“Corpo bonito é aquele que tem gente feliz dentro”, diz Aline Zattar à frente do Plus Model Brasil


A modelo e influenciadora digital é a nossa convidada de hoje da série ‘Gordofobia, até quando?’. Aline fala da sua experiência com o preconceito em relação ao corpo gordo, do processo de aceitação, e das loucuras que já fez quando não curtia o corpo que habitava. Ela está trabalhando para a realização do concurso Plus Size em formato 100% digital. “Gosto que as pessoas se sintam seguras e que tenham clareza do que esperar”, afirma

*Por Brunna Condini

Dando prosseguimento à série ‘Gordofobia, até quando?’, com o objetivo de esclarecer, visando o combate ao preconceito gordofóbico tão enraizado em nossa sociedade, convidamos esta semana a modelo Aline Zattar para contar de sua experiência com o tema. E ela já começa nosso papo falando da importância do trabalho de autoaceitação diante de uma pressão estética social. “A minha jornada não foi fácil, mas super recompensadora à medida em que fui aprendendo a me desconstruir e consegui construir uma imagem positiva. Todos os dias precisamos mudar o nosso olhar, deixando de lado as expectativas das outras pessoas sobre nós, começando a enxergar quem somos e quem queremos ser. O caminho fica muito mais leve quando aprendemos que a única pessoa que precisamos agradar somos nós mesmas”.

“A minha jornada não foi fácil, mas foi super recompensadora à medida em que fui aprendendo a me desconstruir e construir uma imagem positiva” (Reprodução Instagram)

Aos 35 anos, mãe de Maria Eduarda, 13 anos, e de Bruno Jacob, de 10, a modelo ama o próprio corpo e busca inspirar suas seguidoras e seguidores. Mas nem sempre a relação com sua imagem foi pacífica. Durante muitos anos Aline tomou remédios para emagrecer e chegou a ter depressão por não conseguir se enquadrar “Eu sempre fui basicamente como sou hoje em dia, falando de estrutura corporal, às vezes um pouco mais magra quando fazia dietas loucas e tomava remédios fortes para tentar atingir um padrão que era muito longe da minha realidade. Sempre vivi em função de emagrecer, acordava pensando: o que eu vou fazer para conseguir emagrecer de uma vez? A pior decisão foi uma cirurgia no intestino, chamada by-pass intestinal, que fazia um desvio que prometia um emagrecimento certeiro, que, como podemos ver, não aconteceu (risos). Até hoje acabo pagando o preço desta cirurgia, porque depois disso vieram as intolerâncias alimentares e algumas faltas de vitaminas. Vale ressaltar que essa não é a cirurgia bariátrica. Essa nunca tive coragem de fazer”, desabafa.

A modelo e influenciadora Aline Zattar e os filhos Maria Eduarda e Bruno Jacob (Reprodução Instagram)

Somente depois da segunda gravidez, em que engordou 30 kg, mas não conseguiu emagrecer tudo, é que Aline começou a mudar a visão que tinha do próprio corpo. No meio deste percurso de aceitação encontrou no trabalho como modelo uma espécie de redenção. Ela foi eleita Miss Brasil Plus Size em 2013 e, desde então, tem trabalhado sem parar, deixando para trás o Direito e a atividade como vendedora de semijoias.  “Também idealizei o evento Plus Model Brasil, que está na terceira edição. O concurso elege modelos plus size em três categorias: masculino e feminino tradicional (de 18 a 37 anos) e feminino master (a partir de 38 anos). A ideia é reunir homens e mulheres em um grande casting, além de eleger os supermodelos plus size do Brasil, e trabalhar a autoestima”.

“A luta pela liberdade de ser quem somos, com diversidade, ainda persiste” (Reprodução Instagram)

É recorrente acharem que um corpo gordo é sinônimo de doença. O que tem vontade de falar para as pessoas sobre isso? “Que precisam tratar seus preconceitos, pois sempre há uma pauta sobre saúde quando falamos de pessoas que não são o padrão pretendido pela sociedade. Parece que temos que provar a todo momento se estamos saudáveis ou não. Conheço pessoas super magras e com níveis altíssimos de colesterol e triglicerídeos, mas ninguém questiona, pois são magras”, diz. “A luta pela liberdade de ser quem somos ainda persiste. Mas sempre que uma mulher se sente empoderada, se aceita e se ama, é a certeza de que estamos no caminho certo. O tema está presente nas minhas redes sociais e é muito importante essa representatividade para falar com outras mulheres e amplificar suas vozes”.

