Golearte no Circo Voador agita jogo do Brasil com Orquestra Voadora e simpatia do público


Evento foi montado para transmitir os jogos brasileiros na Copa e ainda contou com show da Orquestra Sinfônica e público que não deixa se abater com placar

*Por João Ker

Quando a FARM e o Circo Voador anunciaram uma parceria para os dias de jogo do Brasil na Copa do Mundo, parecia que o encontro perfeito havia sido formado. Duas marcas com o DNA carioca-de-butique fazendo um evento grátis na Lapa, coração eterno da boemia no Rio. Só a oportunidade de ver um jogo da Seleção com um telão no Circo já valeria a experiência, mas a produção resolveu incrementar ainda mais a Golearte com apresentações pós-jogos e, ontem, foi a vez da Orquestra Voadora consolar os torcedores desolados com o zero a zero.

O jogo foi Brasil versus México e, desde o início da tarde, a fila do lado de fora do Circo já chegava aos Arcos. Quem conseguiu entrar antes de os portões se fecharem, deu sorte. As tradicionais palmeiras do espaço estavam customizadas com símbolos das seleções participantes e os torcedores se dividiam entre os que conseguiram chegar cedo e pegar um lugar sentado no chão sob a lona e aqueles que vagavam pelas tevês espalhadas pelo lado de fora (o telão só foi funcionar no final do segundo tempo). Gringos, crianças, senhoras, senhores, jovens, casais, solteiros e turistas andavam por todos os lados segurando seus copos de frozen ou de chope enquanto esperavam o jogo começar, lotando o espaço, mas sem deixá-lo insuportável.

Área externa do Circo

Área externa do Circo

E então começou. O Hino Nacional foi cantado por todos e alguns dos presentes se emocionaram a ponto de limpar uma lágrima discreta no canto do olho. O primeiro tempo ocorreu com os ânimos parcialmente contidos, à espera da goleada que não vinha. “Cadê o gol? Eu tô esperando até agora para pegar minha cerveja”, gritou Esther, uma mulher de 30 anos que segurava uma ficha de chope na mão e esperava algum ponto brasileiro para poder trocá-la, graças à promoção de dose dupla que a casa fez para os primeiros cinco minutos pós-gols da Seleção Brasileira (truque que teria sido um alívio para o bolso caso o placar não estivesse estagnado).

Assim como Esther, muitos torcedores desistiram de esperar o próximo tempo e formaram uma fila quilométrica para resgatarem seu copo de cerveja, que durou até um bom tempo depois de o jogo ter recomeçado. Um pouco mais impaciente -assim como o resto do Brasil, provavelmente -, o público urrava e se descabelava todas as vezes que algum jogador brasileiro chegava na área do goleiro adversário, só para depois se decepcionarem em uníssono, xingando técnico, jogador, México e quem mais desse na telha. Um comportamento normal para quem gosta de ver futebol, principalmente quando assiste a um jogo em algum local com pessoas em volta.

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Público concentrado dentro do Circo durante o jogo e na hora do Hino Nacional

 

Acabou a partida, o resultado não foi o desejado – mas também não foi uma derrota! – e, antes que desse tempo de se revoltar muito mais, a Orquestra Sinfônica começou o show, colocando todo mundo para dançar. Quem conseguiu fazer contato visual, a partida teve a largada para ir à caça e, como já era noite e a música estava rolando solta, o número de casais espalhados pela lona e pelo pátio foi se multiplicando aos poucos. Meninas tiraram seu bambolês e, sabe-se  lá por qual motivo, começaram a rodar aquilo no meio de todo mundo.

Com os balões da FARM flutuando pelo ar, o vocalista da Orquestra disse ao microfone que era um prazer imenso tocar no Circo e completou: “Essa cidade respira cultura!”. E o evento foi um ótimo exemplo de diversificação dessa cultura, ainda que em pequenas doses: o clima de “feriado” repleto de pessoas com acesssórios na cabeça e roupas temáticas era graciosamente similar ao do Carnaval, ainda mais se forem levados em conta os turistas presentes; o som instrumental da banda foi tão contagiante que vários túneis de festa junina foram improvisados na frente do palco, adicionando um clima de São João circense que era completado pela presença de alguns pernas-de-pau que transitavam pelo ambiente. No topo disso tudo, ainda teve o som do DJ Lecinho – depois de a Orquestra Sinfônica ter feito o clássico passeio pelo público, aumentando ainda mais a empolgação daquilo tudo -, tocando muita música brasileira que ia de Alcione tirando o chapéu para o seu negão a Los Hermanos perguntando quem se atreve a dizer do que é feito o samba.

