Coronavírus: artistas ensinam como aprender com o exercício da fé e da esperança a enfrentar um momento angustiante


Em meio a medo, incertezas e isolamento, por conta da pandemia do novo coronavírus, artistas se fortalecem na fé e dividem suas experiências. Vem conferir o que Elza Soares, Ítala Nandi, Erika Januza, Talita Younan, Luana Xavier, Klara Castanho, Maria Gal, Carol Futuro, Livia Inhudes e Ju Colombo falaram sobre o poder da prática das suas crenças

*Por Brunna Condini

Sentir a energia boa da fé é bom e todo mundo (ou quase todo mundo) costuma gostar, para além de crenças. Convidamos artistas para celebrarem as suas. E também, para compartilhar os desafios de seguir com esperança e uma atitude mais positiva, em plena pandemia mundial. Com exclusividade ao site Heloisa Tolipan, mulheres empoderadas levantam “a moral”, e inspiram diante das incertezas do cenário da pandemia do Covid-19.

A espiritualidade, a intenção no que não se vê, e traz alguma esperança, não precisa necessariamente estar ligada à religiões ou doutrinas. Comprovadamente, a prática positiva da fé traz fortalecimento emocional. A psicóloga Luiza Martins esclarece que o exercício das crenças pode trabalhar aliado a outros fatores, para a manutenção do bem-estar do indivíduo. “Conectar-se com a fé neste momento, que favorece a angústia e a ansiedade, é uma maneira de trazer conforto emocional. Em um cenário com tantos aspectos pessimistas, é uma forma também de cuidar da saúde mental”, diz. “Seja a fé qual for, acompanhada ou não de doutrinas, religiões, pode ser uma das formas de acolhimento emocional para as dificuldades que se apresentam neste momento, uma forma de alimentar a esperança”.

Esperança. Algo na alma que Elza Soares mais exercita em seu recolhimento. Há semanas em sua casa, a cantora, de 89 anos, revela que suas crenças sempre a fortaleceram, em todos os momentos da vida. “Tenho muita fé em Deus e sou devota de São Jorge. Aliás, não desgrudo dele. Acredito mesmo que isso passará”, intui. “Também tenho fé em quem está lá em cima, meu pai (Avelino Soares da Conceição). Tenho uma fotografia que estou nas pernas dele, ainda criança, ele me amparando, e é como me sinto hoje, aquela menina amparada por ele, que olha por mim. Se não tivermos fé, o que vai ser de nós? Mas tenho fé de verdade, muita fé, aquela que vem do coração”.

“Se não tivermos fé, o que vai ser de nós? Mas tenho fé de verdade, muita fé, aquela que vem do coração” (Foto: Pedro Loureiro)

Aos 77 anos, Ítala Nandi, que está em quarentena ao lado do filho Giuliano, da nora Ellen, da neta Sofia e da gatinha Mila, diz que sente falta do trabalho, e que sonha com a vida pós pandemia. “Quero voltar a produzir, atuar, continuar a escrever, dar aulas e amar”, diz a atriz que voltou às telonas no fim do ano passado no filme “Domingo”, de Fellipe Barbosa e Clara Linhart.

Embora não tenha nenhuma religião , “Não sou templista”,  Ítala conta que se comunica diretamente com Deus. “Acredito que ele está dentro de mim. Faço meditações diversas, e sempre antes de dormir me visualizo na chama violeta de Saint Germain. Esse é um momento de muitas incertezas, mas tenho fé que depois desse tempo de ferro, mesmo que eu não sobreviva, virá uma nova era humanizada”.

“Esse é um momento de muitas incertezas, mas tenho fé que depois desse tempo de ferro, mesmo que eu não sobreviva, virá uma nova era humanizada” (foto: roberto Cardoso Jr)

A fé. Aquela que cantada por Gilberto Gil, “não costuma faiá”. E na visão de Erika Januza não falha mesmo. A atriz estava no ar em “Amor de Mãe”, que teve as gravações interrompidas por conta do coronavírus, faz questão de compartilhar ensinamentos da sua mãe, Ernestina, que leva para todas as situações na vida. “Ela ensinou a termos fé, entregarmos para Deus, sempre disse: “Deixa de ser boba, menina. Põe nas mãos de Deus, que já deu tudo certo”. E eu sempre acreditei nisso. A minha fé traz essa crença de que tudo passa e que isso que vivemos, por mais difícil que seja, também vai passar”, afirma. “ Durante esse isolamento tenho sentido mais medo em alguns momentos. O que, às vezes, me parece uma falta de confiar mais. Daí respiro fundo, paro de pensar bobagens e tento manter o pensamento positivo”, divide a atriz, que está em reclusão na companhia dos seus cachorros.

