Exclusivo! Após realizar ritual indígena no desfile da Cavalera, Alberto Hiar diz: “De onde eu venho, eu aprendi a superar qualquer obstáculo”


Diretor criativo da tradicional marca de street wear convidou 20 índios da tribo dos Yawanawá para uma cerimônia de purificação, prosperidade e celebração, enquanto Yasmin Brunet e Reynaldo Gianecchini riscavam a passarela do desfile

Como HT comentou aqui mais cedo, a Cavalera levou para o seu desfile Verão 2016 na São Paulo Fashion Week um verdadeiro exemplo de como um espetáculo no universo da moda pode unir um conceito bem amarrado, tecnologia têxtil e ainda reforçar um dos papeis principais de uma coleção, que é refletir, de maneira singular, um comportamento cultural e transformá-lo em roupas que apresentem uma proposta sólida. Ao convidar a tribo Mutum, da etnia dos Yawanawá, para realizar – a céu aberto no Parque Villa-Lobos – o ritual Vekushi de purificação e proteção, enquanto modelos e até o ator Reynaldo Gianecchini desfilavam peças da coleção batizada Kenes em volta do círculo formado pelos índios, a grife de Alberto Hiar transformou a mais antiga e original das culturas brasileiras em tendência contemporânea e certeira.

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Algumas horas antes de o desfile-celebração tomar conta da Ilha Musical, no Parque Villa-Lobos, atraindo gente como Deborah Secco + Rodrigo Lombardi, Marieta Severo e Ronaldo Fenômeno, o backstage da Cavalera era uma correria digna de novela, cheirando a laquê e urucum: de um lado, modelos eram maquiados e cabelos escovados pelo time comandado por Robert Estevão; do outro, 20 integrantes da tribo Yanawaná, que vivem às margens do Rio Gregório, na Floresta Amazônica acreana, acabavam de pintar seus kenes (desenhos tribais que deram origem ao nome da coleção da grife) pelo corpo. Dentre eles, encontrava-se Matsni, um dos pajés da tribo e membro da grande família que saiu do Acre para a capital paulista: “Essa é a minha terceira vez aqui, em São Paulo, mas é a primeira que venho com minhas filhas, irmã [a também pajé, Mariazinha] e sobrinho. O convite surgiu do Alberto [Hiar], depois que ele passou cinco dias vivenciando os nossos rituais de reflexão no Acre”, comenta. Os desenhos na pele simbolizavam a paz e a festa que ele estava prestes a evocar no evento: “Nós vamos fazer uma dança e queimar o sepá, incenso feito com uma resina rara de ser encontrada na floresta. Tudo isso faz parte dos nossos rituais de prosperidade, purificação espiritual, evocando a proteção dos espíritos da floresta”, explica.

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O responsável por fazer a ponte entre Alberto Hiar e a tribo dos Yanawaná é o biólogo e naturalista Richard Rasmussen, apresentador do programa “Natureza Selvagem”, que contou ao HT como se deu essa troca. “Alberto e eu estamos nesse namoro com a tribo há cerca de um ano e meio. Ele me perguntou qual foi a experiência mais incrível com a natureza que eu já tive e lembrei dessa tribo. Ele voltou extasiado!”, comenta. Levar tal vivência a outro nível e inserir 20 índios do Acre em uma metrópole como São Paulo é, de acordo com o próprio, um marco histórico: “Eles já fizeram vários trabalhos com empresas e arquitetos, mas é a primeira vez que são trazidos para cá. Para os índios, é algo ótimo, uma oportunidade de se sentirem valorizados e apreciados pela própria cultura. É a primeira vez que isso acontece na história desse povo indígena”, enfatiza.

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João Bôsco Nunes, representante da empresa Maanaim Turismo, responsável por promover o Acre, fala sobre a importância da prática para os próprios índios: “Eles estão completamente satisfeitos com a experiência, porque ela rende a oportunidade de mostrar a esse público como é o índio e como é sua cultura da forma mais pura possível”. João ainda acrescenta que, para quem estiver interessado, a imersão na cultura dos índios pode ser realizada através do festival Mariri Yawanawá, que acontece entre os dias 27 e 31 de julho, onde os visitantes poderão conhecer as particularidades da tribo, inclusive seu centro medicinal que cura desde a saúde física à espiritual.

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Ainda extasiado com o ritual  dos índios do qual havia participado na noite anterior na granja de Claudine Rodrigues, viúva do cantor Jair Rodrigues, Alberto Hiar acompanhava no backstage a movimentação em torno de Reynaldo Gianecchini, que gravava também cenas para a próxima novela das 23h da TV Globo, “Verdades Secretas” (de Walcyr Carrasco). Paralelamente, a correria habitual rolava a todo vapor, incrementada pela presença dos 20 índios. “Foi incrível conhecer a tribo e vivenciar a cultura deles. Foram 24h de viagem até o interior da Floresta Amazônica. Desembarquei na aldeia alguns dias após as tempestades que devastaram as cidades do Acre e pude ver a floresta repleta de galhos e troncos de árvores caídos. Parecia um quadro, uma cena que nunca vou esquecer. Os índios me convidaram para uma pesca especial, que também que foi incrível!”, conta Alberto.

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Alberto garante que o contato com a tribo ficará eternamente em sua memória: “A coleção da Cavalera pode mudar a cada estação, mas minha ligação com os índios será para a vida toda. Já confirmei a minha presença no festival que será realizado na aldeia em julho”, afirma, acrescentando: “Essa foi uma experiência rica que eu quis passar adiante. Temos de estar abertos a qualquer tipo de cultura e interpretá-la da maneira que tivermos vontade”.

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Sempre um passo à frente do jogo e famoso por reinventar o conceito de desfiles no Brasil, chegando ao extremo de carregar modelos e convidados para as margens do Rio Tietê, em 2008, Alberto é enfático e realista ao sintetizar o momento atual da indústria da moda nacional: “Se não nos unirmos, a moda brasileira pode ter um desfecho trágico. Mas isso tem de acontecer de maneira orgânica. Às vezes, as pessoas se unem pela necessidade e pela dor, mas assim também é perigoso”. E como ter garra e esperança, Alberto? “De onde eu venho, eu aprendi a superar qualquer obstáculo”.