Elisa Lucinda bate um papo exclusivo com HT e declara: “A grande mídia está assolada por Anittas e Naldos”


A artista, que se apresentou em Vitória (ES) na sexta-feira, fala sobre sua carreira e sobre o DVD de “Parem de falar mal da rotina”, que será gravado em Niterói e co-produzido por Ana Carolina

*Com Léo Fávaro

Artista é aquele que tem em sua alma a vocação de mexer com outras a partir de simples (e por que não elaboradas?) construções. Essa definição, não baseada no glamour, mas na aptidão de fazer arte é, provavelmente, o conceito que melhor se atribui a Elisa Lucinda. Dentre suas qualificações de jornalista, poetisa, atriz e cantora, a que ela mais gosta é a de capixaba, mesmo morando há 30 anos na Cidade Maravilhosa. E foi a partir do eixo Vitória – Rio de Janeiro que Elisa se estabeleceu como um dos nomes mais relevantes de sua geração.

Figura já conhecida do casting de novelas globais como “Insensato Coração”, “Páginas da Vida” e “Mulheres Apaixonadas”, além de premiada no cinema por sua atuação no longa “A Última Estação”, Elisa está numa das fases de maior plenitude de sua carreira. Ela lançou em Vitória, na noite desta sexta-feira (20), a terceira edição de seu primeiro romance, “Fernando Pessoa – o cavaleiro de nada” (sobre o qual você já havia lido aqui), e se apresentou como atriz profissional pela primeira vez no palco em que começou a atuar. A emoção e a alegria de voltar ao Teatro da UFES tornam ainda mais especial – para Elisa e para o público – as apresentações de “Parem de falar mal da rotina”.

Em 13 anos de existência, mais de dois milhões de pessoas viram o espetáculo que já rodou o Brasil e também chegou a países como Portugal e Espanha. “Parem de Falar Mal da Rotina” não é uma peça convencional onde uma história é contada, mas um modo de vida e uma visão de existência. É a maneira com que Elisa Lucinda, atriz, roteirista e diretora da peça, consegue expressar sua urgência e inquietude na busca interminável da liberdade de se poder viver plenamente, sem os famosos cárceres que nós mesmos nos impomos.

Reforçando esse sucesso, a atriz grava entre os dias 2 e 5 de abril, no Teatro Municipal de Niterói, o DVD do espetáculo, que tem direção de Juliano Gomes (filho de Elisa) e co-produção da cantora Ana Carolina. Nesse afã de alegrias, memórias e arte, Elisa conta mais sobre sua carreira – e também sobre a rotina.

 

Elisa Lucinda em "Parem de falar mal da rotina" (Foto: Guga Melgar | Divulgação)

Elisa Lucinda em “Parem de falar mal da rotina” (Foto: Guga Melgar | Divulgação)

HT: Você volta ao Espírito Santo, mas pela primeira vez se apresenta profissionalmente no palco em que fez as primeiras peças. Como foi o começo de sua carreira?

EL: Vitória é minha história e nesse lugar eu aprendi muitas coisas. O meu teatro começou na universidade. Quando eu tinha desistido de fazer faculdade para ser atriz, aceitei a opinião do meu pai de fazer comunicação. E, no primeiro semestre, no Restaurante Universitário, um cara me chama para fazer a peça “O marinheiro”, de Fernando Pessoa. ‘Menina, você é bonita. Não quer ser atriz, não?’. Era tudo que eu queria!

HT: E como os trabalhos se desenvolveram no ambiente universitário e em Vitória?

EL: O Teatro da UFES foi onde nasceu meu teatro. A universidade é mãe do meu teatro, assim como Maria Firmina, a grande mãe de toda minha arte pelas coisas que me ensinou, e a poesia, que foi o primeiro teatro da minha vida. Mas, considerando teatro mesmo, de ter grupo, cenário e personagem, tudo isso foi feito com meu grupo, Fantasia de Açúcar. É engraçado que foi o pessoal do diretório da área de biomédicas que me chamou para fazer essa peça. Entre tantos alunos de medicina e odontologia, eu era a única da comunicação, encontrada no restaurante universitário.

HT: E seu pai, que falou para você fazer comunicação, o que achou dessas suas incursões nas artes dramáticas?

EL: A gente ensaiava no campus. E depois, meu pai, já desistindo de combater essa minha ideia, me deu o terceiro andar da minha casa, que era um terraço, para ser a sede do teatro do nosso grupo. Então, ali a gente ensaiava e tinha cenário… era muito bonito. Eu adorava! Era tudo muito feliz! Ah, essa é a primeira vez que me apresento no Teatro da UFES depois que me tornei atriz profissional.

HT: Sério?! Vai ser uma realização e tanto…

EL: Vai ser, sim! E vou lançar lá a terceira edição de meu livro, “Fernando Pessoa, o cavaleiro de nada”. É meu primeiro romance, e já vendeu mais de 20 mil exemplares neste ano.

HT: É uma fase de muita plenitude, então?

EL: Com certeza é. Eu vou gravar o DVD do “Parem de falar mal da rotina” nos dias 3, 4 e 5 de abril, no Teatro Municipal de Niterói. O DVD está chiquérrimo! A direção é de meu filho, Juliano Gomes, e a co-produção é de Ana Carolina. Estão rolando até caravanas da Bahia, de Minas Gerais… Quero ver o público capixaba lá!

