“Eu saio pelada quando quiser! Não ligo para os comentários”. Valesca Popozuda rebate críticas e dá beijinho no ombro com Gisele


Depois de hastear a bandeira feminista, funkeira fala com a gente com sua língua afiada sobre a repercussão da sua participação na campanha #EuNãoMereçoSerEstuprada

Não tem para ninguém, Valesca é Valesca! E deu bafão ontem na SPFW. Tivemos a uma semana de mulheres seminuas aderindo ao movimento virtual #EuNãoMereçoSerEstuprada, um festival de honrosas manifestações nas redes sociais, após a tal pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) que revela que 65% dos brasileiros acham que mulheres que usam roupas curtas merecem ser atacadas. Entre tanta gente indignada, jornalista ameaçada, propostas criativas de passar a mensagem, surge a popozuda e toda poderosa Valesca Popozuda nua – ela não é mulher de ficar seminua, meu amor –, mas de salto alto. Além disso, para mostrar que encara qualquer machão, com um bastão na mão e a frase: “De saia longa ou pelada, eu não mereço ser estuprada”. Pronto. Em meio a muitos elogios e reverências de seus súditos postando “isso mesmo, diva!”, a marcha do retrocesso enlouqueceu e destilava seus pré-conceitos e discursos moralistas a todo vapor nas redes sociais. Uma loucura ver a quantas anda a porção sexista nesse país, que de liberal só tem pinta. E Valesca? Beijo no ombro! Que o recalque passa longe!

A funkeira parece ter mesmo o dom de “causar”, mas sua capacidade de chamar atenção vai além disso, além de jogadas de marketing. Valesca é de fato polêmica – e corajosa! Imagina um ambiente da periferia carioca, pautado pelo machismo, onde reinam caras como Mr. Catra (aquele que tem um harém). Num belo dia vem uma frentista gostosona, sobe ao palco de mestre Catra para dançar e faz um baita sucesso com aquele poposão! Então ela vira dançarina, no meio onde apenas homens cantavam pornografias e as mulheres dançavam para agradá-los, depois ela resolve meter a mão no microfone e cantar. Resultado: hoje ela é a rainha do funk absoluta. Sua fama ultrapassou as barreiras da periferia para a Zona Sul e hoje ela é a loura do clipe de R$ 500 mil e 20 milhões de acessos, do hit absoluto do verão e da bolsa Chanel que desfilava ontem na SPFW, dando “beijinho no ombro” junto com a top Gisele Bündchen. E ainda é tema da tese de mestrado “My pussy é poder – A representação feminina através do funk no Rio de Janeiro: Identidade, feminismo e indústria cultural”. E tudo isso sem marqueteiros que moldam celebrities. Sua carreira – solo só recentemente – é feita no peito e na raça, independente. Só contratando, claro, alguns profissionais para ficarem por perto, como a personal stylist Marcela Vinhaes, que teve a difícil tarefa de repaginar ela inteira, colocando roupas estilosas e elegantes naquele corpo bombadão.

Valesca, talvez, não soubesse desde o início o que estava causando no gueto. Esse território onde a mulher mais cobiçada da favela almejava ser uma das namoradinhas do traficante e entrava em uma verdadeira furada já que, segundo os códigos de conduta, deveria ser terrivelmente agredida caso resolvesse fazer a mesma coisa que o namorado. Foi nesse gueto que Valesca se criou como vocalista da “Gaiola das Popozudas” e mostrou uma mulher que não precisava de homens para crescer, e ainda, foi conquistando espaço dentro deste mesmo território cantando as mesmas pornografias que os homens, mas agora na ótica feminina. No melhor estilo “o prazer é todo meu”, cantando as maiores sacanagens, como a maior das devassas. Como ela conseguiu? Peito, amor. E não falo de silicone. A moça, na verdade, é brava.  “Bateu de frente é só tiro, porrada e bomba”, como diz em seu hit “Beijo no Ombro”. “A mensagem, na época, caiu como uma luva e os homens não gostavam, só que eu nunca deixei de cantar nada para agradar homem nenhum. A mulher não precisa ser santa para ser respeitada e também não precisa abaixar a cabeça para ninguém”, diz Popozuda.

Dá uma olhada na letra da fase trash da moça em “California Picas” (part. Ana Carolina)!

“Com marra de pegador, o bombadão da academia / Espalhou lá na favela escuta só que me fazia / Eu fiquei de cara quente boladona eu fui cruel / Eu dei mole pro otario e levei la pro hotel / Eu fiquei assanhadinha na hora bateu neuorose / Além de muito pequeno e ai ele não sobe / Sai sai gato mole, sai sai seu gato mole / Além de muito pequeno e ai ele não sobe”

