Caco Ciocler fala sobre a questão racial que envolve personagem em Segundo Sol: “a escravidão é incrivelmente presente nos dias atuais, mas de uma maneira disfarçada”


Na trama, o ator vive o filho de uma empregada doméstica com um grande empresário da região. O rapaz tem um irmão, mas os dois são tratados de formas diferentes pela cor da pele

Todo mundo sabe que o texto de João Emanuel Carneiro não é nada fácil. O ritmo acelerado da história aliado à complexidade dos personagens gera uma matemática difícil de lidar para os atores. Um dos núcleos mais complicados desta teledramaturgia é o debate racial existente entre Caco Ciocler e Fabrício Boliveira. Na trama, os dois são filhos de um grande oligarca da Bahia com a empregada da casa, que é uma mulher negra, no entanto foram criados de forma diferenciada por uma simples diferença: a cor da pele. Enquanto o Caco é tratado como príncipe e criado como filho legítimo, o de Fabrício não é visto como membro da casa, por ser negro. “Acho uma discussão extremamente oportuna para este momento do Brasil, porque é um irmão negro e outro branco e filhos da mesma mãe e pai, mas mesmo assim a diferença de tratamento entre eles é perceptível. A grande oligarquia baiana aceita um e não o outro. É muito importante ser falado para mostrar como a escravidão é incrivelmente presente nos dias atuais, mas de uma maneira disfarçada e, aparentemente, resolvida”, lamentou Caco. Além dos dois, na trama, terem brigado pela mesma mulher, há um esforço muito grande do Roberval em mostrar que é igual ao Edgar.

Caco Ciocler interpreta um cara rico filho de um grande oligarca baiano (Foto: TV Globo/João Cotta)

O ator intitulou Edgar como o papel mais difícil de sua carreira devido a esta carga de complexidade dada pelo autor João Emanuel Carneiro, anteriormente comentada. “Os personagens são complexos, não é uma coisa só, aponta para vários lados diferentes. Ele tem muito mais características próprias do que função na história, o que é muito legal. E ele tem vários traços diferentes da sua personalidade parecem não combinar e o meu desafio é descobrir como junta tudo sem parecer algo esquizofrênico”, confessou. Segundo o ator, Edgar é uma pessoa fraca de caráter, mas ao mesmo tempo é sensível e completamente apaixonado pela filha adotiva. Assim como é um sedutor bem sucedido com as mulheres, é um cara rude. São muitas faces contraditórias que Caco Ciocler precisa administrar.

Apesar de aparentemente Edgar ser controverso, o ator ainda está em dúvida quanto a índole do papel. “Não dá para saber se ele é do bem ou do mal. Não dá para saber muito, na verdade, entre os personagens do João Emanuel Carneiro. Todos são muito dúbios. Aparentemente, o Edgar é um babaca, machista, filhinho de papai que não trabalha e trai a mulher. No entanto, nas horas vagas, ele vai tocar música clássica no piano, gosta muito do irmão por terem crescido juntos, é justo e super carinhoso com a filha adotiva. Não sei quem ele é. Estou perdoando este cara por ter sido vítima de uma educação sem base, longe da realidade”, afirmou. Para Caco, fica fácil julgar o personagem tendo em vista todas estas falhas de seu caráter, no entanto acredita ser importante tornar a discussão mais abrangente. “A gente está vivendo em um momento em que as pessoas têm uma vontade muito grande de se vingar. E todas as classes oprimidas têm razão. Mas não sei se este ódio é o melhor caminho. Dessa forma, não devemos chapar as discussões e tornar tudo preto no branco. O meu personagem não é totalmente do mal assim como o Roberval não é totalmente do bem. Ficaria um debate muito raso dizer que um oprimiu o outro e agora um dos irmãos vai se vingar”, informou.

Maria Luísa Mendonça é Karen, casada com Edgar e é constantemente traída pelo mesmo (Foto: TV Globo/João Cotta)

Caco Ciocler não para! O ator esteve recentemente no elenco de Novo Mundo e de Deus Salve o Rei, que ainda está na grade da Rede Globo. Ambos os papéis eram muito diferentes entre si e ainda mais divergentes do Edgar. “Tem atores que gostam de colocar a sua persona na frente dos personagens, o que não acho nem bom e nem ruim, mas a minha viagem sempre foi outra. Gosto de me transformar e não estou falando de forma física, isto é o de menos. Acho que o meu trabalho é mudar a alma”, comentou. Esta rotina repleta de trabalho, embora seja exaustiva, para ele está sendo muito bacana. O ator ainda garantiu que espera ter um longo caminho pela frente repleto de papéis instigantes como estes.

Caco Ciocler na coletiva de imprensa de Segundo Sol (Foto: Raphael Dias/Gshow)