*Por João Ker
Na noite do último domingo (20/04), o canal OWN, da toda poderosa Oprah Winfrey exibiu o último de oito episódios de “Lindsay”, a série documental (codinome para reality show requintado, de nariz empoado) sobre a vida da atriz Lindsay Lohan pós- rehab (a sétima da sua curta existência, número cabalístico). Por cerca de 140 dias, as câmeras frenéticas da diretora Amy Rice, responsável pelo documentário sobre a campanha eleitoral de Barack Obama, seguiram os poucos altos e muitos baixos da “nova fase” da ruiva enfant terrible. Depois de muitos atrasos, compromissos remarcados, trabalhos cancelados, choradeira e dramalhão, os últimos cinco minutos do último episódio parecem ter sido a única coisa verdadeira durante toda essa experiência. Mas, teria como ser diferente?
Desde 2006, quando se ouve o nome da ex-estrela da Disney Lindsay Lohan associado a uma vida desregrada, é de se esperar que as próximas palavras sejam “cadeia”, “tribunal”, “badalo”, “escândalo” ou “drogas”. Sim, ela faz aquela linha de quem é péssima influência, tanto nas escola quanto no playground, sinônimo de sermões proibindo que a prole ande em sua companhia, sob o risco de se cortar a internet no quarto, a tevê a cabo e as sobremesas. A menina-prodígio que conquistou Hollywood aos 11 anos de idade quando apareceu naquele filme da Disney, “Operação Cupido”, poderia ser a nova Anne Hathaway, mas preferiu seguir os passos de gente menos afeita à rotina pacata, tipo Charlie Sheen, e virar persona non grata em festinhas de adolescentes controlados pelos pais.
Teve sua vida esmiuçada por todo e qualquer tabloide ao redor do mundo e fez a alegria dos paparazzi do Círculo Polar Ártico à Terra do Fogo. Atrasos nos sets de gravação, barracos na balada, acidentes de carro e micos em público se tornaram as notícias mais frequentes sobre a boa atriz transformada em mera celebridade, que havia sido uma das mais promissoras de sua geração. Depois de ter brincado inúmeras vezes com a paciência da comunidade cinematográfica, dos fãs e do seu próprio time de coworkers, a série “Lindsay” parecia ser a última carta na manga que a garota ainda tinha para conseguir o respeito dos diretores e produtores de cinema, exceto o ex-junkie Paul Schraeder, que a escalou para seu último longa, “The Canyons” (idem, 2013), justamente por sua performance na vida como bad girl. E Oprah Winfrey, esnobada neste último Oscar por “O Mordomo da Casa Branca” (The Butler, de Lee Daniels, The Weisntein Company, 2013), sabia muito bem disso. A nega tem inteligência de sobra e sabe correr atrás para causar.
Desde a entrevista que foi concedida ao programa da grande O., algo já cheirava a mentiras quando Lindsay admitiu que seu vício maior era o álcool. Ora, graças às inúmeras fotos e divulgação de escândalos, o mundo inteiro sempre soube que ela preferia aditivos mais acelerados, capazes de fazer o coração trepidar como uma britadeira. Então, por que não abrir o jogo logo de vez? Mas isso foi varrido para debaixo do tapete Tabacow até que veio o programa. Por sete semanas, telespectadores assistiram a atriz cambalear em sua sobriedade, desmarcando compromissos e sendo sugada por um escrete de vampiros, todos à sua volta: sua mãe, Dina Lohan, fez um livro autobiográfico que praticamente só existe graças à filha; seu pai, Michael Lohan, pede dinheiro para comprar um carro que ele tinha prometido dar de presente ao filho caçula; seu irmão parece não ser capaz de lançar um projeto sequer sem envolver o nome dela no meio; seus amigos a traem constantemente ao longo desse curto período de tempo; e até seus colegas de trabalho, vide a editora da Elle Indonesia, fazem a linha duas-caras e falam mal da ruiva pelas costas. O público fica dividido entre sentir pena de uma mulher de 27 anos sozinha, viciada e vulnerável e continuar odiando uma atriz egocêntrica e imprevisível. Sim, porque Lindsay Lohan sabe incorporar um caboclo como ninguém, só faz o que quer e até a produção do próprio documentário se torna um drama à parte em suas mãos de seda.
Bom, pelo menos era isso que dava para entender até o último episódio. Neste, Lindsay explicou a famosa lista, vazada mês passado, que continha todo o seu suposto histórico sexual, praticamente aquilo que seria a alegria da turma alegre, caso esta tivesse encontrado o gênio da lâmpada. Com direito a bem mais que três desejos, a relação contém os nomes de bonitões do calibre de Justin Timberlake, James Franco, Jared Leto, Heath Ledger, Adam Levine, Colin Farrel, Zac Efron e Joaquin Phoenix , que comparecem na própria caligrafia da troublemaker, como se fosse uma daquelas listinhas de clientes da cafetina de Brasília. E, tudo bem, é perfeitamente compreensível sentir um pouquinho de inveja de Lohan neste momento, afinal o mundo inteiro sentiu. “Aquilo era o meu 5º passo na reabilitação dos Alcoólicos Anônimos. Era algo pessoal que foi roubado enquanto eu me mudava do hotel para o apartamento. Eu sei quem vazou a lista e essa pessoa não está mais na minha vida, porque quem faz uma coisa dessas tem sérios problemas na cabeça e eu não quero alguém assim perto de mim”, declarou. Okay, cherie, foi traição, mas você dá mole, não é?
Terminadas as gravações, a atriz admitiu em entrevistas que alguém da própria produção do programa havia roubado e vazado a tal lista dos sonhos. Sim, segundo ela, alguém da equipe de Oprah Winfrey, a detentora da verdade e dos bons costumes, espalhou para a mídia um documento pessoal de uma mulher viciada em troca de audiência. Lindeza.
E então a saga “Lindsay Lohan e o mistério de seus atrasos” é explicada de maneira crua e abrupta, deixando a própria diretora da série documental (que já havia cansado de reclamar para as câmeras sobre sua falta de responsabilidade) constrangida: “Ninguém sabe disso, mas durante aquelas duas semanas em que eu estive fora do ar, eu fiz um aborto. E isso mexe com a cabeça. Então, quando eu dizia que eu não podia filmar, era porque eu não conseguia sequer me mover”. Um tapa de luva (de pelica) na cara de todo mundo. E, claro, após o susto, vieram as especulações de praxe: será que ela realmente sofreu um aborto? Essa desculpa não parece conveniente demais?
O programa termina assim, sem eira nem beira, e ninguém além da própria Lohan alcançará uma epifania qualquer sobre sua vidinha polêmica. Se nem o competente cineasta Eduardo Coutinho atingia a verdade máxima em seus documentários, quem seriam, afinal, Oprah Winfrey e seus asseclas para conseguir tal feito? Desde o início, o programa se revelou mero escambo de favores: Oprah precisava de audiência para o seu canal, que não estava bom das pernas; e Lindsay, que também não é nenhum anjo, precisava de mídia e dinheiro para manter seu estilo de vida desregrado e as narinas em riste. A única dúvida que fica é quem usou quem de maneira pior: Oprah, transformando a vida de uma viciada recém-saída da reabilitação em um verdadeiro e estressante caos, como uma açougueira? Ou Lindsay, que alegava dizer a verdade uma vez na vida e se acabou se escondendo quando lhe era conveniente? Melhor ir ao teatro!
Assista aos momentos mais tensos da série (Divulgação)
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