Tik Tok: infantilização na comunicação por visibilidade ou ‘respiro’ com divertidas (e rentáveis) possibilidades?


A rede social de vídeos curtos famosa no mundo todo e com bilhões de usuários tem atraído simpatizantes, mas também críticas. Observamos aqui alguns prós e contras da utilização do aplicativo, e a psicóloga Maria Rafart analisa dois lados da ‘moeda’ tik toker: o ‘vale tudo’ na exposição em busca da atenção e engajamento, e a procura da leveza cada vez mais escassa em tempos difíceis. “O boom das dancinhas é emblemático: é como se os adultos conseguissem, de certa forma, entrar em um mundo alegrinho e infantilizado, pelo perfil de uma rede social. No entanto, no tocante à levar uma vida com mais leveza, é importante saber brincar e de vez em quando assumir um personagem sem compromisso. A vida é bastante dura e a brincadeira tem um lugar simbólico importante em nosso aparelho psíquico”

*Por Brunna Condini

O ano foi do Tik Tok, que tem feito até artistas já reconhecidos do público como Anitta, Deborah Secco, Isis Valverde, Maisa Silva e Larissa Manoela, entre outros, se renderem aos seus vídeos com as famosas dancinhas, dublagens e challenges. Desde que a pandemia começou, o número de usuários da plataforma só aumentou, inclusive entre as celebridades, atores e cantores. A ideia é a diversão pura e simples, estabelecer um novo tipo de comunicação com o público, o foco na divulgação do trabalho e engajamento ou tudo isso junto?

O sucesso é tanto por aqui que a primeira edição do TikTok Awards reuniu criadores de conteúdo da plataforma para celebrar os que mais brilharam e de destacaram em 2021. Há quem reconheça as possibilidades a serem exploradas no aplicativo que é o mais rentável do mundo hoje, com adeptos de todas as idades, conquistados pelos seus vídeos curtos – entre 15 segundos e três minutos – produção na maioria das vezes amadora e em clima espontâneo: tudo para divertir e ser consumido com velocidade.

Além disso, para muita gente, a rede não é só o ‘festival de dancinhas’ que vemos por aqui. Muitas empresas têm usado o Tik Tok para impulsionar seus empreendimentos, e sucessos nos rankings do Spotify e YouTube têm ligação direta com o que é tendência na plataforma, que alcançou a marca de 1 bilhão de usuários ativos mensais, mesmo sem contabilizar seu público chinês, local de origem do aplicativo. No entanto, alguns observam a infantilização na comunicação neste tipo de rede social, quando quem influencia faz qualquer coisa na plataforma em busca de atenção. “Na primeira vez em que ouvi falar de Tik Tok, foi quando uma paciente me enviou um vídeo de sua irmã menor, em que a menina chorava. Ela estava preocupada. Naquela época, o aplicativo era um reduto de crianças e adolescentes que usavam os vídeos como uma espécie de confessionário. O boom das dancinhas é emblemático: é como se os adultos conseguissem, de certa forma, entrar em um mundo alegrinho e infantilizado, pelo perfil de uma rede social”, analisa a psicóloga Maria Rafart.

A atriz Isis Valverde se divertiu durante a pandemia fazendo vídeos que fazem sucesso no seu perfil do Tik Tok, que já tem quase 18 milhões de seguidores (Reprodução)

A atriz Isis Valverde se divertiu durante a pandemia fazendo vídeos no seu perfil do Tik Tok, que já tem quase 18 milhões de seguidores (Reprodução)