Católica, Erika compartilha suas práticas. “Tenho o hábito de fazer orações diariamente. Agradecer também faz parte da minha rotina, sempre antes de pedir, algo que já aprendi com a minha família que é bem religiosa e praticante. Da infância até a adolescência, eu lia a Bíblia para a minha avó, que não sabia ler, e a acompanhava a encontros de orações na casa dos vizinhos, missas. Os hábitos mudam, mas ainda sigo praticando minha fé”, recorda, com carinho. E com uma fé, que se fez inabalável ao longo da vida, ela divide seus sonhos pós quarentena: “Quero ir para a minha casa em Minas Gerais, e viajar mais por lá. Também espero trabalhar bastante. Meu pensamento sempre está em torno do meu trabalho e quando não o estou fazendo, fico bem mexida”.

“A minha fé traz essa crença de que tudo passa e que isso que vivemos, por mais difícil que seja, também vai passar” (Foto: Vinicius Mochizuki)

Dias melhores virão

Estudos na área da psicologia positiva apontam que pessoas que cultivam a esperança, tem índices mais altos de resiliência frente às adversidades, e também, buscam caminhos, através da ação, para que coisas boas aconteçam. O exercício da fé pode trazer uma atitude mental positiva para tempos como os atuais. E isso é uma busca antiga da atriz Talita Younan. “Cresci dentro da igreja católica, fazia acampamentos, amava. Mas sempre tive uma relação muito especial, direta com Deus, independente de qualquer coisa, falo com ele em qualquer momento, é minha fé. Quando vim para o Rio (ela é de Presidente Prudente, São Paulo), passei a frequentar uma igreja que era próxima de casa, a Lagoinha Barra, porque me sentia bem. É esse o segredo: encontrar um lugar que você se sinta acolhida. Frequento até hoje, mas a minha religião é Deus, que é amor. Converso mesmo com Deus, como um pai, um brother, sem intermediários. E não me conecto só em momentos difíceis, lembro de agradecer”, revela Talita, que está no ar como a polêmica K1, em “Malhação – Viva a Diferença“.

Em isolamento com o namorado, o diretor João Gomez, filho caçula de Regina Duarte, ela afirma que a sua fé pode até ser testada no período, mas segue firme. “Estou há quase sete semanas em quarentena. Então, em vários momentos bateu a ansiedade, e tristeza por não sabermos o que vai acontecer. É dia após dia. Sinto saudade da minha família que mora longe, de abraçar, beijar os amigos. Mas em nenhum momento senti minha fé abalada, porque quando estou para baixo, eu oro e me sinto mais forte. Também acho que temos que fazer nossa parte, eu respeito as recomendações do Ministério da Saúde, mas a fé dá muita esperança no fim do túnel, fortalece, seja ela qual for”.

“Em nenhum momento senti minha fé abalada, porque quando estou para baixo, eu oro e me sinto mais forte” (Divulgação Globo)

Com apenas 19 anos, Klara Castanho, rosto conhecido da TV desde a infância, diz que apesar da crença de que tudo vai passar, confessa que a pandemia de coronavírus tem assustado pelo desconhecimento do porvir, e também, pelos números alarmantes de vítimas ao redor do mundo. “Nós não enxergamos o “inimigo”, então temos que crer que algo acima de nós olha para tudo isso que está acontecendo. Além, é óbvio, de tomar os cuidados que são palpáveis e estão ao nosso alcance. Eu me fortaleço conversando com Deus, independente do momento, então eu sento e converso com ele, e procuro encontrar paz”, desabafa. “A fé me dá uma certeza de que dias melhores vão vir. Talvez não da forma que nós queremos, mas da forma que tem que ser. Eu cresci na crença de que Deus tudo sabe e tudo faz, então sempre busco crer e pedir por isso”.

