* Por João Ker
Nesta semana foi ao ar o último episódio da 3ª temporada de “Girls”, com mais de um milhão de telespectadores assistindo – seis pontos a mais do que no ano passado. Ao longo dos 13 capítulos, a série conseguiu aumentar sua influência cultural e se estabilizar como um dos dramas atuais mais lucrativos da HBO. O impacto cultural foi tanto que Lena Dunham, diretora/produtora/roteirista/atriz, virou starlet e conseguiu sair na capa da Vogue, mesmo estando acima do peso considerado “padrão” pela editrix-master Anna Wintour.
E, óbvio, isso quer dizer muita coisa. Na primeira temporada da série, o público é apresentado a um grupo de quatro jovens tentando encontrar si mesmas em uma vida nova-iorquina pós-faculdade. Sem estilo, sem dinheiro no bolso, sem nenhuma perspectiva concreta e muitas vezes sem amor próprio, elas se desenvolvem durante o primeiro ano de tevê. Com essa trama, o badalo em torno de “Girls” foi aumentando de proporção e surgiu até a pergunta: será que a série seria uma versão hipster de “Sex And The City”, voltada para a nova geração?
A segunda temporada é confusa para os personagens, mas também serve como plataforma dos valores que a série pretende passar. Os peitos e o egoísmo de Hannah continuam aparecendo na tela; os questionamentos sobre o que é certo e errado aumentam de magnitude; as responsabilidades e sufocos da vida adulta parecem mais pesadas. Nesses outros dez episódios, as garotas abrem ainda mais suas feridas e mostraram seus defeitos para o público sob outro ponto de vista, solidificando a atração. Portanto, seriado consolidado.
Nesta mais recente e terceira temporada, a coisa esquenta e já começa com Jessa (Jemima Kirke) presa, entediada e causando um inferno na rehab, mais capeta do que o corpo de Lindsay Lohan tomado por um demônio milenar resistente a exorcismos. Linda Blair perde. Hannah se recupera do colapso nervoso que teve no final da última temporada e até mantém um relacionamento saudável para os padrões aos quais está acostumada. E Marnie (Allison Williams) demonstra ser a mais perdida de todas, mesmo estando com a mãe e tendo aquele rostinho de Katy Perry, criada à base de Toddynho. Até Shoshanna (Zosia Mamet), que demorou a pegar no tranco, finalmente libera sua sexualidade e começou a aproveitar a vida, renovando sua coleção de calcinhas e precisando ligar o ventilador de teto para secar o colchão.
Mas, apesar de todo esse desenrolar das personagens se firmando ao longo de três anos, nada é um mar de rosas . Se, por um lado, elas começaram bem, a “segurança emocional” de todas desaba aos poucos, como um bolo de sorvete derretendo ao longo da festa. Jessa, por exemplo, tem uma storyline para lá de agitada: sai da clínica de reabilitação, arranja emprego, volta a ser viciada, se cura de novo, arranja outro emprego, sua patroa pede para sair (ops, ser assassinada!), depois pede para ser salva e assim acaba sua história, sem sabermos se a garota matou ou não a velhinha indecisa com nove planetas em Libra.
Shoshanna ilustra perfeitamente o ditado “depois que você abre a porteira, não tem como segurar os bois”. Com nome que lembra a parte pudica feminina (ou uma rebenta de Baby do Brasil), uma aventura sexual atrás da outra, piadas sem noção perfeitas para o “Zorra Total”, badalos inconsequentes e bebedeiras sem fim, ela é forte candidata a ganhar o título de Miss Lascívia, correndo o risco de ser eleita hors concours. Num geral, ela parece uma versão classe média morena da voluptuosa Paris Hilton, sem tantos decotes nas costas, muito menos brilho, mas com um temperamento desequilibrado e uma maldade que, na maioria das vezes, é fruto da falta de sensibilidade. Resultado: reprova na faculdade e não consegue voltar para o ex nem depois de suplicar e se humilhar, se rastejando feito tapete persa puído.
Mas nenhuma delas sofre tanto quanto Marnie. Depois de ser largada pelo namorado, ela perde o emprego, vira assistente da sua ex-assistente, é julgada por todas as amigas, se torna um viral no Youtube – de uma maneira nada boa – e, no último episódio, começa a se envolver com um homem compromissado. E tem também Hannah mais egocêntrica que nunca, se achando cereja de bolo, saindo do emprego porque “quer-e-que-e-quer” (como toda criança mimada) e sufocando Adam com suas percepções erradas de um relacionamento.
Ainda assim, com todos esses defeitos e várias mudanças de direção no roteiro, “Girls” consegue mandar uma mensagem forte. O telespectador consegue se relacionar e se enxergar através dos erros desses personagens, por mais cruéis ou duvidosos que eles pareçam. A série está evoluindo para algo substancial, só que de uma maneira mais implícita do que as famosas perguntas de Carrie Bradshaw. Nas entrelinhas, é possível ler “carreira ou relacionamento?”, “até que ponto é ok me divertir?”, “eu devo me preocupar com o que os outros pensam?”, “como superar traumas antigos?” e por aí vai. Mote perfeito para cativar uma nova fornada de fãs, sobretudo aqueles que fazem parte – ou estão saindo – da geração Y.
Com sorte, a quarta temporada trará respostas para essas perguntas. Uma dica de que isso poderá acontecer é o investimento secreto que Hannah tem feito em sua carreira de escritora: uma atitude madura, que não seria tomada duas temporadas atrás. Talvez, ao ir para Iowa, a menina encontre uma maneira de baixar sua bolinha e descobrir que o mundo vai além do umbigo. Até lá, é possível aprender pelo menos uma lição que vem sendo ensinada desde o primeiro episódio: a vida é muito aleatória e você nunca sabe o que ela reserva. “Beware!”
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