Elisa Lucinda em "Parem de falar mal da rotina" (Foto: Guga Melgar | Divulgação)

Elisa Lucinda em “Parem de falar mal da rotina” (Foto: Guga Melgar | Divulgação)

HT: Como se manter capixaba, morando há 30 anos na Cidade Maravilhosa?

EL: Eu tenho amor pelo Espírito Santo, eu me sinto uma filha legítima do estado. Adoro o Rio de Janeiro, mas todo o Brasil sabe que eu sou capixaba, nunca deixo de dizer. Então, se vier na minha casa, sirvo moqueca na panela de barro, faço e aconteço (risos). Quando tem reunião na minha casa, sempre preparo moqueca ou torta capixaba, essa culinária maravilhosa! Adoro andar na rua e ser reconhecida como capixaba. O capixaba é chique, mas precisa levantar sua autoestima, ele nem sabe do que é capaz. É um dos povos mais inteligentes do Brasil, na minha opinião.

HT: Sua história se divide mesmo entre o Espírito Santo e o Rio de Janeiro. Você foi para o Rio por que no Espírito Santo é difícil sobreviver de arte?

EL: A gente é conhecido como um povo desarticulado culturalmente, mas o capixaba é muito talentoso, inteligente e criativo. E eu agradeço muito pelas coisas que aprendi aí. Quando cheguei ao Rio, fiquei encantada com tanta coisa que tinha visto em Vitória, que eu podia respeitar como base, e as quais o Rio só acrescentava. Mas eu acho que no Espírito Santo há um problema grave: a formação artística, em escola de arte, principalmente a arte dramática. Além disso, não há mecanismos de identificação de talentos, como festivais. Se a pessoa mora no interior [do ES], dificilmente terá acesso a alguma oficina, e isso é um crime. Pense num mundo sem arte, sem teatro, sem cinema… Então, como o mundo pode não investir nisso? O Espírito Santo deve a si mesmo e ao Brasil, porque temos grandes talentos. E, sabe, vou tentando me unir aos talentos daí, para fortalecer…

HT: E no Brasil, estamos mais pobres de poetas e escritores?

EL: Estamos mais ricos! Estamos com muita informação, todo mundo podendo mostrar seu trabalho. Há uma certa euforia. Eu conheço vários ótimos poetas da nova geração, mas eu queria conhecer mais gente. Estou tentando fazer com que [o site de Elisa] Casa Poema congregue todos esses talentos.

HT: E em relação à música?

EL: Temos bons músicos. Mas acho que a grande mídia está assolada por Anittas e Naldos. Está muito chatinha por causa dessa pouca diversificação. E não falo do gênero, eu gosto de funk, gosto de rap. Ouço Emicida e é fantástico! Na verdade, se mostra muito pouco da diversidade que há por trás do gênero. Ou é isso ou é sertanejo, e acho pobre a limitação a uma parte de um vasto gênero. Há coisas que acho mais interessantes, como o Zeca Baleiro, que regravou o trabalho do Sérgio Sampaio. É um grande músico do Espírito Santo… e o Zeca é um cara do Maranhão. Isso é bacana: estamos atravessando as porteiras com a era digital e com a internet.


Cena de “Parem de falar mal da rotina”

HT: Falando sobre seu trabalho no teatro, como manter o “Parem de falar mal da rotina” por tanto tempo em cartaz?

EL: Tem gente que já foi ver o “Parem” quase 20 vezes e é sempre diferente. O público se renova. Se ele já viu, ele vai ver de novo e leva sempre um amigo, um tio, o namorado… eu sempre mudo, a história nunca é a mesma. O espetáculo ensina que nós somos os dramaturgos da nossa história. Sua mãe ou seu pai podem querer que você faça direito, mas é você quem escreve sua história. Você é o autor da sua história. Mas eu digo isso rindo. É uma comédia de rir e de pensar. Tudo é assunto sério, só que contado de modo engraçado. O público se vê ali e se reconhece como sujeito de sua própria história.

HT: E o que a incomoda em sua rotina?

EL: Me incomoda quando eu não tomo conta dela. Quando tenho uma folga, vou pra Itaúnas, se não é um trabalho emendado no outro – o que é bom, mas cansa. Quando minha rotina começa a me escravizar, eu digo para ela “quem manda sou eu”. E nos dias, nada se repete, nós não somos repetitivos. A plateia não sente o tempo passar, eu também não sinto e é uma onda. A gente gargalha! É uma festa, é um circo!

 

Elisa Lucinda em "Parem de falar mal da rotina" (Foto: Guga Melgar | Divulgação)

Elisa Lucinda em “Parem de falar mal da rotina” (Foto: Guga Melgar | Divulgação)

SERVIÇO

“Parem de falar mal da rotina”

Comédia com Elisa Lucinda

Datas: Sexta-feira, 20, e sábado, 21 de março, às 21 horas.

Domingo, 22 de março, às 19 horas.

Local: Teatro Universitário – Av. Fernando Ferrari, Goiabeiras. Vitória – ES

Ingressos: Térreo – R$60 (inteira) e R$30 (meia). Mezanino – R$50 (inteira) e R$25 (meia). À venda no site www.ingresso.com

Informaçõeswww.wbproducoes.com.br