“A fé me dá uma certeza de que dias melhores vão vir. Talvez não da forma que nós queremos, mas da forma que tem que ser” (Divulgação)

A atriz e produtora Maria Gal é budista e prefere olhar para a pandemia pelo prisma do aprendizado. “O que minha fé me traz e que nada pode tirar é a convicção de que tudo que acontece tem um propósito, e que a gente tem que aprender a tirar as lições positivas até no meio do caos. Acredito que a gente vai superar esse enorme desafio da melhor forma possível”, deseja. “Fé para mim significa crer para ver. É a ligação com algo divino, interno. E neste momento de enorme desafio para a humanidade, estou exercendo minha fé através de meditações, afirmações positivas e do budismo. É difícil entendermos o porquê de estamos passando por esse momento tão delicado. Certamente um dos motivos é para amadurecermos enquanto cidadãos, fortalecer a nossa empatia e generosidade para com o próximo. Eu acredito nisso. Tenho certeza de que vamos sair dessa mais fortalecidos enquanto seres humanos”, completa a atriz, que estava a gravando a segunda fase de “As aventuras de Poliana”, do SBT, quando a quarentena foi recomendada.

Maria Gal: “O que minha fé me traz e que nada pode tirar é a convicção de que tudo que acontece tem um propósito, e que a gente tem que aprender a tirar as lições positivas até no meio do caos” (Divulgação)

A fé também se alimenta de leveza. E afeto. Que o diga a atriz Carol Futuro, a personal stylist Sissineide Madeira (ou só Sissi) de “Detetives do Prédio Azul”, do canal Gloob, que tem passado a quarentena, “em comunidade”, como ela mesma define, mas com toda a segurança recomendada, desde o início. “Estou em casa com meus pais, meu marido e meu filho. Minha irmã com o marido e os dois filhos. Ou seja, uma comunidade de nove pessoas. Isso, em si, já tem sido um exercício de empatia, resiliência, cooperação e serenidade, mas foi a melhor coisa que fizemos por conta dos meus pais e das crianças”, avalia. “Meu exercício de fé, é agradecendo e buscando amar. Fazendo as coisas com amor. Se estamos sintonizados com o amor, com o cuidado e o respeito, o dia a dia é construído com esses pilares. Sinto que o que estamos vivendo é uma ausência de amor. Mas isso me fez pensar que é a nossa chance, como comunidade, de sermos mais unidos, mais empáticos, muito mais solidários. O que me fortaleceu, e me fortalece sempre que tenho uma baixa de energia, é pensar que o universo vai nos devolver o que lançarmos para ele. Que tal lançarmos amor?”, propõe.

‘O que me fortaleceu, e me fortalece sempre que tenho uma baixa de energia, é pensar que o universo vai nos devolver o que lançarmos para ele. Que tal lançarmos amor?”, propõe Carol Futuro (Divulgação)

Livia Inhudes, a ginasta Tammy de “Salve-se quem Puder“, mudou-se para o Rio de Janeiro para integrar o elenco da novela, que foi interrompida. Mas ela não se queixa, e acredita no poder do isolamento para ajudar a barrar a curva de contágio do covid-19, isso acompanhado da prática da fé, que a alimenta diariamente. “Acredito que a pandemia veio para nos ensinar mais sobre empatia e superações! A fé é a única coisa que me faz acreditar que vai passar”, diz a atriz, que é católica. “Voltei para São Paulo, e estou na minha casa em Guarulhos, passando a quarentena com meus pais e meu irmão.​ Acho mesmo muito importante acreditar e ter esperança, porque daí vem minha força na rotina”

“Acredito que a pandemia veio para nos ensinar mais sobre empatia e superações! A fé é a única coisa que me faz acreditar que vai passar” (Divulgação)

Elas se fortalecem para fortalecer

A fé também pode construir pontes. Aproximando quem transforma crenças em potência, para levar esperança, acolher e unir. Neste caso, a empatia prevalece como principal aliada. Se pensarmos que estamos isolados, mas que “nenhum homem é uma ilha”, como concluiu o poeta inglês John Donne, falarmos da fé como instrumento de restauração, faz todo sentido. Afinal, ainda não há cura para o covid-19, mas solidariedade e amor podem ser instrumentos emocionais curativos, e ainda mais bem-vindos agora. Além, é claro, de lavar bem as mãos, usar máscaras e álcool em gel.

