“Bruxaria hoje é trend, gera engajamento em mundo que implora por aprovação de chuva de likes”, diz Renata Vázquez


A autora lança livro sobre saga de feiticeira no século XV. Em “A Bruxa de Alhambra” Renata trata de temas como magia, esoterismo e sexo. Em entrevista, ela fala do lançamento que tem como gancho o Dia das Bruxas, celebrado mundialmente neste sábado (31), e desmistifica: “Usar a magia para se fazer passar por algo que não se é se tornou corriqueiro e isso independe de gênero. No entanto, quando você precocemente carrega isso desde que entendeu que é um ser espiritual tendo uma vivência humana, você ainda é visto como um tanto excêntrico, como um mínimo eufemismo, porque a maioria ainda irá julgar ao mesmo como uma pessoa esquisita. E afortunadamente você somente irá ressoar com aqueles que estão abertos a essa forma de vida”

*Por Brunna Condini

“yo no creo em brujas, pero que las hay, las hay” (“Eu não acredito em bruxas, mas que elas existem, existem”) é um dito popular espanhol, que ronda o tema misticismo mundo afora. Mas há quem acredite e conheça o assunto com propriedade e proximidade. É o caso da escritora Renata Vázquez, que tendo como gancho o período de celebração do Dia das Bruxas em vários países acaba de colocar disponível para pré-venda seu mais novo livro, “A Bruxa de Alhambra”, pela Amazon.

Renata Vázquez sobre o livro novo: “Demorei um ano para escrever e atravessei a pandemia neste processo” (Foto: Carol Beiriz )

Renata que também é autora de “A Dama Escura”, “O Teatro Cósmico”, “Saara – A Filha do Deserto” e o recente “Miranda Metratone”, volta a dialogar com sua ancestralidade através da escrita, revisitando temas como magia, sexo e vidas passadas. “Demorei um ano para escrever e atravessei a pandemia neste processo”, diz a autora, que na história mergulha na cidade de Granada, na Espanha, no ano de 1491, e fala de uma feiticeira perseguida pela inquisição e que vive um amor proibido. “É um romance histórico baseado nas minhas memórias de vidas passadas. É, sem dúvida, meu trabalho mais maduro. Abordo a questão do paganismo e a comunhão do sexo, temas ainda tabus hoje, cinco séculos depois”.

A escritora – que nasceu no Rio de Janeiro e tem mestrado em Jornalismo pela Universidade de Barcelona e Columbia University – fala da intimidade que tem com a espiritualidade e a investigação do tema ‘vidas passadas’. Como foi esse contato com essa vida passada que a inspirou a escrever o livro? “Na primeira visão, eu ainda morava na Espanha, estava entoando um mantra deitada em um estado entre vigília e sono, e veio uma visão, onde era levada por um homem que me agarrava pelo pescoço. Eram vários homens montando cavalos e vinham como que tomando uma cidade. Na época, somente identifiquei a arquitetura um tanto árabe e pensei que pudesse ser Turquia ou algum lugar assim. Cinco anos depois, conversando com um espanhol, entendi que era o sul da Espanha, Andaluzia, que no período era maciçamente de domínio mouro, onde havia guerra de clãs e a arquitetura era toda arabesca, mas os reis católicos tentavam tomar o poder, era a Guerra de Granada, período do livro. Anos depois, em um momento íntimo com um parceiro tive novos vislumbres daquele tempo e o mosaico foi se formando”, revela.

“É um romance histórico baseado nas minhas memórias de vidas passadas. É, sem dúvida, meu trabalho mais maduro. Abordo a questão do paganismo e a comunhão do sexo, temas ainda tabus hoje, cinco séculos depois” (Foto: Carol Beiriz)

Sempre teve o hábito de investigar esses temas? Não teve medo? “Talvez na adolescência tenha sentido um medinho (risos). Como certa vez em que escrevi, em forma de invocação, para a entidade feminina que me guardava e pedi que se fizesse presente. Levei um susto quando de madrugada, brevemente, um ser etéreo apareceu no meu quarto. Ou às vezes, quando você desperta de um sonho que era basicamente uma viagem astral e você recobra a consciência, se vê na cama, sem conseguir se mover, mas hoje muitos anos depois entendo que era paralisia do sono. É engraçado, mas no início pode assustar”.

Renata chama à atenção para o fato do tema ‘bruxaria’ se distanciar dos estereótipos, sendo também uma jornada de descoberta do poder pessoal. Sendo importante observar, que vivemos em um século digital, mas também em um período que tem voltado as pessoas cada vez mais para ‘seus mundos interiores’ e para a busca do místico, que nem sempre se encaixam na hegemonia cristã. Gente que busca sua fé resistindo e pedindo respeito para além dela. Por que acha que as pessoas têm tanto preconceito com temas como magia, esoterismo e bruxaria? “Há um grande modismo com a bruxaria hoje. É trend, gera atenção, engajamento na superfície em um mundo que implora por aprovação externa mediante chuva de likes. Usar a magia para se fazer passar por algo que não se é se tornou corriqueiro e isso independe de gênero. No entanto, quando você precocemente carrega isso desde que entendeu que é um ser espiritual tendo uma vivência humana, você ainda é visto como um tanto excêntrico, como um mínimo eufemismo, porque a maioria ainda irá julgar ao mesmo como uma pessoa esquisita. E afortunadamente você somente irá ressoar com aqueles que estão abertos a essa forma de vida”, analisa a autora.