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Fotos: Thaís Vieira

Antes de começar o jogo, HT quis saber se a política do pão e circo estava funcionando direitinho e saiu pelo evento perguntando às pessoas o que elas achavam que era “gol contra” no Brasil e o que era “bola dentro”. O resultado geral mostra que tanto os visitantes quanto os nativos não estão cegos quanto aos problemas do Brasil, mas a simpatia e o jeitinho brasileiros acabam prevalecendo.

 

Luiz Guilherme Osório tem 26 anos, mora no Rio e é editor na revista Seleções

Luiz Guilherme Osório tem 26 anos, mora no Rio e é editor na revista Seleções

Para Luiz Guilherme Osório, a volta do conservadorismo, a condenação dos movimentos gays e a opressão das mulheres são grandes gols contra no Brasil. Porém,  inclusão social, a receptividade brasileira e o aumento da participação política da sociedade são ótimas bolas dentro.

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Mirela Rampini é carioca e economista, com 40 anos e uma posição política bem definida

Mirela Rampini já pensa que participação social só adianta se for consciente. Para ela, os gols contra são pessoas que fazem protestos sem refletirem sobre o assunto, gente que só vai à rua para fazer barulho. A bola dentro é exatamente o oposto dessa gente: pessoas que trabalham para mudar o cenário atual, seja dando aula em favelas ou um professor que tem uma dedicação extra com um aluno especial.

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Mariano Gonzalez é um espanhol médico de 34 anos e parte do time de gringos lindos que estavam dando sopa no evento.

O espanhol Mariano Gonzalez está no país há apenas duas semanas e já se sente em casa. Para ele, gol contra é quem fala mal do Brasil e do Rio de Janeiro sem nunca ter visitado a cidade. E, claro, a bola dentro fica por conta das pessoas que, aparentemente, são todas solícitas com ele (por que será?).

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Alice Ikuzwe tem 25 anos, mora em Montreal, é estudante de relações internacionais, formada em engenharia elétrica e cover da Lupita Nyong’O nas horas vagas (brinks, mas bem que poderia)

Alice Ikuzme também acha que a bondade das pessoas é a grande bola dentro do país. Entretanto, prova que é gringa, mas tem visão realista e diz que a saúde e a impunidade são grandes gols contra por aqui.

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Feliciano Teixeira Filho é carioca de 82 anos e passou os últimos 30 vendendo amendoim no Circo.

Seu Feliciano, que já conhece tanto o Brasil quanto o Rio há mais tempo, diz que está tudo errado por aqui, e a corrupção é o grande gol contra do país. Para ele, pelo menos a democracia é uma bola dentro.

Carolina Bastos é carioca com 24anos e uma das muitas professoras que sofrem nesse país.

Carolina Bastos é carioca com 24anos e uma das muitas professoras que sofrem nesse país.

Carolina Bastos, que dá aulas de português, acha que gol contra é o salário dos professores, enquanto a bola dentro é ver crianças carentes com acesso à escola e a felicidade que um adolescente de comunidade carente sente ao passar no vestibular para uma escola pública.

As pessoas abaixo parecem ter entrado em um consenso telepático e, coincidentemente (ou talvez seja apenas desgosto coletivo), acham que a corrupção é, sem dúvida, o gol contra do Brasil, enquanto a simpatia e o jeito dos brasileiros é a grande bola dentro do país.

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Fernanda Botelho é advogada de 24 anos e jura que não estava tentando imitar a J.Lo (ou Jay-L, como diria Galvão Bueno) na abertura da Copa.

 

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Tiago Dantas é carioca, trabalha com administração, tem 31 anos e amor pela simpatia brasileira.

 

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Daniel Barradas tem 30 anos e é um auditor fiscal e carioca da gema que também ama a simpatia do povo brasileiro.

 

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A engenheira Jaqueline Rocha acha que a bola dentro é a energia do brasileiro, a qual ela estava sentindo aos montes no evento: “Você também tá sentindo essa vibração?”

 

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O autônomo Adriano Rios (37) e a assistente administrativa Bruna Souza (32) formam um casal que combina tanto no look verde-e-amarelo quanto na forma de pensar.

Fotos: Thaís Vieira