* Por Carlos Lima Costa
Um ano de limitações decorrentes do isolamento social por conta da pandemia do Covid-19, 2020 foi também uma fase de reflexões, de olhar para si mesmo. O ator Daniel Rocha, que pôde ser visto na Globo, na reprise da novela Totalmente Demais, passou grande parte desses meses sozinho. Em 26 de novembro, completou 30 anos, maduro, reavaliando conceitos, desejos que projetava para o futuro “Sempre fui inquieto, terminava uma novela, já querendo saber qual ia ser o próximo trabalho. Nesse período em que fiquei sozinho, isolado, parei com essa pressão sobre mim mesmo, deixei de criar expectativas sobre o que vai acontecer e comecei a perceber que já fiz trabalhos bem bacanas com gente muito legal e comecei a ser grato. Agora, é com leveza que penso no futuro. Os 30 anos e o isolamento me fizeram ser mais generoso comigo nesse sentido de ser mais tranquilo”, avalia.
Desde o início da quarentena, em março, Daniel se preveniu, afinal, como tem bronquite asmática, é do grupo de risco. “Me isolei de forma radical”, recorda. Primeiro, sozinho, em seu apartamento. Depois, com uma certa flexibilização, saía apenas para ir ao mercado ou à farmácia. Até que no início de dezembro embarcou rumo a Inglaterra, para passar Natal e Ano Novo com dois amigos, como havia programado antes da pandemia. “Saí do Brasil, onde estava isolado, para ficar aqui isolado. Fiz todos os exames antes de vir. Ao chegar na Inglaterra tive que provar que não estava com o vírus. Mas a rotina é a mesma que fazia no Brasil: fico em casa, assisto filmes e séries, e toco violino”.
Daniel é crítico em relação aos que não respeitam os protocolos de segurança. “No Brasil, muitas pessoas voltaram a flexibilizar a vida. Entendo quem precisa trabalhar pela necessidade de colocar o pão na mesa. Mas a pessoa escolher estar no Leblon, sem máscara, bebendo uma cervejinha, ou lá na Barra, na Rua Olegário Maciel, lotada nos finais de semana, ou em uma festa clandestina, como se nada tivesse acontecendo. Sei que muita gente cansou do vírus, tem sido um período longo, mas estamos longe do final disso. A vacina no Brasil ainda não é uma realidade, o vírus está voltando com tudo. Sei que são as festas de fim de ano, querem extravasar esse período que ficaram em casa, mas não é o momento nem de aglomerar, porque as mortes, as nossas perdas estão cada vez mais perto. Jovem fica assintomático, mas aí nesse período transmite para quantas pessoas? As pessoas estão completamente insanas, tem que pensar no próximo”, pontua.
Daniel atravessou toda a pandemia solteiro. Em setembro de 2019 chegou ao fim a relação com a dermatologista Laíse Leal. Eles haviam oficializado o romance seis meses antes. “Nós já morávamos juntos há seis anos, então, era um casamento. Foi um pouco estranho me ver sozinho, não ter ninguém. As cachorras estão com ela. É uma mudança um pouco drástica. Difícil, ter sentido a casa silenciosa. Não foi fácil, mas necessário. Depois disso, veio a quarentena. Fui obrigado a ficar sozinho e eu gostei da minha própria companhia. A pandemia e a separação me ajudaram a entender que eu me basto muito sozinho”, garante.
E completa que vem levando com tranquilidade esse momento de pandemia sem namorar, nem beijar na boca. “A gente vê que beijar uma pessoa e fazer sexo tem outro significado, porque solteiro não posso beijar na boca e ter contato físico. Então, ressignificamos. Mas acho que se não separasse em setembro, da pandemia não passava. Essa quarentena colocou um ponto final em muitos casamentos. E, por outro lado, muita mulher ficou grávida”, pondera.
Em termos profissionais, quando a pandemia começou, em março, Daniel viu serem interrompidas as gravações da série Névoa, da HBO, protagonizada por ele, que até hoje ainda não foram retomadas. “Sempre quis trabalhar com a HBO e com a O2, grande produtora. Estou acreditando bastante neste trabalho, é um suspense, gênero pouco feito no Brasil. Meu personagem Bento é um violinista em uma história que acaba entrando pelo lado do mistério, em uma situação de mato e isolamento”, ressalta.
Por coincidência, quando foi fazer o teste já agradou a produção o fato dele tocar violino assim como o personagem. “Eu era muito novo, tinha cinco anos, quando escolhi o violino, após meu pai entrar em uma loja de música e me perguntar qual instrumento eu queria. Já tinha referência dele, porque fui criado na igreja, sou da Assembléia de Deus, então, sempre vi uma orquestra tocando ao vivo aos domingos na missa. Lá, ou você canta, ou toca e eu nunca cantei muito bem”, explica. Daniel não é o único da família com dotes musicais. O pai, Cledson, e os irmãos Tiago e Ana tocam respectivamente violão, saxofone e piano.
