Nicole Puzzi, eterno símbolo sexual: “Nunca fui submissa a ninguém. Homem nenhum mandou em mim”


Irreverente e apostando na diversidade, a atriz e apresentadora estreia a sétima temporada do Pornolândia, no Canal Brasil. “O programa contribui bastante para quebras de preconceitos na vida sexual das pessoas. A gente não pode mais ficar criticando a sexualidade alheia. Isso tem que parar”, pontua. De sua geração, Nicole foi uma das mulheres mais bonitas e desejadas do país. Atuou em diversos filmes considerados pornochanchadas e ganhou capas de revistas masculinas. “Estou com 63 anos. Ao longo da minha carreira, acho que bati o recorde como símbolo sexual. Me enxergam assim há 43 anos. Não foi uma opção minha. Aconteceu. Eu não me sinto desse jeito, no meu dia a dia, sou uma pessoa muito simples. Acho que o povo está maluco. Estou quebrando parâmetro, vamos dizer assim”, frisa.

Nicole Puzzi estreia a sétima temporada do programa Pornolândia, no Canal Brasil (Foto: Les Chux)

Nicole Puzzi estreia a sétima temporada do programa Pornolândia, no Canal Brasil (Foto: Les Chux)

* Por Carlos Lima Costa

Com a irreverência de sempre, abordando temas ousados, a sétima temporada do Pornolândia, programa comandado pela atriz e apresentadora Nicole Puzzi estreia na madrugada desta segunda para terça-feira, no Canal Brasil. “Conversamos com pessoas que não tinham tanta visibilidade e cresceram muito com a pandemia. Um assunto que vamos falar, por exemplo, é que as mulheres de pele preta são as que mais sofrem preconceito em termos sexuais. O programa contribui bastante também para quebras de preconceitos na vida sexual das pessoas. A gente não pode mais ficar criticando a sexualidade alheia. Isso tem que parar”, pontua.

Desta vez, por conta da pandemia, os 13 novos episódios foram gravados no formato híbrido, abordando temas como educação sexual, diversidade de corpos, mudanças no mercado pornô e no primeiro episódio a convidada é a atriz Gabrielle Joie, uma mulher trans. A transfobia é um dos vários preconceitos da sociedade atual, onde ao contrário de décadas passadas, ainda existe a questão do politicamente correto, em que é de bom tom não falar mais certos termos.

“Estamos vivendo o período mais chato, agressivo, violento desnecessariamente. Eu sou da geração do final dos anos 70, do flower power, e dos anos 80, que era a loucura e liberação total, aparentemente. Mas, na verdade, não era nada liberado e cheio de preconceito, mas eu nunca tive. Por isso, resolvemos falar da diversidade, conversar com pessoas que tenham o que dizer. É mostrar que é tudo natural, que as pessoas passam por desnecessários sofrimentos de repressão sexual. Vivemos em um país em que 60% ou 70% têm dificuldades sexuais. Não são bem resolvidos. Por isso, criticam o alheio. Você critica no outro aquilo que está dentro de você”, reflete.

Nicole se identifica com o perfil do programa irreverente e repleto de assuntos ousados, que muitas pessoas não gostam de falar em família. “Eu nasci irreverente, a ovelha separada do rebanho, completamente diferente das minhas irmãs. Elas são maravilhosas, mas eu era mais teimosa e provocativa. A gente morava na fazenda. Minha mãe (Tereza, morreu há 23 anos) nunca soube o que era feminismo, mas ela era feminista. Tinha uma postura incrível, defendia a mulher. Uma vez ela enfrentou um cara que estava batendo na esposa, uma vizinha. Ela estalou o chicote em cima dele. Então, vi minha mãe essa mulher forte e sempre quis ser igual”, relata.

"O programa contribui para quebras de preconceitos na vida sexual das pessoas. A gente não pode mais ficar criticando a sexualidade alheia. Isso tem que parar”, ressalta Nicole (Foto: Les Chux)

“O programa contribui para quebras de preconceitos na vida sexual das pessoas. A gente não pode mais ficar criticando a sexualidade alheia. Isso tem que parar”, ressalta Nicole (Foto: Les Chux)

E prossegue em seu comparativo com a mãe. “Queria mais é ser feliz como ela, que estava sempre dando risadas, mas aprendi que a vida é sofrimento em busca da felicidade. Agora, não sou irresponsável nem inconsequente. Mas, como disse, sou bem irreverente. Gosto de brincar, sou irônica sem ofensa e me defendo sempre. Nunca fui submissa a ninguém, principalmente a nenhum homem. Nunca quis me casar e sou mulher cis hétero”, enfatiza.