“Corpo bonito é aquele que tem gente feliz dentro”

Correndo por fora do padrão imposto como “bonito”, existe toda uma diversidade de pessoas que não se encaixam nem no ‘ideal” e nem no “perfeito”. A insatisfação com o corpo que habitamos é um problema sistêmico e que atinge muitas pessoas. Aline afirma que há alguns anos mantém uma relação mais amorosa com o próprio corpo, e também uma relação positiva com a comida, no exercício de não enxergá-la como inimiga. “Tem pessoas que começam a ter medo de comer tudo, até frutas, pois dizem que algumas podem engordar. Acredito que o exagero não é saudável para ninguém. A partir do momento que essa relação é mais amistosa facilita inclusive o tratamento da compulsão alimentar. Para quem não tem uma relação positiva com a comida, a restrição gera maior compulsão. Você faz por um tempo uma dieta restritiva e depois começa a exagerar quando a finaliza, e vira um ciclo sem fim do efeito sanfona, o que com certeza não é saudável”. E acrescenta, sobre seu olhar para o autocuidado: “Preciso voltar a fazer exercícios físicos com frequência novamente, sempre me exercitei muito e gosto, mas com a minha rotina intensa e essa loucura de cotidiano que tivemos que nos adaptar no momento, não consegui ainda voltar. Mas preciso colocar isso como prioridade. Até mesmo porque devemos nos exercitar por amor ao nosso corpo e não por odiá-lo”.

“Sempre me exercitei muito e gosto. Até mesmo porque devemos nos exercitar por amor ao nosso corpo e não por odiá-lo” (Reprodução Instagram)

Desde que a pandemia do novo coronavírus começou, e com ela a necessidade de isolamento social, Aline conta que tem encontrado alternativas para continuar realizando seu trabalho:  “Enquanto não temos como promover eventos, procuro incluir conteúdo nas minhas redes sociais, em lives e IGTV. Minhas palestras abordam os temas da minha vida: gordofobia, superação, aceitação e amor próprio. Nesse momento tenho feito basicamente 90% do trabalho online, mudamos algumas estruturas e estou conseguindo atender a demanda com uma versão mais intimista, mostrando a moda de dentro da minha casa”.

 Você também é idealizadora do evento Plus Model Brasil, que já está na terceira edição. O deste ano foi cancelado ou será adiado até terem um controle maior do vírus? “Esse ano vamos fazer o evento 100% online, não gosto de produzir algo que não sei quando irá acontecer. Então, para dar segurança às pessoas que buscam pelo concurso mudamos o formato. Gosto que as pessoas se sintam seguras e que tenham clareza do que esperar”, afirma. E esclarece: “Durante o concurso também procuramos dar cursos e palestras para profissionalizar quem busca esse caminho como profissão. Mas temos também algumas pessoas que participam pelo resgate da autoestima, por verem que são capazes de estar em um evento de moda em que elas se encaixam. São lindos os depoimentos que colhemos ao longo desses anos, falando de estímulo, crescimento e superação. A força que elas conquistam para acreditar em si mesmas é incrível de presenciar”.

Ela acredita que o autoconhecimento é uma via com muitas camadas rumo à uma vida com mais interiorização. Mas lembra as dores do caminho nos episódios de preconceito gordofóbico que já vivenciou. “Foram muitos. Principalmente na infância e adolescência. Sempre lidei da pior maneira possível, chorando, me maltratando, desacreditando no meu potencial como pessoa. Acreditando naquilo que me falavam: que eu só seria feliz e conquistaria as coisas se fosse magra. Seria tudo tão diferente hoje. Mas a maturidade me trouxe essa nova perspectiva e só a conquistei com experiências assim na minha vida. Na maioria das vezes, experiências péssimas. Importante é ressignifica-las e trazê-las para nossa realidade como forma de consciência. Não foi fácil, às vezes ainda não é, mas o mais importante é jamais desistirmos de nós mesmos”.

Aline diz que fala livremente com os filhos sobre o tema: “Eles vivenciam a minha luta e estão no dia a dia já inseridos em uma realidade diferente da qual a sociedade insiste em impor. Mostro na prática que podemos conquistar nossos sonhos e lutas sendo quem somos. E que é importante sempre buscarmos a melhor versão de nós mesmos, por nós. Evoluindo como pessoas principalmente”.

Um corpo bonito, é um corpo… “Com alguém feliz dentro dele, parece clichê, mas é isso mesmo. Um corpo com o qual podemos realizar nossos sonhos, que podemos ir em busca do que acreditamos e do nosso crescimento. Esse corpo, seja ele de qual biotipo for, é um corpo extremamente bonito”. ​E manda seu recado na foto abaixo:

(Reprodução Instagram)