Danilo Caymmi homenageia Tom Jobim em turnê, revela polêmica em “Tieta” e critica contínuo uso de IA na música


O músico, cantor, compositor e arranjador homenageia o legado de Antônio Carlos Jobim no show ‘Um Tom Sobre Jobim’, marcando 30 anos da morte do maestro. Danilo revelou que lançará um disco em 2025, atualmente em produção. Ele lamenta a perda da valorização melódica na música atual, impactada pela tecnologia e inteligência artificial: “Há muitos compositores que não são compositores. São processamentos digitais. Chegará um momento em que não dá para saber o que é real e o que não é”. Relembra ainda Danilo relembra também a efemeridade do mercado musical na televisão, como no caso de sua composição para a abertura de “Tieta”, de volta ao ar a partir da próxima segunda, preterida pela lambada pop de Luiz Caldas.

*por Vítor Antunes

Uma família que transpira música. Que transcende música. Essa é a Família Caymmi. De Dorival Caymmi (1914-2008) Nana, Dori e Danilo Caymmi + filhos e netos! Hoje vamos falar sobre Danilo Caymmi que está realizando o show Um Tom Sobre Jobim, uma homenagem ao legado de Antonio Carlos Jobim (1927-1994), neste ano que marca três décadas da partida do maestro. Danilo divide o palco com a cantora de jazz Stacey Kent. No repertório, clássicos eternos como Garota de Ipanema, Desafinado e Águas de Março.

No dia 7, Danilo estará em São Paulo, e, no dia 8, data que completa 30 anos da morte de Tom, no Rio de Janeiro. Tom foi o elemento de ligação entre mim e Stacey. Sou grande fã dela, e eu ia gravar um disco chamado ‘Danilo Caymmi canta Tom Jobim‘. Convidei Stacey e ela, gentilmente, gravou conosco. A partir daí ficou um desejo meu de que fizéssemos algum trabalho juntos. Assim surgiu o projeto do show. Fizemos Londres e Lisboa, e as próximas praças são Brasília, São Paulo e Rio”. Com exclusividade, Danilo contou ao Site Heloisa Tolipan que lançará um disco novo no próximo ano, já em processo de seleção de repertório e produção.

Sobre os festivais, que marcaram os anos 1960 e 1970, Danilo lamenta o vazio deixado por uma época em que a melodia era a rainha das canções: Hoje é diferente. Não caberiam os festivais. Há muito a questão da tecnologia influenciando. Tudo se transforma por conta da internet. Parece que nas canções novas sumiu a melodia. Valorizávamos muito esse fazer, que era de uma importância incrível, mas infelizmente o momento que a gente passa é outro”. Em um mundo moldado por avanços tecnológicos, a inteligência artificial também o inquieta. Há muitos compositores que não são compositores. São processamentos digitais. Chegará um momento em que não dá para saber o que é real e o que não é”.

Danilo antecipou o lançamento de um novo disco para o ano que vem, 2025 (Foto: Natasha Durski)

A estreia de Danilo em discos foi justamente em 1964, em Caymmi visita Tom, álbum de Dorival Caymmi (1914-2008). Estreei tocando flauta, aos 15 anos. Minha preocupação não estava em ser músico, mas com as provas de Química. Só vou conhecer o Tom com aproximação, em 1983, quando fiz parte da Banda Nova, e era um produtor de palco, uma pessoa de confiança. Do disco ‘Passarim’ para frente, gravei tudo com o maestro, até seu falecimento, em 1994.”

A gente tem um um problema no Brasil, de sempre, que é o esquecimento, a falta de memória. E esse show resgata o Tom – Danilo Caymmi

Danilo relembra também a efemeridade do mercado musical na televisão, como no caso de sua composição para a abertura de “Tieta”, de volta ao ar a partir da próxima segunda, preterida pela lambada pop de Luiz Caldas. “Mariozinho Rocha, diretor musical da novela, encomendou uma música para a abertura. Mas acharam que ela não cabia mais, e o Boni acabou fazendo uma letra diferente para Luiz Caldas. Era um negócio de televisão, o mercado funcionava assim”. No entanto, logo o destino corrigiria os ventos. Em “Riacho Doce” (1990), Danilo emplacaria duas canções imortais: “O Que É o Amor”, na voz de Selma Reis (1960–2015), e “O Bem e o Mal“, cantada por ele, ambas ecoando com força e poesia na história da música brasileira.

Danilo Caymmi nos Anos 60, tocando flauta. “Eu me preocupava com música, mas com as provas de química” (Foto: Arquivo Nacional)

TONS DE TOM E CAYMMI 

Danilo Caymmi desenha memórias como quem pinta paisagens de saudade, onde cada pincelada revive encontros, melodias e afetos que moldaram sua trajetória. Sobre Tom Jobim, amigo e parceiro de mais de uma década, fala com ternura e admiração, evocando a simplicidade do maestro que caminhava com o despojamento dos grandes: Tom tinha um humor muito, muito parte da personalidade dele. É muito legal uma pessoa muito simples. Eu morava ali no Jardim Botânico, perto da casa dele – hoje eu moro em Curitiba – e na época Tom ia tomar café na padaria em frente à TV Globo, vestindo pijamas feitos pela mãe dele. Da mesma forma que ia para a Farmácia Piauí , no Leblon. Tom era uma grande figura”.

O músico também se volta à infância, onde a casa era viva seu pai, Dorival e sua mãe, Stella Maris, cantavam com naturalidade e a música estava presente a todo tempo. “Meus pais cantavam em casa. Havia um livro com músicas do Vicente Celestino, que eles gostavam muito de cantar. A música fazia parte da gente, nem gostava, porque já era uma coisa integrada. Piano, violão, essas coisas, todo mundo estudando. Essa coisa doce foi muito comum.”

Danilo Caymmi foi criado numa casa musical (Foto: Natasha Durski)

Na arte de Danilo, o passado nunca se apaga. Ele se transforma em melodia, em memória viva. E é essa sua missão: perpetuar o legado dos que vieram antes, ao mesmo tempo em que se abre ao futuro, com olhos atentos e alma sensível, em uma era onde a música ainda é, acima de tudo, a voz do coração.