Podem falar que as músicas são de mau gosto, podem dizer que não é assim que se mostra o valor de uma mulher ou que não precisa dessa devassidão toda como quiserem. Os mais retrógrados vão dizer que ela não se dá o valor, como se o valor feminino estivesse preso ao quanto a mulher consegue atender aos anseios do padrão de comportamento da sociedade. Mas o fato é que o machismo, muitas vezes, é tão enraizado que não conseguem enxergar que nada disso está em questão quando dizemos que Valesca é, sim, o grito feminista da periferia carioca. Nem mesmo o fato de no início da carreira suas letras passarem por terreno arenoso, quando ela incita uma mulher interesseira e leviana que tem o poder (assumido) de sugar o dinheiro dos homens. O fato de, no início, ter sido apenas mais uma gostosa atendendo a uma determinação mercadológica (e machista). Nem mesmo o fato de, talvez, nesse início ela não ter a ideia de nada disso. Nada disso exclui o que ela passou a representar. Talvez a própria tenha entendido que é assim que funciona o poder feminino na medida em que foi se tornando uma power girl. E aí pôde dizer para a mulherada, em várias formas expressas: “façam assim que dá certo, mulheres! Ganhem seu próprio dinheiro e tenham seu próprio prazer. Façam isso que é legal, eu garanto!”. O problema é quando as próprias mulheres não conseguem entender nem desenhando.

Em entrevista exclusiva ao HT, ela resolve falar sobre as críticas à campanha. Como falamos, ela sozinha resolve toda a carreira e faz a sua própria produção. Deleite-se com as frases de Valesca!

HT: Sua foto está causando uma enorme discussão na internet. Tem muita gente apoiando, mas muita gente discordando, dizendo que você quer mesmo é aparecer pelada. O que acha disso?

VP: Eu não ligo para as críticas, eu saio pelada a hora que quiser e não precisaria de um momento pra isso, já fiz Playboy. Portanto, de verdade, não ligo para os comentários negativos, meu objetivo é focar na campanha.

HT: Você se considera feminista?

VP: Sim, me considero. Apenas gostaria de ser mais atuante, de participar mais das coisas relacionadas ao tema, mas na medida do possível, sou sim.

HT: Digo isso, Valesca, porque pensei desde a primeira vez que me deparei com uma letra sua: “Gato Mole”. Tem uma mensagem feminista muito forte, de uma mulher que toma as rédeas e tem um controle muito forte sobre sua vida, seu corpo e seus valores. Tudo isso em um território onde o machismo é muito presente, como nas favelas cariocas. E aí vem você no meio dos machões contando a história do bonitão da academia que não conseguiu lidar com o mulherão entre quatro paredes. Suas letras são autobiográficas? Você é mesmo este mulherão que fala abertamente sobre sexo e faz isso tudo?

VP: Claro. Não são autobiográficas, mas eu me identifico e dou palpites, quando eu acho uma letra bem parecida comigo, eu procuro mudar alguma coisa para por a minha personalidade. Quando li essa letra a primeira vez me identifiquei logo. A mensagem, na época, veio como uma luva e os homens não gostavam. Mas eu nunca deixei de cantar nada para poder agradar homem nenhum. A mulher não precisa ser santa pra ser respeitada e também não precisa abaixar a cabeça para ninguém.

HT: As pessoas mais retrógradas dizem a todo tempo que você não se dá ao respeito, porque é muito imoral e suas letras continham palavrão, quando na verdade esse machismo está tão enraizado que elas não conseguem entender que o valor da mulher não está na submissão, nem na forma como ela responde aos anseios da sociedade, mas sim na sua independência, em depender de si mesma para ser feliz. E é isso que se vê nas suas mensagens mais recentes. Você é uma neofeminista? Uma feminista da periferia? Uma feminista dentro da realidade brasileira?

VP: Pois é, focam muito nas minhas letras e me julgam por isso, isso me incomoda? A resposta é não. Isso me rebaixa? A resposta também é não. Muitos não entendem que o machismo vem de raiz e acham que devemos ser submissas. Eu não penso dessa forma, eu quero ser feliz e estar bem para mim mesma, não para homem nenhum. Eu sou uma feminista da periferia sim,  mas na verdade eu sou a favor da mulher sempre.

HT: Acha que os homens que discordam, na verdade têm medo de um mulherão?

VP: Lógico! O homem não consegue nunca bater de frente com uma mulher, concorda? Eles nunca têm argumento pra nada e usam muitas vezes da força pra calar uma mulher.

HT: Você sempre teve na sua vida particular facilidade em lidar com essas questões? Ou seja, sempre foi independente e resolvida sexualmente? Sem dar a menor bola para o moralismo das pessoas? Ou você já sofreu por assumir isso?

VP: Já sofri por assumir isso, mas eu me assumi como mulher aos 14 anos quando precisei encarar a vida e enfrentar o mundo, mas nunca liguei pro “falso” moralista, de verdade.

HT: Uma mensagem para os moralistas e machistas:

VP: A ignorância de vocês e a forma como nos agridem, verbalmente ou não, só nos deixa a certeza de que a cada dia somos mais evoluídas e capazes de qualquer coisa que queremos fazer.

HT: Uma mensagem para as mulheres que são submissas aos homens ou aos valores moralistas da sociedade:

VP: Amores, caiam fora! Assumam o poder de vocês e vão ser felizes enquanto dá tempo. Tenham orgulho de vocês mesmas, ao se olhar no espelho e ver uma guerreira, e não uma derrotada. Mete o pé e seja feliz!

Este slideshow necessita de JavaScript.

Fotos: reprodução / facebook