Nicole não quis casar nem mesmo com o pai de sua filha (Dominique Brand). “Ele só não foi um erro, porque nasceu a minha filha, então, tenho muita gratidão, mas quero distância. É um péssimo pai. Infelizmente, porque namorei tanta gente bacana. Nem sei nem por onde que anda. Eu sempre quis que ela tivesse a presença de um pai, mas ele abandonou a filha. Ele só soube que eu estava grávida quando eu estava com cinco meses. Quando nós terminamos, eu fui fazer o filme Gabriela, com o Marcello Mastroianni (1924-1996), e ainda nem sabia que estava grávida”, relembra ela, que na atual temporada do Pornolândia, entrevista também uma especialista em clitóris e no prazer feminino.

Há alguns anos era impensável debater assuntos como este na televisão. “Era o machismo estrutural. Se você pensar nos anos 70, o homem era machista, mas ele vinha de uma criação, descendia de um machismo, então, a gente até entendia e o mundo não era globalizado. Hoje em dia com as informações e com a globalização, o homem pode não ser machista e ter a sexualidade que ele quiser. A mulher é uma parceira do homem. Claro que depende tanto do homem quanto da mulher. Olha o exemplo do Tarcísio Meira (1935-2021) e da Glória Menezes. Trabalhei com ele no filme Eu. Era um gentleman, uma das melhores pessoas que eu conheci”, afirma.

"Ao longo da minha carreira, acho que bati o recorde de símbolo sexual. Me enxergam assim há 43 anos", pontua a atriz e apresentadora (Foto: Les Chux)

“Ao longo da minha carreira, acho que bati o recorde de símbolo sexual. Me enxergam assim há 43 anos”, pontua a atriz e apresentadora (Foto: Les Chux)

De sua geração, Nicole foi uma das mulheres mais bonitas e desejadas do país. “Estou com 63 anos. Ao longo da minha carreira, acho que bati o recorde como símbolo sexual. Me enxergam assim há 43 anos. Não foi uma opção minha. Aconteceu. Eu não me sinto desse jeito, no meu dia a dia, sou uma pessoa muito simples. Acho que o povo está maluco. Estou quebrando parâmetro, vamos dizer assim”, frisa.

Nos anos 70 e 80, Nicole brilhou em filmes rotulados como pornochanchadas como O Prisioneiro do Sexo e O Convite ao Prazer. “A gente trabalhava seriamente. Eu fazia cinema. As pessoas que colocaram alcunha. Pessoas mal resolvidas”, ressalta. Naquela época, pela imagem transmitida pelos personagens, muitos homens criavam um imaginário sobre ela. E a desejavam.

“A imagem, tem até hoje. Eu entendo assim. Eu sou demissexual, só me envolvo quando tenho algum sentimento pela pessoa ou uma atração muito forte. Caso contrário, não consigo. Então, quando eles chegavam por causa da imagem, se eu me sentisse interessada, o que era bastante difícil, até saía um namoro. Senão, podiam fazer o que quisessem, que não era assim para sair com uma pessoa. Sempre fui muito independente. Homem nenhum mandou em mim. Se meu pai não mandou em mim, imagina os outros. Eu só saí com quem eu quis, por algum tipo de sentimento. Agora, é normal as pessoas idealizarem. Para elas, é bom essa idealização, pra gente nem sempre. Assim, sou mais simples do que as pessoas imaginam, sou do interior”, assegura.

E reforça seu entendimento. “Sou uma mulher que percebe tudo ao redor. Claro que existia preconceito. Sempre houve, ainda existe. Sofri preconceito. Muito. Estruturado até. As pessoas não percebem até que é preconceito. Eu fiz cinema nacional. Se as pessoas querem julgar algo, vejam os atores com os quais eu trabalhei. Eles também fizeram os mesmo filmes que eu, junto comigo. Atores e atrizes famosas e aí só sobra pra mim? Mas esse tipo de preconceito não me machuca. Uma vez, no final dos anos 80, uma mulher veio me bater no meio da rua, eu nem sabia quem ela era. Vai entender. O marido dela devia ser meu fã. Essas coisas acontecem, não só comigo. Eu revidei. Ela sabia quem eu era. Até hoje, tem pessoas que vem falar umas bobagens pra mim inbox ou na minha postagem, eu simplesmente deleto e bloqueio. Não quero esse tipo de pessoa do meu lado”, pondera.

"Só me envolvo quando tenho algum sentimento pela pessoa ou uma atração muito forte. Caso contrário, não consigo", afirma Nicole (Foto: Les Chux)

“Só me envolvo quando tenho algum sentimento pela pessoa ou uma atração muito forte. Caso contrário, não consigo”, afirma Nicole (Foto: Les Chux)

E prossegue falando sobre atividades que exerce. “As pessoas não sabem quem eu sou, tem que me ver resgatando cachorro, ninguém me reconhece. Eu não faço isso por glamour, nem toda bem vestida. Eu boto a mão na massa. Fui voluntária na Febem, a Kate Hansen também e a gente ia lá para trabalhar, tanto é que estou revelando agora, porque já passou. Fiquei com três filhos da Febem. Dois morreram e um está vivo até hoje. Quase morreu pela Covid, é uma pessoa maravilhosa”, conta.