“Quando negamos a nossa versão adulta, negamos também nossos problemas, que teríamos que enfrentar como gente grande. O mecanismo de negação é largamente conhecido pela Psicologia, e ele é usado para nos afastar de várias experiências negativas. No caso das dancinhas, é desencadeado este mecanismo de negação: usamos de subterfúgios para negar a nossa idade, seja com roupas, seja com comportamentos. Quanto mais adolescentes formos, menos velhos seremos, e, nesta fuga, no nosso imaginário nos afastaremos da velhice. Numa sociedade que rende homenagens ao altar da beleza e da juventude, talvez dançar e dublar seja o melhor remédio.”, completa a terapeuta.
Por outro lado, a ferramenta do momento e seu direcionamento divertido – apesar da velocidade na comunicação que pode gerar ansiedade em algumas pessoas – proporciona a criação de conteúdos que permitem aos usuários famosos ou não, ‘brincarem’ de ser, já que no Tik Tok também é possível encontrar pessoas reais fazendo vídeos reais. Neste contexto, quem tem utilizado a plataforma costuma buscar a possibilidade de criar montagens, fazer desafios (challenges), dublar músicas e interpretar personagens diversos. Afinal, rir de si mesmo faz bem, ainda mais em tempos tão desafiadores. “No tocante à levar uma vida com mais leveza, é importante saber brincar e de vez em quando assumir um personagem sem compromisso. A vida é bastante dura e a brincadeira tem um lugar simbólico importante em nosso aparelho psíquico. Freud se referia ao chiste como sendo uma das formas de expressão do inconsciente, uma forma de liberar pensamentos inibidos”, conclui Maria Rafart.
Sabrina Sato apresentou e famosos se reuniram no TikTok Awards, que aconteceu na semana passada (Fotos: Foto: Lucas Ramos /Agnews)

Sabrina Sato apresentou e famosos se reuniram no TikTok Awards, na semana passada (Fotos: Foto: Lucas Ramos /Agnews)

A plataforma em números

O Tik Tok anunciou em setembro deste ano que alcançou a marca de 1 bilhão de usuários ativos por mês. Desde julho de 2020, houve um crescimento de 45%. Os Estados Unidos, a Europa, o Brasil e o Sudeste Asiático são os maiores mercados da plataforma, segundo declarou a empresa à Reuters. A rede se tornou o 1º concorrente do grupo Facebook a ultrapassar 3 bilhões de downloads. A plataforma vem crescendo a passos largos, tanto que US$ 500 é a quantia em média que o TikTok está pagando para os influenciadores criarem conteúdo. A empresa também criou recentemente um Fundo para Criadores de US$ 1 bilhão. Esse dinheiro será pago diretamente aos criadores de conteúdo, com o objetivo de firmar ainda mais o relacionamento com os influenciadores.

A Forbes publicou um relatório sobre as estrelas mundiais mais lucrativas do TikTok. Addison Rae chega em primeiro lugar com US$ 5 milhões, Charli D’Amelio é a número dois com US$ 4 milhões e sua irmã, Dixies é a número três com US$ 2,9 milhões. Por aqui, entre os brasileiros mais seguidos na plataforma, estão o comediante e ator brasileiro Tirulipa com 25.9 milhões de seguidores; a influenciadora digital Virgínia Fonseca com 27.3 milhões de seguidores; Larissa Manoela com 23.2 milhões de seguidores; Whindersson Nunes com 19.3 milhões de seguidores; a atriz Isis Valverde com 17.7 milhões de seguidores; e a atriz e apresentadora Maísa Silva com 17.6 milhões de seguidores. Ainda segundo a Comscore, uma empresa dos Estados Unidos de análise da internet, um dado interessante, é a pluralidade de usuários refletida na porcentagem por idade: entre 10-19 anos (32,5%), entre 20-29 anos (29,5%), entre 30-39 anos (16,4%), entre 40-49 anos (13,9%), + 50 anos (7,1%). E tem mais: 60% dos usuários do TikTok são da Geração Z, os criadores de tendências.

Primeira brasileira a ter conta devolvida

A influenciadora digital Jaqueline Santos teve inesperadamente sua conta do Tik Tok que tinha 1 milhão e meio de seguidores e quase 300 milhões de visualizações, ser banida permanentemente da rede. A humorista usa as redes sociais para divulgação do seu trabalho. Apesar do susto, ela teve a conta devolvida na última quarta-feira (14). Aliás, foi a primeira brasileira a conseguir isso, evitando maiores prejuízos pela falta do uso do aplicativo em sua rotina. “Quero agradecer ao Tik Tok por ter devolvido a minha conta, por entender o conteúdo como humorístico e que realmente não tem conotação sexual, mas o objetivo de divertir fãs e seguidores. Fico muito feliz que foi reparado o erro e que não venha acontecer com outras pessoas. Hoje está muito difícil para os humoristas se expressarem, pensamos muito antes de gravar algo, criar nossos textos”, celebrou, sobre o retorno das atividades na plataforma que é uma ‘febre’ mundial.

Para desespero da influenciadora Jaqueline Santos, a conta foi banida Tik Tok e ela levou dias até ser reativada (Divulgação)