aumentam de volume.

No Brasil não temos implantes com volumes tão exagerados, mas no exterior existem próteses salinas, que podem ser moldadas ou aumentadas com a adição de soro fisiológico. Esses implantes funcionam como expansores teciduais, causando estiramento gradual da pele da mama. Além disso, o peso excessivo desses implantes pode gerar problemas posturais, comprometendo a saúde da paciente a longo prazo.

Até que ponto a paciente deseja realmente alcançar um resultado que traga satisfação, melhore sua autoestima ou corrija algo que a incomoda? E até que ponto está procurando um exagero intencional, um efeito propositalmente chamativo? Esse tipo de busca não é saudável. Qual seria, de fato, o benefício, a vantagem de atingir esse resultado exagerado?

É papel do cirurgião estabelecer limites e reconhecer quando a paciente está perdendo o controle. Muitas vezes, esses objetivos deixam de estar relacionados ao bem-estar ou à qualidade de vida e passam a ser motivados por razões externas, como autopromoção social ou outras recompensas que não envolvem saúde ou equilíbrio emocional – Alessandro Martins

Isso também ocorre em cirurgias corporais, em que pacientes desejam abdomens progressivamente mais marcados ou cinturas cada vez mais finas. Esses resultados são tentados não apenas por meio de lipoaspirações, mas também através de intervenções mais invasivas, como o remodelamento costal, em que as costelas flutuantes são removidas para alcançar proporções extremas.

Procedimentos como a lipoaspiração e a remoção de costelas, além do uso de cintas ou espartilhos extremamente apertados, podem criar uma cintura excessivamente fina, desproporcional em relação à cintura escapular e ao quadril. Essas intervenções podem causar o deslocamento de órgãos para a região pélvica e até compressão torácica, sem oferecer nenhum benefício real à saúde.

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Outro exemplo preocupante são os volumes glúteos exagerados obtidos por meio de injeção de gordura, próteses de silicone e até substâncias não biológicas, como silicone líquido, hidrogel e polimetilmetacrilato. Esses materiais, muitos deles não aprovados pela FDA ou pela Anvisa para uso em aumento glúteo, apresentam sérios riscos à saúde, incluindo extrusão, formação de fístulas e reações adversas devido ao corpo estranho.

Para mim, porém, o mais alarmante é que algumas pacientes continuam encontrando profissionais dispostos a realizar esses procedimentos, ampliando volumes e oferecendo resultados que vão além dos limites da saúde mental. Isso revela, muitas vezes, a presença de dismorfofobia ou a incapacidade de reconhecer seu próprio resultado, presa a uma busca pela perfeição que, na realidade, a afastou da excelência estética e do equilíbrio há muito tempo.

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Este artigo é um alerta não apenas para os pacientes, mas principalmente para os profissionais de saúde que atuam no campo da cirurgia plástica, mesmo sem serem especialistas na área. Infelizmente, é comum vermos não cirurgiões plásticos — e até pessoas que nem têm formação médica — realizando procedimentos com substâncias injetáveis e operações sem a devida autorização. Muitos pacientes, diante da falta de respostas dos profissionais qualificados, recorrem a esse mercado “alternativo”, confiando em médicos ou não médicos que aceitam promover exageros estéticos. Este é o meu primeiro alerta – Alessandro Martins

O segundo alerta refere-se às cirurgias progressivas e repetitivas, realizadas sem respeitar o intervalo necessário para a recuperação do organismo e dos tecidos. Essas práticas aumentam significativamente os riscos de complicações, como necroses, desvascularização da pele, fibroses, cicatrizes patológicas e retrações cicatriciais. Algumas dessas complicações podem se tornar irreversíveis, especialmente em procedimentos como a rinoplastia. Quando a anatomia do nariz é comprometida — com danos às cartilagens e ao revestimento cutâneo — a pele pode endurecer e espessar devido à fibrose.

Nesses casos, a situação pode exigir cirurgias de reconstrução nasal, muitas vezes empregando técnicas utilizadas em pacientes com câncer ou a amputação do nariz. Isso inclui o uso de costelas, enxertos ósseos e retalhos de outras áreas do corpo, como a testa, para restaurar a região nasal. Esses procedimentos podem deixar cicatrizes visíveis em locais como a testa ou o braço, devido à necessidade de transplantes microcirúrgicos ou de transposição de pele, tudo isso causado pelos danos provocados por múltiplas intervenções inadequadas.

Os preenchimentos labiais podem resultar em necrose, levando à perda parcial ou total do lábio e à necessidade de reconstrução cirúrgica. Mesmo com a melhor técnica e cuidado, as reconstruções raramente se aproximam da aparência original ou atendem às expectativas estéticas da paciente. Pessoas sem qualquer deformidade inicial acabam comprometendo seus tecidos devido à busca excessiva por um ideal inalcançável.

A principal função dos lábios é garantir a continência oral — essencial para comer, beber e manter alimentos e líquidos dentro da boca. Quando o lábio é destruído por necrose, a pessoa pode perder essa capacidade, enfrentando dificuldade para fechar a boca, perda constante de saliva e impossibilidade de se alimentar normalmente. Tudo isso como consequência de uma busca estética frequentemente incentivada por profissionais que realizam esse tipo de procedimento de maneira irresponsável.

O excesso de preenchedores labiais pode causar complicações graves. A pressão excessiva sobre a mucosa do lábio pode levar à isquemia e à necrose, e a injeção acidental em um vaso sanguíneo pode causar trombose e necrose, não apenas no lábio, mas também em outras regiões da face.

Nem sempre é possível reverter os danos causados por preenchedores. Se o material utilizado for absorvível, como ácido hialurônico, enzimas como a hialuronidase conseguem dissolvê-lo. Entretanto, materiais permanentes, como o polimetilmetacrilato, exigem remoção cirúrgica.

Há inúmeros alertas sobre os riscos associados à busca contínua por múltiplas cirurgias, que podem causar danos significativos à anatomia e aos tecidos. Nesses casos, a intervenção cirúrgica não está abordando uma alteração física, mas provavelmente um problema de origem psicológica ou comportamental, que precisa ser identificado e tratado. Esse tipo de questão não deve ser solucionado por um cirurgião plástico, mas por uma equipe multidisciplinar que ajude o paciente a compreender que essa conduta não traz benefícios.

 

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