E confessa: “Nunca me dediquei o suficiente ao instrumento, porque sempre tive noção de que eu era só razoável, nunca fui um prodígio. Aí fui para o caminho do esporte. Voltei a pegar o violino na fase adulta e descobri um grande aliado na minha vida. Comecei a fazer aula com uma musicista maravilhosa, uma musicoterapeuta, e, além de conseguir evoluir musicalmente, como tenho dislexia, tem me ajudado muito nesse lado, pois através da música tenho tido resultados muito bons”, ressalta.
Nesse período em casa, participou da websérie online Dizem Que Falo. Cada ator gravou sua participação de casa pelo celular. E fez ainda uma leitura dramática online. “Fora isso, estou desde março sem trabalhar. Tem sido um período difícil, porque o ofício da atuação é muito prazeroso, adoro set de gravação, decorar texto, interagir com as pessoas, mas não está sendo possível, então, tenho focado em outras coisas, tocado violino. Acho que nunca me dediquei tanto e evolui tanto como agora. Aí vi que o segredo para tocar bem é dedicação, é ficar dedilhando”, aponta.
A última novela de Daniel, na Globo, foi A Lei do Amor, exibida até março de 2017. Já faz um tempo que vive uma fase mais independente da carreira. Em 2016, ainda contratado pela emissora da família Marinho, foi aprovado em teste com 800 atores para interpretar o ex-pugilista Popó, tetracampeão mundial, na série Irmãos Freitas, do canal Space. “Querendo ou não, era concorrente da Globo. Então, tive uma conversa bacana com a direção, me liberaram, só que não ia ter renovação depois, porque não tinha lógica eles me manterem na grade trabalhando como ator se eu ia fazer uma série para a concorrência. Mas foi uma conversa tranquila. Deixei a Globo com portas abertas. Entenderam que eu queria fazer um trabalho que era oportunidade única na vida. Walter Salles nunca tinha feito televisão, só cinema. Entende isso, o cara lá de Central do Brasil estava lá fazendo a primeira série dele junto com o Sérgio Machado, de Cidade Baixa. Eram pessoas muito importantes com as quais eu queria trabalhar. Foi uma atitude arriscada, só que foi o meu melhor trabalho, onde mais cresci como ator, onde tive minha melhor performance, porque foi desafiador”, lembra sobre a produção que atualmente pode ser conferida na plataforma Amazon Prime.
À princípio, Daniel retorna ao Brasil, em janeiro. “Voltarei com a esperança de dias melhores e de ter a vacina no braço de todo mundo”, torce. E revela o que deseja fazer depois que a pandemia passar. “O que mais desejo é voltar a trabalhar. E não vejo a hora de parar essa agonia que todos nós passamos. Todo dia é um conhecido nosso que é entubado, dia desses um amigo saiu do CTI, aí o (Marco) Ricca recebeu alta e a gente ficou feliz, mas no mesmo dia a Nicette (Bruno) faleceu, e a gente ficou triste. Ainda não encostou na minha família, não perdi um avô, nenhum familiar próximo, mas está ficando cada vez mais perto. Isso tem me assustado bastante. Quero que esses sustos e decepções diárias parem. Não só decepções de perdas, mas também políticas. Estamos em um momento político completamente equivocado, perigoso e tenebroso, no Brasil”, reflete.
E prossegue: “A gente teve a chance de mudar muita coisa nessa última eleição e acho que conseguimos dar uma resposta em muitos estados. Quando vimos uma campanha tão boa que o (Guilherme) Boulos fez, em São Paulo, me dá certa esperança de que na próxima eleição para presidente a gente saiba escolher melhor. Todo dia vemos vidas perdidas, famílias que estão sofrendo luto e um presidente fala que Covid-19 está na fase final. E o ministro da Saúde diz ‘pra que a pressa’ da vacina. São frases que não cabem em nenhum momento. Essa falta de cuidado com o brasileiro, com as famílias que estão perdendo pais, avós, filhos, e a falta de humanidade me destroem todo dia”, assegura.
E como encara as agressões verbais e os cancelamentos na internet? “Alguns acho que são exageros de haters que se juntam para cancelar alguém. Esses haters se protegem em páginas fakes para botar para fora tudo que pensam, mas não tem coragem de falar mostrando a própria cara. Mas sou a favor para alguns momentos, quando um grupo se sente injustiçado ou de alguma maneira agredido por postagem de influencer, por exemplo, que tenha feito brincadeira com vidas, com pessoas que estão perdendo familiares. Acho muito violento, nesse momento, uma pessoa bater de frente com isso. Vejo também comentários de um radicalismo desnecessário. Por exemplo, sou a favor da vacina. Não sei o motivo de uma pessoa falar que não quer ser vacinada. Mas eu espero que todos queiram”, reitera.
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