Sacerdotisa do budismo, a atriz Ju Colombo, que está escalada para a próxima novela das 21h, “Um lugar ao sol”, na TV Globo, é adepta da prática há 25 anos, e coordena uma equipe de arte-educadores, ministrando oficinas para a capacitação na rede pública. Além disso, duas vezes por semana a atriz recebia em sua casa, na Ilha da Gigóia, na Barra da Tijuca, pessoas para reuniões e palestras budistas, mas com a pandemia do novo coronavírus, ela diz que a rotina mudou, e conta como a prática tem auxiliado também para que ela oriente outras pessoas durante o recolhimento. “O budismo parte do princípio de que somente um ser humano é capaz de tocar a vida de outro ser humano. Sendo assim, a melhor forma de inspirar outras pessoas a ter esperança é comprovando na prática a conquista dos meus objetivos. É vencendo e me tornando um ser humano feliz. Se habituar com uma “cultura de vitórias”. Pelo princípio de unicidade entre pessoas que compartilham o mesmo ambiente, as pessoas do meu convívio não só têm as mesmas circunstâncias de vida que eu, como são influenciadas pelos resultados construídos na minha vida”, detalha. “O estudo deste budismo me ensina que a minha transformação não depende de ter as circunstâncias ideais, e sim da força da minha fé. Também aprendi que as adversidades são importantes para o fortalecimento da minha vida. É como um avião, que usa a resistência do vento para alçar voo”.

“Aprendi com o budismo, que as adversidades são importantes para o fortalecimento da minha vida. É como um avião, que usa a resistência do vento para alçar voo” (Divulgação)

A atriz Luana Xavier, umbandista desde sempre –Aprendi a andar no chão do terreiro”, divide conosco o exercício da sua fé. Minha religião exalta as forças da natureza. Por isso, minha fé não está só nas atividades exercidas dentro do terreiro, que acontecem pelo menos uma vez por mês, a exerço cantando para Iemanjá quando tomo um banho de mar, saudando Oxum quando estou em uma cachoeira, fazendo oferenda a Iansã, que é o orixá que me rege, em um Bambuzal. Minha fé é parte de quem eu sou”, compartilha a atriz, que também é Ialorixá, com a avó, a atriz Chica Xavier.

O que mais te abalou até agora e como a fé te ajudou? “Fiquei tão abalada emocionalmente no início disso tudo, que achei que não conseguiria nem acender uma vela com um copo d’água para pedir que meus guias espirituais acalmassem meu coração. Sempre antes de dormir eu elevo meus pensamentos a Oxalá, que é uma grande divindade nas religiões de matriz africana. E nem isso eu estava conseguindo fazer”, lembra. “Daí comecei a receber muitas mensagens de amigos e familiares me pedindo conselhos espirituais. E foi aí que me lembrei que para fortalecer outras pessoas, preciso estar fortalecida antes de tudo. Fiz um banho de ervas, acendi uma vela e pedi incessantemente por tranquilidade. E mais uma vez Orixá me mostrou que nunca me deixará em desamparo”.

O que esse momento não consegue te tirar? “Minha alegria de viver. E juro que essa não é uma resposta clichê. Nessa quarentena eu pude ter a certeza disso. Porque está sendo especial demais estar 24 horas por dia ao lado do meu avô de 92 anos (o ator Clementino Kelé), minha avó de 88  (Chica Xavier), e minha tia de 79. A gente aqui comemora cada dia de vida. Fazemos festa entre nós sem motivo especial. O grande motivo é sempre o fato de estarmos vivos”.

Tem ajudado as pessoas através da sua fé? “Até live falando sobre isso já fiz (risos). E como eu costumo dizer: não existe fé certa ou errada. Existe aquela que te toca, que te traz paz. Então a minha dica para qualquer pessoa é: se você tem alguma fé, se agarre nela. Porque em tempos tão difíceis é isso que nos resta. E para quem não tem religião, sugiro que se agarre no amor. Porque amor também é uma espécie de religião e provavelmente a mais genuína de todas”

Luana e a avó Chica: “Fazemos festa entre nós sem motivo especial. O grande motivo é sempre o fato de estarmos vivos” (Reprodução Instagram)