Vinho, história e turismo de negócios: na Serra Gaúcha a simbiose da indústria da moda com cultura


Durante a Feira Nacional da Indústria Fashion (Fenin), expositores e compradores puderam mergulhar na história da colonização italiana e conhecer a potência de uma região responsável por 80% da fabricação de vinhos no país

Venho batendo na tecla da descentralização dos holofotes da moda do eixo Rio-São Paulo há tempos. E, percorrendo o país, para acompanhar feiras e semanas de moda, sinto cada vez mais os holofotes da indústria sendo plurais. Bento Gonçalves, no Rio Grande do Sul, acaba de receber a primeira edição Verão 2015 da Feira Nacional da Indústria Fashion e o seu idealizador, Julio Viana, assim como outros empresários do setor da indústria da moda que promovem eventos de Norte a Sul do país, apostou no turismo de negócios, proporcionando a expositores e compradores a experiência de se aliar trabalho e turismo. Vem acompanhar essa experiência com a gente.

Quem é amante da sétima arte e assistiu O Quatrilho, filme de Fábio Barreto indicado ao Oscar, se lembra bem da saga de amor vivida nas telas por Glória Pires, Patrícia Pillar, Alexandre Paternost e Bruno Campos, entre outros feras, com música de Jaques Morelenbaum e Caetano Veloso. Contava a história de dois casais de imigrantes italianos, cuja esposa de um se apaixona pelo marido da amiga, em pleno início do século 20. Os dois decidem fugir para viver este amor. A trama se passava em uma comunidade rural da Serra Gaúcha. O cenário escolhido para as filmagens está localizado no chamado Caminhos de Pedra, um mergulho no maior acervo arquitetônico da imigração italiana em nosso país, mais precisamente na casa da família Strapazzon, erguida em 1880. Lá os descendentes da primeira geração de imigrantes ainda vivem da colheita da uva para fabricação do vinho e de uma série de produtos, incluindo até mesmo cremes hidratantes à base de vinho.

Um passeio pelos Caminhos de Pedra, um roteiro com 12 quilômetros de extensão numa área abrangida basicamente pelo Distrito de São Pedro, composto por 7 comunidades, (São Pedro, São Miguel, Barracão, São José da Busa, Cruzeiro, Santo Antonio e Santo Antoninho) é um resgate da história. “A história de um povo contada em forma de arquitetura, paisagens e costumes”, como enfatiza o secretário de Turismo de Bento Gonçalves, Gilberto Durante. Com um céu azul lindo e um frio de 10 graus é um dos passeios mais aprazíveis de se fazer e relembrar a herança dos italianos, que chegaram naquela região desprovidos de bens materiais, mas que construíram um legado de trabalho, religiosidade e valorização do se fazer em família impregnados em seus descendentes até hoje.

De acordo com a Lei Estadual 13.177/09, que declarou patrimônio histórico do Rio Grande do Sul, considera-se como área de abrangência dos Caminhos de Pedra a Linhas Palmeiro e Pedro Salgado, localizadas nos municípios de Bento Gonçalves e Farroupilha, até o limite do município de Caxias do Sul, passando por Caravaggio. Confira as fotos da Cantina e Casa Strapazzon, onde foi filmado O Quatrilho. A casa foi erguida pelos Strapazzon com pedras da região. No primeiro andar, apenas um cômodo, com os tonéis de vinho e onde os animais também eram abrigados em noites frias. A família dormia precariamente em um segundo andar, eguido com madeira:

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Fotos: Henrique Fonseca

Outro ponto interessantíssimo de se conhecer na Serra Gaúcha e inserido no roteiro turístico Caminhos de Pedra, em Bento Gonçalves, é a Casa da Ovelha. O prédio central é em madeira e data de 1917. Totalmente conservado, lá são comercializados queijos, iogurtes, doces, molhos e cosméticos feitos à base de leite, lanolina e uva. É prazeroso ouvir a história do lugar contada por uma guia, que nos mostra fotos em uma TV de led e promove uma degustação dos queijos enquanto conta sobre os diferentes tipos fabricados.

A indústria processa, aproximadamente 100.000 litros de leite por ano. Esta produção é transformada em iogurtes, doce de leite e queijos como o Feta, Pecorino Toscano e Ricota. Atualmente, os rebanhos da Casa da Ovelha e de quatro produtores da região somam juntos, 900 ovelhas Lacaune. Cada produtor divide a pequena área que possui e seu trabalho diário entre os parreirais e as ovelhas.

O visitante pode acompanhar uma tosquia de ovelha e fica sabendo que o sistema de criação é o semiconfinamento em galpão de piso ripado, sendo que, em determinadas épocas do ano, os animais são soltos sob os parreirais. A alimentação dos animais é baseada em silagem de milho, ração, feno e pasto. Para diminuir a estacionalidade na produção de leite, são realizados quatro períodos reprodutivos ao longo do ano. Assim, têm-se dois lotes de ovelhas em lactação, um no início e outro no final deste período.

 

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Fotos: Henrique Fonseca

 

Seguimos para a Casa da Erva-Mate, pois nenhum gaúcho vive sem o seu chimarrão. Os imigrantes italianos adquiriram o hábito de tomar a bebida com os índios (bugres), que a chamavam de Caá-i e passaram a produzir a erva-mate em grande escala. A casa está instalada no local onde funcionou o antigo moinho Cecconello e o visitante pode conferir o processo de produção artesanal com os soques movidos à roda-d’água (do final do século 19 ao início do século 20). A família Ferrari recebe os visitantes com degustação do chimarrão e vende uma série de produtos ligados à produção da erva-mate.

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Fotos: Henrique Fonseca

 

Outra opção de passeio imperdível na Região Uva e Vinho é uma manhã a bordo da Maria-Fumaça. São 23 quilômetros de percurso com duração de duas horas, mas que voam de tantos atrativos. O nosso embarque foi realizado na cidade de Carlos Barbosa e o destino era Bento Gonçalves, passando por Garibaldi. Há apresentação de teatro regional com atores vestidos a caráter como os antigos imigrantes, degustação de vinhos na parada, músicos com um repertório típico italiano, incluindo uma dupla que toca a tarantela, e um visual incrível da Serra Gaúcha.

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Fotos: Henrique Fonseca

 

Chegando em Bento Gonçalves, você não pode deixar de conhecer a Igreja Matriz Cristo Rei, uma construção em estilo gótico que levou cinco anos para ficar pronta. Sua inauguração foi em 1954 e, além da arquitetura, seus vitrais são belíssimos.

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Fotos: Henrique Fonseca

 

Terminamos a nossa viagem na Rota Rural Encantos de Eulália, com um jantar típico de um colono italiano no casarão da família Toniolo, que migrou para Bento Gonçalves no final do século 19. Seus descendentes mantém as características da grande casa como no passado e podemos ver os costumes, o mobiliário e as ferramentas daqueles que fizeram a história da colonização do Sul do país. O local é tão fascinante que é alugado para eventos, incluindo casamentos mil de pessoas que saem do Sudeste em busca de um passado. Nada mais acolhedor do que um jantar preparado pelo italiano Ney Tomasi, que trabalha no cultivo da uva e é também um excelente chef de cozinha.

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Fotos: Henrique Fonseca