E relata mais detalhes. “À princípio, eu os trouxe para passar o Natal com a minha família. Eles nunca tinham passado essa data com uma família. Eu orientei eles, pedi a guarda, queria adotá-los, mas era solteira, então, na época não podia, aquelas bobagens todas que graças a Deus foram derrubadas. Eu os coloquei em uma pensão e tratava sempre como filhos, até porque já não eram crianças. Um tinha 14 anos, mas tinha uma vivência de 30. Os outros tinham 17 e 19 e moravam na rua. Trouxe essas três pessoas para a minha vida, mas um foi assassinado, outro morreu de pneumonia adquirida nas ruas e o Roni Galvão é o único sobrevivente, constituiu família, me deu minha netinha, que se chama Nicole, nunca dependeu de mim”, acrescenta.

A filha biológica ainda não lhe deu netos. “Não vou ter, porque ela tem uma postura de que não quer colocar filho nesse mundo, porque acha que não vale a pena”, explica sobre a instrumentadora cirúrgica. Dominique também faz parte da companhia de teatro dos Satyros, da qual Nicole também pertence. Elas atuaram juntas duas vezes, no teatro, no início dos anos 2000, quando moravam na Itália.

Nicole, então, explica que visão tem do amor nessa fase madura. “Me apaixonei duas vezes. Um morreu, o outro me deixou. Quando perdi esses dois caras, não fiquei amargurada. mas muito triste. Mas se eu tiver que namorar, eu namoro, E se estou sem namorado, não me importo, até porque sem esnobismo, sem ser fresca, é muito fácil para mim. A vida me colocou nisso de ser muito fácil conquistar um cara ou namorar alguém que eu queira. É muito fácil até hoje. Mas, às vezes, não quero essa facilidade, não quero ir atrás, quero ficar sossegada, na minha cama com meus cachorros (ela tem cinco em casa e faz parte de uma ONG, onde existem cerca de 300 animais entre cachorro, gato, bode, papagaio), quero ficar assistindo televisão, escrever, fazer o meu trabalho”, observa Nicole, que recentemente filmou o longa-metragem A Arte de Encarar O Medo.

“Eu sou muito simples, sou da roça. As pessoas não acreditam quando falo isso. Eu só quero paz e sossego na minha vida, não quero mais polêmica. Mas também não desafia, porque aquela menina malcriada ainda está dentro de mim. Mas não quero polêmica, discussão, nada. Tenho 63 anos. Quanto tempo mais eu tenho de vida? Dez anos, 15, 20 talvez. Então, porque vou transformar esse tempo em um sofrimento?”, questiona ela, que desde os 14 anos não come nenhum tipo de carne.

"Eu só quero paz e sossego na minha vida, não quero mais polêmica. Mas também não desafia, porque aquela menina malcriada ainda está dentro de mim", assegura (Foto: Les Chux)

“Eu só quero paz e sossego na minha vida, não quero mais polêmica. Mas também não desafia, porque aquela menina malcriada ainda está dentro de mim”, assegura (Foto: Les Chux)

Uma das atrizes mais bonitas que o Brasil já conheceu, Nicole encara com tranquilidade a passagem do tempo. “Ninguém fica para a semente e até hoje estou em uma grande vantagem, admito. Sou realista. Por enquanto, não sei como é ficar envelhecida. Eu vejo alguns sinais no meu corpo, algumas dorzinhas que eu nunca tive. Mas e daí se eu ficar velha? O problema é que a gente escuta demais a opinião dos outros. E é claro que vou ficar velha. Já coloquei botox, mas até agora não fiz nenhuma plástica para chegar até aqui assim como eu estou. Se eu tiver que fazer, farei tranquilamente”, diz.

E explica como enxerga o papel da mulher na sociedade hoje em dia. “Continua vítima. A maior vítima no país depois das pessoas pretas. As mulheres pretas estão no patamar mais alto do preconceito e de vítimas. Depois vem todas as pessoas pretas e em seguida, a mulher branca, porque a mulher branca sofre muito assédio, mas é mais fácil para ela se defender.  Sou assistente social formada, não tenho o certificado, e sou bacharel em Direito. Tenho postura forte em relação aos Direitos Humanos no dia a dia, coisas que aprendi nessas duas faculdades”, aponta.

E enfatiza sobre a questão do assédio. “Eu sofro assédio a vida inteira, até hoje, mas até uma certa idade não sabia lidar. Depois aprendi e achei que infelizmente fazia parte do fato de eu ser mulher, porque não assediam só mulher bonita, nova ou que faz fotos sensuais, eles vão lá e estupram senhoras de 80 anos, então, não existe uma justificativa”, reflete ela, cuja mais recente novela da qual participou foi Amor e Revolução, exibida até janeiro de 2012, no SBT. Anteriormente, eseve em tramas como Os Imigrantes, na Band, Barriga de Aluguel, na Globo, e Mania de Querer, na extinta TV Manchete.