Gleici Damasceno colhe os louros com estrela de longa premiado que chega à Netflix, sonha com o Oscar e ser mãe


A atriz e campeã do BBB18 é protagonista de ‘Noites Alienígenas’, que entrou para o catálogo da Netflix. Nesta entrevista, ela revela bastidores do teste que fez para novela das 21h, fala da construção da carreira, de preconceitos, racismo e coerência pessoal e artística. “Tem coisa que não topo, como aliar meu nome a marcas que têm história de homofobia, racismo. Isso mata meu povo. Passo. É preciso ter coerência. Sou uma mulher preta, que veio da periferia. É a minha essência”. E mais: “Sou muito ambiciosa, quero crescer e acredito nisso. Já contei que meu sonho é chegar a ganhar um Oscar”

*Por Brunna Condini

Gleici Damasceno celebra estreia na Netflix com filme ‘Noites Alienígenas’, gravado no Acre, que foi o grande vencedor da 76ª edição do Festival de Cinema de Gramado. Estreante na carreira de atriz, a vencedora do BBB18 também esteve em ‘Ninguém é de Ninguém’, de Wagner de Assis, e vem conquistando seu espaço na dramaturgia. Foi atuando em ‘Noites Alienígenas’, que Gleici ganhou visibilidade, rendendo até um teste para a novela das 21h da Globo que está no ar, ‘Terra e Paixão’, para viver a protagonista, Aline. “Mesmo não passando, foi muito enriquecedor. Foram três dias de imersão, que experiência! Testes não são somente sobre passar, mas também sobre essa vivência”, observa. “Hoje, olhando a Bárbara Reis no papel, vejo que ele era dela mesmo. Ela é super a Aline. Acredito muito que os papéis encontram seus atores e atrizes. As minhas personagens também me encontrarão”, diz, em entrevista por vídeo ao site.

Nós, pretos, queremos oportunidades, não precisamos de esmolas – Gleici Damasceno

Para além do Oscar hoje, Gleici também revela sonhos pessoais. “Quero ter uma família minha e ser completamente feliz com ela. Talvez seja meio careta sonhar com isso hoje, mas é parte do que desejo. Quero ter um marido, filhos, uma família descolada, bacana. E levá-los para todo canto. Vai ter Oscar (risos)? Vou com eles. Vai ser uma realização”, conta Gleici, que está solteira. “Estou tranquila com isso, em paz. Não descarto ser mãe solo, se for o caso, mas o desejo mesmo é de uma família”.

Gleici Damasceno celebra chegada do filme que protagoniza na Netflix, e fala da construção da carreira de atriz (Foto: reprodução/ Instagram)

Gleici Damasceno comemora chegada na Netflix de filme que protagoniza e fala da construção da carreira de atriz (Foto: reprodução/ Instagram)

“Ter sido pensada para um papel desses já é uma grande realização. Tenho feito muitos testes, a maior parte deles no streaming e cinema. Isso mostra que as pessoas estão me vendo, me deixa motivada. Sou muito ambiciosa, quero crescer e acredito nisso. Já contei que meu sonho é chegar a ganhar um Oscar. Mas é um caminho até lá, de muita luta, determinação, de encontrar a personagem certa, na hora certa. Prêmios são consequência de um trabalho duro. O desejo maior é que as pessoas se sintam tocadas pelas personagens que eu fizer”, frisa.

Tem coisa que não topo, como aliar meu nome a marcas que têm história de homofobia, racismo. Isso mata meu povo. Passo. É preciso ter coerência – Gleici Damasceno

Gleici Damaceno estrela o filme acreano 'Noites Alienígenas', exaltando o cinema do Norte do país (Divulgação)

Gleici Damaceno estrela o filme acreano ‘Noites Alienígenas’, exaltando o cinema do Norte do país (Divulgação)

Essência

Dirigido por Sérgio de Carvalho, ‘Noites Alienígenas’ tem sido altamente aclamado por onde passa. A produção mostra a realidade de uma Amazônia urbana, onde três personagens sofrem duras consequências por conta do tráfico de drogas na região. “A indústria do cinema precisa dar mais espaço para o Norte do país, para as pessoas dessa região. Esse filme me deu uma envergadura muito forte, fala de coisas que acredito. Preciso trabalhar, claro, mas te digo que como atriz ou influenciando, fazendo publicidade, só estou em projetos que acredito. Já neguei trabalhos porque não dialogavam comigo, acho que desagrega valor. Tomo muito cuidado com isso. Adoro um entretenimento, mas me identifico muito mais com projetos que inspiram as pessoas”, reflete. “Tem coisa que não topo, como aliar meu nome a marcas que têm história de homofobia, racismo. Isso mata meu povo. Passo. É preciso ter coerência. Sou uma mulher preta, que veio da periferia. É a minha essência”.

"Prêmios são consequência de um trabalho duro. O desejo maior é que as pessoas se sintam tocadas pelas personagens que eu fizer" (Foto: Caio Oviedo)

“Prêmios são consequência de um trabalho duro. O desejo maior é que as pessoas se sintam tocadas pelas personagens que eu fizer” (Foto: Caio Oviedo)

Sobre racismo e aliados

Aos 28 anos, Gleici exerce sua voz e ativismo desde a a adolescência, quando vivia na periferia de Rio Branco, no Acre, e realizava ações culturais por lá. Violência e racismo são velhos conhecidos, e ela segue até hoje no seu quinhão de combate a qualquer tipo de preconceito, por uma sociedade melhor, mais igual e justa. “As pessoas precisam ser punidas por esse crime, porque a maioria que o pratica tem certeza da impunidade. Posso dizer, que mesmo hoje, minhas reações diante de um episódio de racismo são muito imprevisíveis. Já fiquei calada, já chorei, com quando fui abordada pela agente da Receita Federal no aeroporto de Guarulhos, em São Paulo, mas ali me impus. Acho que só vão parar com o racismo quando a punição vier de fato, porque na maioria das vezes não dá em nada”, aponta.

Sou muito ambiciosa, quero crescer e acredito nisso. Já contei que meu sonho é chegar a ganhar um Oscar – Gleici Damasceno

"Adoro um entretenimento, mas me identifico muito mais com projetos que inspiram as pessoas" (Foto: Caio Oviedo)

“Adoro um entretenimento, mas me identifico muito mais com projetos que inspiram as pessoas” (Foto: Caio Oviedo)

“Vivemos um racismo institucional, enraizado, que te tira de espaços, e na surdina muitas vezes. Outro dia estava no salão e uma moça perguntou para um amigo meu que é branco, se eu trabalhava lá. E ele respondeu que não, que eu era uma investidora ali. Então, ter amigos brancos, que de fato são aliados, ajuda muito na causa. Precisamos de aliados. O racismo é criminoso, doloroso demais”. E pondera ainda sobre o tema: “É importante que quem é aliado, se letre, estude, e não seja oportunista na causa, porque isso me faz sentir vergonha pela pessoa que se promove com isso. Quem quer ser antirracista precisa se informar. Inclua as pessoas pretas nos espaços de poder e realmente dê esse poder a elas. Essa é uma das formas efetivas de contribuir para acabar com o racismo. Nós, pretos, queremos oportunidades, não precisamos de esmolas”.
"Sou muito ambiciosa, quero crescer e acredito nisso. Já contei que meu sonho é chegar a ganhar um Oscar" (Foto: Caio Oviedo)

“Sou muito ambiciosa, quero crescer e acredito nisso. Já contei que meu sonho é chegar a ganhar um Oscar” (Foto: Caio Oviedo)