“Vejo o esoterismo como um grande tabuleiro, onde qualquer habilidade psíquica, sensorial ou extrafísica pode ter um contorno além das leis do homem cartesiano. Onde uma capacidade ou conhecimento fora do mundo tridimensional tangível pode ganhar uma abordagem que leva a um entendimento maior às atribuições da alma. A magia é algo que pode permear esse entorno mas é preciso que o ego atrelado ao raciocínio lógico permita. Nesse detalhe vem a importância da memória de um passado ancestral. E regressar às civilizações antigas como Atlântida e Lemúria, onde a mais alta magia era o alicerce de muitas sacerdotisas. Comunicar-se com os elementais,  seres do fogo, salamandras não é muito diferente de um médium que pode psicografar ou um autor que canaliza. São formas de comunicação inteligíveis. A bruxaria hoje no lado mais luminoso do termo pode ser vista como um retorno ao caminho ancestral da grande mãe. Ainda que nas escolas, as provas de história ainda precisarão usar o termo bruxaria como um termo entrelaçado à condenação”.

“A bruxaria hoje no lado mais luminoso do termo pode ser vista como um retorno ao caminho ancestral da grande mãe” (Divulgação)

Magia e ancestralidade

Ela lembra que seu contato com a espiritualidade vem da infância. “A herança para mim veio dos dois lados da linhagem, materna e paterna. A avó paterna de origem espanhola tinha uma irmã que era rezadeira, na outra linhagem paterna, mais portuguesa tive um tio avô que era ocultista e dava aula na Ordem Esotérica do Sétimo Raio. Esse ser teve um papel crucial em costurar essas entrelinhas, quando por exemplo aos sete anos me deu um livro “A menina que viajou no disco voador”. Quando pequena fazia entrevistas a ele sobre coisas sobrenaturais, era divertido”, recorda. “Hoje o vejo como um grande guardião. Há almas que vem entrelaçadas no encarne físico para que recordemos o nosso propósito, ou o dharma , para os hindus, missão de alma. Da mesma forma, que a herança das memórias de vidas passadas começaram a pulular ainda na adolescência, então a magia natural veio muito forte: pela linhagem sanguínea e espiritual. Hoje, também enxergo que sempre tive a escrita como um canal mediúnico. Ganhei três concursos literários na escola aos 7, 8, 9 anos… recém alfabetizada, e lembro de ficar duas horas olhando para a página em branco com zero ideias e nos trinta minutos finais, jorrar palavras nas páginas em uma velocidade abrupta. Na verdade, já acessava a rede cósmica desse banco de dados. E muitas vezes a maior forma de magia é essa comunicação com essas muitas janelas e dimensões paralelas, onde você tem habilidades que precisa aceitar que vão além deste cérebro físico”.

O que são as bruxas? “A bruxa troca de roupa quando reencarna. E costura as próprias vidas, em um carretel extenso de muitas existências e recordar isso pode parecer vasto demais para o cérebro físico. São seres que conseguem transitar entre os tempos, ainda que a maioria talvez não recorde isso. É trabalhar pela cura não só sua, mas do outro, através do que se entrega para o mundo. O termo bruxa comunga diretamente com a arte, com as missões de alma. São seres com ferramentas nem sempre usuais como tantas habilidades psíquicas aqui citadas que somam no coletivo para que o homem se erga a um nível de consciência espiritual mais elevado. O que se compõe e se entrega para o mundo com um propósito de ser um ser melhor é atributo de uma bruxa”.

O que elas dizem do que estamos vivendo neste período? Elas dizem? “Estamos regressando a origem. À mais alta forma de consciência. Trazemos o retorno do sagrado feminino nas pautas, nas canções, nas terapias holísticas, na literatura, nas vaporizações de útero e leituras de registros akáshicos. São as tecelãs do passado fiando um novo começo. E é uma grande teia: O Sagrado Feminino vem evocando que o arquétipo da Deusa precisa também de sua parcela de cura em cada mulher e para isso o sagrado masculino também precisa ser olhado, reestruturado e sanado e o equilíbrio de um se respalda no outro. A importância do maithuna ancestral, o real encontro sexual, que no hinduísmo já era aclamado, ganha uma nova visão sobre o sexo agora mais devotado ao encontro alquímico de almas. Então, seguimos abrindo caminho quando essa voz ancestral é chamada a reforçar o já vivido”.