Rock in Rio: por quase três horas, Bruce Springsteen passa de ‘chefe’ a rei absoluto no melhor show do festival


Entre a delicadeza e a imponência, astro americano faz performance visceral, executa álbum ‘Born in the USA’ na íntegra e cria catarse coletiva no Palco Mundo

Por Pedro Willmersdorf

A arena esvaziada logo após a passagem de John Mayer pelo Palco Mundo não fazia jus aos quase 180 minutos que viriam a seguir. Dali em diante, o Rock in Rio teria a chance de proporcionar ao público da Cidade Maravilhosa uma experiência quase transcendental, proporcionada por um dos músicos mais vigorosos, viscerais e simbólicos dos EUA. Aos 63 anos, Bruce Springsteen confirmou as expectativas daqueles que analisaram com calma a escalação do festival antes de seu começo. Bruce entregou o melhor show desta edição. Não somente por sua performance, mas pelo que ela representa.

Há 25 anos afastado do Brasil, Springsteen nunca havia se apresentado em solo carioca. E consciente de seu carisma e domínio de palco únicos, preparou uma surpresa para sua passagem pela cidade: a íntegra (com as 12 faixas em ordem aleatória) de ‘Born in The USA’, seu álbum mais conhecido, de 1984. Um presente que surpreendeu a todos e trouxe ainda mais simbolismo para seu show, que ainda contou com diversas ‘participações especiais’.

Nos braços de seus ‘comandados’, ‘The Boss’ (tradicional apelido que mescla de forma pertinente a doçura e a imponência que marcam a personalidade artística dele) protagonizou talvez o momento mais incrível desta edição do Rock in Rio: ao cantar ‘Waitin’ on a Sunny Day’, entregou seu microfone a Ludovico, um menininho italiano de 10 anos. Ali, Bruce virou plateia e Ludovico um rockstar por segundos. Arrepios tomaram conta da Cidade do Rock. Sem contar a tradicional convocação de fãs ao palco para ‘Dancing in The Dark’, que desta vez contou até com uma felizarda tocando violão ao lado de Springsteen.

E assim, a cada segundo que se passava, a cada faixa cantada pelo ‘chefe’, era nítida a sensação de que uma história única estava sendo escrita. Do início com ‘Sociedade Alternativa’  de Raul Seixas ao final com o cover de ‘Twist and Shout’ + um trecho de ‘La Bamba’ de Ritchie Valens: uma apresentação esculpida pela energia de um homem que, visivelmente sem esforços, carrega em si a grandiosidade de um artista que sabe a história que escreveu.

Bruce tem noção de que é o símbolo de uma pátria. E sendo responsável pelo status que ocupa (o de ‘chefe’), transmite a nobreza de uma América que ele sempre projetou, desejou, contribuiu para que existisse. Tanto musical quanto política e socialmente falando, diga-se de passagem. E aqui no Brasil, hard land que conhecemos tão bem, Bruce Springsteen conseguiu não somente exercer sua chefia, como se tornar soberano. Vida longa ao rei.

Fotos: Vinícius Pereira

O sexto dia de Rock in Rio

Na abertura do Palco Mundo, os mineiros do Skank provaram mais uma vez sua capacidade de soterrar o público com seus hits de forma ininterrupta, quase ‘grosseira’. Mais uma vez, uma experiência pop de primeira, com direito a sucessos do auge dos anos 90 da banda. Uma delícia.

Já no Palco Sunset, Gogol Bordello transformou o festival em um carnaval cigano, sob a liderança do ucraniano Eugene Hütz (com direito a cuspes de vinho). O ritmo frenético da performance, com uma sequência veloz de nove músicas, foi desacelerado com a chegada de Lenine que, apesar de sua boa vontade, não conseguiu render química com Hütz & Cia.

De volta ao palco principal, o ‘novato’ Phillip Phillips não comprometeu com seu pop-folk delicado. Vencedor da temporada 2012 do reality ‘American Idol’, o jovem de 23 anos demonstrou segurança e empatia com o público em uma curta performance preparatória para os grandes protagonistas do dia.

John Mayer, aos 35 anos, renovou o amor de suas fãs, ávidas pela estreia do galã-folk em solo carioca. Com a competência de um músico já consolidado, Mayer fez um show suave, exibindo seus dotes vocais e de instrumentista sem grandes esforços. A execução de hits como ‘Daughters’ e ‘Your Body is a Wonderland’ transformou o Rock in Rio em uma balada romântica.

Fotos: Vinícius Pereira