*Por Zé Pedro
Esse ano está puxado, como diriam meus companheiros de copo e de bar. Toda sexta-feira tem estado com cara de 31 de dezembro diante de tantos balanços de perdas e ganhos. São políticos escorrendo pelo ralo, artistas que tanto amamos abandonando o planeta Terra (Não se vá, Prince!), dólar no sobe e desce, amor e ódio compartilhado nas redes sociais. Enfim, caos urbano é frase que nunca esteve tão em voga nesse mundo. Convidado a escrever semanalmente essa coluna nesse dia tão esperado que precede os delírios e delícias do fim de semana, pensei em muitos assuntos.
Dentro da minha cabeça, nasceram muitos temas que logo foram abortados ao alcançar os tensos dedos que tocam o teclado do computador. Resolvi então ser factual. O que me tomar em corpo e alma durante a semana será declarado aqui por mim. Não. Não usarei esse terreno de mal traçadas linhas para amargar, declarar guerra. Quero acender desejos de consumo no campo das artes e como sempre diz minha amiga Marina Lima: “José, não sai da luz”. Mesmo por que Clodovil já morreu e bicha má tá fora de moda. Consciente do que esperam de mim, começarei pela música, esse assunto que não sai de mim, não sai. Afinal, DJ: o que você anda escutando?
A menina carioca Mahmundi (lei aqui a entrevista que o site fez com ela). “Hit”, a faixa que abre o primeiro álbum dela, é pista explícita de suas intenções dentro do pop brasileiro: ser uma fazedora de sucessos radiofônicos (mesmo que hoje isso signifique bem mais Spotify e outras ferramentas digitais). Alma gêmea do cantor e compositor Silva em teclados e rimas fáceis, Mahmundi traz de volta aquele clima de verão dos anos 80 cheio de romantismo e bem viver.
Outro sopapo na cara do fraco é o álbum “Hopelessness” da cantora/cantor Anohni. Não posso desperdiçar espaço aqui descrevendo este ser chamado Antony Hegarty, suas dualidades e potência vocal estão bem descritas nas ferramentas de busca, o que realmente me cabe é atentar para a importância dentro do mercado musical (ele ainda existe?) de um artista desse porte que se transforma em outros a cada projeto sem perder o fio condutor chamado emoção. “Hopelessness” abandona a solidão do formato voz e piano tão usual na carreira de Antony e parte para as barras mais pesadas com beats enfurecidos e letras viscerais. Aliás, você já viu o clipe de “Drone Bomb Me”? Naomi Campbell é a estrela absoluta, surpreendendo a todos que jamais esperariam encontrar tamanha diva mainstream aliada a este deus do undergorund.
Falando em imagens, Silva (sim, já citei ele lá em cima) sacudiu, abalou e quase quebrou a internet com seu novo videoclipe “Feliz e Ponto”. Asssediado pelas gatinhas e adorado (com moderação?) pelos meninos, ele surpreendeu a todos no início da semana, expondo suas idéias de amor livre com imagens de alta tensão sexual (quase explícita! Uhuhu). Belo contraponto à infeliz declaração homofóbica em rede nacional da filha de Silvio Santos que quase derrubou minha autoestima no domingo.
Outro fato/boato foi a doença de Gilberto Gil que transformou nossa timeline em residência de urubus disfarçados de solidários e comunicados oficiais/fakes. Ouça “Não Tenho Medo da Morte”, sua letra mais desconcertante e bela, e descubra que esse baiano genial já transcendeu há muito tempo essas questões de habitar ou não o plano em que vivemos. Ali, no chão da prisão militar que precedeu seu exílio no final dos anos 60, Gil começou sua jornada de desprendimento do homem que era e mergulhou fundo na alimentação natural, elevação espiritual e outras sabedorias. Portanto, xô coveiros de plantão. Mistério sempre há de pintar por aí, né, Gil?
Falando em transe total, o filme de Marina Abramovic “Espaço Além” teve sua primeira exibição no Brasil com a presença da artista. A pré-estreia era em um cinema no Shopping Iguatemi em São Paulo, mas ao apagar das luzes todos dentro da sala deslocaram-se junto com Marina rumo ao universo místico brasileiro. Para um cara distante de crenças e assumidamente medroso com as coisas do improvável como eu, “Espaço Além” foi transformador e emocionante. Mesmo nos momentos em que Marina se mostra inadequada ou nos faz rir (fator importante dentro do roteiro no sentido de humanizar tal mito), eu mantinha o meu silêncio, completamente impactado pela beleza das imagens e os surpreendentes rituais acontecidos a cada cidade visitada.
E na política……. Não. Fico mudo e faço cara de mistério. Até semana que vem.
* Zé Pedro é um artista dedicado à Música Popular Brasileira. Apesar de ser conhecido com um DJ que toca vários estilos musicais, é considerado uma enciclopédia da MPB. Nessa área, ele atua em qualquer esfera de produção de remixes, a publicação de um livro e a inauguração do selo Jóia Moderna, em 2011, que já conta com mais de 20 discos lançados até agora, resgatando o trabalho de cantoras de outras gerações, criando tributos a grandes compositores e lançando novos talentos do pop brasileiro. Mais recentemente criou o Canal da Véia (como ele se refere a todo mundo e a si mesmo) no YouTube, que já é um sucesso.
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