On The Run Tour: a Nouvelle Vague faroeste e policial de Jay-Z e Beyoncé como um grande show visual na HBO


No filme da turnê, lançado em parceria com a emissora norte-americana, casal vai fundo na referência a um dos filmes mais clássicos de Jean Luc Godard, “O Demônio das onze horas” com pitada de Bonnie & Clyde

*Por João Ker

HT já contou aqui em primeira mão como foi a turnê conjunta de Beyoncé com Jay-Z. Agora, para encerrar com chave de ouro o espetáculo aclamado tanto pela crítica quanto pelos fãs, o casal mais poderoso da música resolveu lançar a experiência toda em um filme, feito em parceria com a HBO. Apesar de o show inteiro ter ampliado e muito a sua qualidade sob a direção de Jonas Akerlünd (que por si só já merecia uma outra análise), e da participação magnética de Nicki Minaj,  como todos já estão para lá de cansados de saber setlist e detalhes das performances, aqui a gente prefere falar do filme que passa nos telões do show e que, ao ser veiculado na tevê, teve a devida atenção que merece.

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Dirigida por Dikayl Rimmasch, a produção audiovisual apresenta uma mistura da Nouvelle Vague de Jean Luc-Godard com o clima de perseguição e thriller policial que você já viu no trailer da turnê e uma pitada de faroeste, bem bang bang. Oficialmente, o diretor anunciou que uma das inspirações para a composição do vídeo foi o filme setentista “Tragam-Me a cabeça de Alfredo Garcia” (“Bring Me The Head Of Alfredo Garcia”, 1974, Sam Peckinpah). Mas, estética e enredo sugerem que a fonte da qual Queen B. bebeu foi um pouco mais artística, exatamente aos moldes de “O demônio das onze horas” (“Pierrot le fou”, 1965), um dos grandes clássicos da “nova onda” francesa.

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Beyoncé e Jay-Z vivem a perfeita versão contemporânea do casal interpretado por Anna Karina e Jean-Paul Belmondo, com o pequeno detalhe que, no casal de Godard, o integrante fora da lei era a doce e misteriosa Marianne. Sob as lentes russas e vintage da câmera de Dikayl, a Sra. Carter aparece como uma mulher perfeita, de sorriso fácil e encantador, beleza simples e exposta em cada detalhe do seu corpo. Era sob essa mesma ótica que o diretor francês costumava retratar musas como Brigitte Bardot e Karina, arrancando olhares apaixonantes e misteriosos de ambas. A “homenagem” de Bey a essas mulheres vai desde a filmagem em preto-e-branco até o styling, com listras horizontais e óculos de sol com pegada sessentista. As vozes em off, uma sexy e feminina e a outra galanteadora e masculina, vão descrevendo o casal com adjetivos como “a rainha, o gângster, os anarquistas”,  terminando com uma história em que se preza “o amor e o perigo”.

É a partir daí que começa o romance Bonnie-&-Clyde, fora-da-lei ou Marianne-e-Ferdinand. Assim como os personagens de Godard, Beyoncé e Jay-Z embarcam em um trajetória desvairada, marginal e sem restrições, onde a única certeza que eles têm e querem é a companhia um do outro. No caso, o rapper chegou a declarar que a fuga era uma forma literal de se afastar dos paparazzi, da mídia, das fofocas e dos clichês. E não é exatamente isso que acontece em “O demônio das onze horas”? Marianne e seu Pierrot também não estão buscando um estilo de vida que lhes tire qualquer forma de rotina ou segurança, pensando apenas no amor que um sente pelo outro?

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Trailer de “O Demônio das onze horas”
Assim, como sua versão francesa, o filme de On The Run termina de forma trágica e agressiva, mas bem mais romântica que o filme de Godard. Na última parte do vídeo, depois de roubarem bancos e fugirem da polícia, Beyoncé e Jay-Z estrelam sua própria versão de Bang Bang, que se alterna para um remix de Angels, do The XX, onde juntos, eles enfrentam a morte pelas mãos da polícia. Ao final, o telão exibe a mensagem: “Die in love and live forever” (em tradução livre, “Morra apaixonado e viva para sempre”). Depois de uma turnê batizada de Mrs. Carter, demonstrações públicas de afeto e vigor sexual, uma gravidez acompanhada pelo planeta inteiro, a turnê On The Run e o anúncio de um álbum conjunto, o casal deixa bem claro, de uma vez por todas, que não importam rumores de traição ou divórcio. Os dois não pretendem se separar tão cedo. Pelo menos, não nessa vida. E o resto do mundo que aprenda a lidar com isso.

Bang bang, my baby shot me down (Foto: Tumblr)

Bang bang, my baby shot me down (Foto: Tumblr)

Veja abaixo um trecho da turnê, com “Drunk In Love”: