Aos 50 anos de carreira, Jards Macalé grava primeiro DVD ao vivo, fala de corrupção, Dilma e afirma que a política é uma “esculhambação”


Com direção da cineasta gaúcha Rejane Zilles, Macalé gravou em abril do ano passado o “Jards Macalé ao Vivo”, no Theatro São Pedro, em Porto Alegre (RS). Com parcerias de Zeca Baleiro e Luiz Melodia, o trabalho chega às lojas pela Som Livre ainda este mês

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(Foto: Dulce Helfer)

Jards Adnet da Silva virou Jard Macalé ainda na infância em Ipanema, na Zona Sul carioca. Ruim de bola, raramente saía do banco de reservas e, quando tinha a oportunidade, a perdia. Não demorou muito para ganhar o mesmo sobrenome do considerado o pior jogador do Botafogo à época. Felizmente, tinha talento infinitamente superior para a música. Lançou 16 discos no mercado e foi parceiro, seja como produtor, cantor ou compositor, de gente como Gal Costa, Maria Bethânia e Caetano Veloso. Já se passaram 50 anos de carreira e só agora ele entrega nas gôndolas seu primeiro CD e DVD gravados ao vivo. O motivo da demora? “Nunca gostei de fazer coisas ao vivo porque sempre fui preocupado com a perfeição. E ao vivo tem muitas defeitos, podem ter falhas, e aí tem que gravar novamente”. Nada que a cineasta gaúcha Rejane Zilles não pudesse contornar. “Ela conseguiu me convencer que poderíamos fazer já que a banda estava superafinada”. Foi então que em abril do ano passado foi gravado o “Jards Macalé ao Vivo”, no Theatro São Pedro, em Porto Alegre (RS), que chega às lojas pela Som Livre ainda este mês.

Finalizados mais de um ano depois da gravação por motivos de perfeição, já que Zilles “quis fazer tudo direito”,  o CD veio como, digamos, acidente de percurso já que a priori, apenas o DVD nasceria. Avaliando o trabalho como “ótimo”, Macalé cantou 18 faixas para o vídeo e selecionou três a menos para a versão em disco. Todas acompanhadas da “Let´s Play That” (que vem a ser o nome da música em parceria com Torquato Neto), banda formada por Leandro Joaquim (trompete), Thiago Queiroz (sax e flautas), Victor Gottardi (guitarra), Ricardo Rito (teclados), Thomas Harres (bateria e percussão) e Pedro Dantas (contrabaixo). Todos sangues novos, diga-se de passagem. “Eu sempre escolhi músicos mais novos porque preciso aprender com eles. É assim que a gente faz uma troca de informações, de vivências”, explicou lembrando que a prática é antiga. “Quando eu montava banda para Gal e Bethânia, sempre escolhi bons jovens músicos. E a turma da Bahia [Gil e Caetano, por exemplo] sempre acabava por pegar alguns músicos meus e no outro final de semana eu já montava uma banda nova”.

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(Foto: Dulce Helfer)

Para o pontapé no mundo do ao vivo, Jards chamou uma trinca das boas, começando por Luiz Melodia, amigo de longa data para quem ele compôs “Negra Melodia” em parceria com Waly SalomãoThaís Gulin, que gravou “Hotel das Estrelas” no mais recente álbum “JARDS”; e ainda Zeca Baleiro, que se junta a Macalé na música “Flor da Pele/ Vapor Barato”. “Escolhi a Thaís porque quando ela chegou no Rio de Janeiro me procurou para conhecer meu trabalho e gosto muito do que ela faz. O Zeca é meu amigo e ele já havia gravado ‘Flor’ comigo. E o Melodia é um grande companheiro e uma figura humana incrível”, justificou – não que precisasse – as escolhas.

O repertório, que chega a reviver sucessos de 1972 como “Farinha do Desprezo”, foi uma compilação bem pensada e proposital. “A nova geração não conhece meu trabalho. Essas músicas não me interessam se são posteriores ou antecessores a alguma coisa. Eu quero é mostrar a minha realidade para um público novo. Até porque essas músicas são atemporais, elas sobrevivem ao tempo”, explicou em entrevista ao HT. E qual seria a tal realidade de Jards Macalé? “A de todo brasileiro. Esse caos”.

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Macalé e Melodia (Foto: Dulce Helfer)

Alegando não ter votado no último pleito presidencial por já ter alcançado a idade que desobriga a ida às urnas, e por não querer participar “dessa esculhambação”, Macalé recorre aos idos do Brasil como colônia lusitana para explicar o momento de crise por qual passa o Congresso Nacional.  “Quando descobriram o Brasil, na época dos índios, os portugueses foram embora e só deixaram aqui quem eles não queriam em Portugal, como os bandidos. Isso tudo é resultado da formação brasileiro que se evidencia por um mal costume de roubar. É brasileiro roubando brasileiro”, opinou ele, que também vai contra ao pedido de impeachment da presidenta Dilma Rousseff (PT). “O que tem que ter são eleições livres, como está previsto na Constituição. Tem que segui-lá”.

Com 72 anos, Jards mantém opinião igualmente ríspida para a atual qualidade da música brasileira. “O que está na mídia, com raríssimas exceções, não é bom. Agora, com o advento da internet, o que é ruim está por cima, e o que é audível com experimentações maravilhosas, está por baixo”. Polêmicas à parte, e feliz da vida com sua investida no ao vivo depois de cinco décadas de mercado, Jards Macalé não é nem um pouco modesto ao dar um motivo para que as pessoas comprem seu DVD:  “é o Jards. Isso já é uma grande diferença”.

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(Foto: Dulce Helfer)